O ano era 2012. A Netflix começava a revolucionar não só o mercado americano de mídia, mas ganhava fama mundial. À ocasião, o fundador e CEO da empresa, Reed Hastings, deu diversas entrevistas para explicar o porquê da Netflix ter mudado de rumo.
Até então, a companhia que afirmava que nunca investiria em conteúdo próprio colhia enorme sucesso de crítica, público e assinantes com títulos proprietários como “House of Cards” e “Orange is the New Black”.
Mais ou menos nessa época, Hastings deu uma entrevista para a revista Exame em que elencava os motivos para a mudança de comportamento. Se, antes, nenhum grande estúdio hollywoodiano olhava para o streaming como um meio de fazer dinheiro, o sucesso da Netflix mudava os rumos daquele mercado. Além disso, o custo para produzir uma série era menor do que ter a licença de um estúdio. Sem falar na praticidade de fazer o produto já pensando nos hábitos dos consumidores, cada vez mais mapeados pela empresa.
Uma década depois, a Netflix passou a ser questionada sobre a transmissão de eventos ao vivo dentro da plataforma. Já sem Hastings como CEO, a empresa sempre declarou que não gostaria de investir na aquisição de direitos esportivos.
Nesta segunda-feira (11), a plataforma anunciou a transmissão do seu segundo evento esportivo ao vivo. Depois de uma competição de golfe entre celebridades, a empresa fará a transmissão de um jogo festivo entre os astros do tênis espanhol Rafael Nadal e Carlos Alcaraz, em Las Vegas (EUA).
Assim como a empresa deu uma aula ao mercado no começo da década de 2010 de como criar séries de estrondoso sucesso mundial com custos mais baixos que o padrão criado por Hollywood, agora ela começa a mostrar que, no esporte ao vivo, o jogo é outro.
A Netflix não entrará na concorrência por direitos de mídia. Custa caro e é arriscado. Mais eficiente é usar o esporte ao vivo como ferramenta para turbinar o conteúdo sob demanda que existe dentro da plataforma. Foi assim com o golfe, agora será com o tênis. Não se assuste se pintar alguma ação envolvendo o mundo da velocidade.
Entre contratar estúdios sul-coreanos para produzirem séries de sucesso mundial ou gastar bilhões para ter eventos esportivos com exclusividade, a Netflix mostra que o caminho mais rentável é, sem dúvida, o primeiro. O negócio dela não é baseado em publicidade nem em volume de audiência, mas em pluralidade de conteúdo sob demanda.
A Netflix sabe o que quer. E é ela quem mostra o caminho para o streaming no mundo. É mais um alerta para o mercado esportivo mundial. A maior plataforma que existe no mercado “do futuro” não fará o jogo que ditou a relação entre mídia e esporte nos últimos 60 anos.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte, além de consultor, professor e palestrante sobre marketing esportivo