Samir Xaud deu, finalmente, suas primeiras declarações como presidente da Confederação Brasileira de Futebol (CBF). Ao que se pode perceber do “primeiro ato”, algumas mudanças significativas virão pela frente, e elas poderão mexer um pouco mais no tabuleiro de xadrez que se joga desde os desmandos de poder da Era Caboclo em diante.
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A decisão de reduzir para 11 datas os Estaduais é um golpe duro no campeonato que mais arrecada no país, o Paulistão. Único presidente de federação a não comparecer à eleição de Xaud, Reinaldo Carneiro Bastos tem no Paulistão com 16 datas o Estadual que mais dinheiro consegue arrecadar.
Caso a proposta da nova CBF vá adiante, ele terá de reinventar os contratos que foram fechados tendo como base 16 datas. Enquanto isso, nos outros Estaduais, a sensação é de alívio. Menos data representa menos dinheiro perdido e mais tempo para que os clubes joguem os regionais (Copa Verde e Copa do Nordeste, principalmente), que dão mais dinheiro e preparam melhor para competições nacionais.
É, no fim das contas, uma jogada dupla de maestria do novo presidente da CBF. Ele dá mais força aos clubes, melhora um pouco a vida das federações e, ainda, dá uma pequena pisada no calcanhar de quem se opôs a ele.
Da mesma forma, a proposta de dar força e apoio aos clubes para a criação da liga é a típica situação que transforma uma limonada a partir de poucos limões.
Qualquer um que trabalha no mercado sabe que a liga de clubes que comanda o Brasileirão só não existe porque a incompetência impera entre as cartolas furadas do nosso futebol. Desde junho de 2021, a CBF permite aos clubes organizarem a liga. E, desde então, o que vemos é um racha estúpido e contraproducente entre os dirigentes, que duelam por poder e dinheiro sem perceber que eles perdem as duas coisas ao se dividirem em dois blocos econômicos negociando separadamente suas propriedades.
A liga não vai sair. Se sair, terá poder apenas de organizar campeonato, sem qualquer unidade de negociação de direitos e outras propriedades. Com isso, mais uma vez, a maior fatia de dinheiro ficará na mesa, em um jogo de faz de conta que só evidencia a falta de preparo de quem tenta se mostrar vanguardista.
Xaud e a CBF ficarão, no fim das contas, como entusiastas da mudança, que só não acontece de fato porque não existe qualquer capacidade dos clubes de se organizarem.
Mas a grande mudança que virá dentro da CBF é a tal “descentralização” de poder que Xaud bate na tecla desde a primeira entrevista que concedeu, ainda pré-candidato, à Máquina do Esporte: ele estará presidente da CBF, mas as decisões serão tomadas por uma espécie de colegiado que reduzirá – e muito – a oposição ao que for decidido.
Em meio a esse cenário, caso Carlo Ancelotti consiga cumprir as expectativas e fazer o time masculino do Brasil jogar bola e ir bem na Copa do Mundo, os problemas de fora de campo ficarão ainda mais em segundo plano.
Fazia tempo que um presidente não chegava à CBF em meio a um quadro que aparenta ser de tempestade à vista. Mas nunca teve tanta chance de a bonança vir em tempo recorde. As mudanças estão colocadas. E elas vão tirar o peso das costas da CBF.
No fim das contas, existe uma grande possibilidade de, em 2027, após a Copa do Mundo Feminina, Samir Xaud ser aclamado como a modernidade que faltava ao futebol brasileiro. Ele já começou a fazer a primeira mudança. Deixou claro que não haverá espaço para oposição. Mas fará isso mostrando que está modernizando a CBF.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte, além de consultor, professor e palestrante sobre marketing esportivo