O futebol não sabe tratar bem o seu torcedor. Até o último sábado (28), muito provavelmente acreditávamos que essa frase seria mais bem aplicada à realidade do futebol sul-americano. Mas, depois do que aconteceu na final da Champions League em Saint-Denis, na França, percebemos que, em qualquer lugar do mundo, o futebol não sabe se relacionar com seu fã.
No jogo mais importante do mais importante torneio entre clubes do mundo, uma falha na gestão do comportamento do torcedor do Liverpool ocasionou um caos na revista para a entrada dos torcedores britânicos no estádio e gerou uma guerra entre torcedores e polícia para nenhum PM truculento brasileiro colocar defeito.
A inabilidade da polícia francesa em gerenciar o acesso dos torcedores ingleses fez com que a final da Champions tivesse de ser atrasada em mais de 45 minutos. Um tempo inteiro de vexame para a UEFA, que inicialmente disse que havia “problemas de segurança” para justificar o atraso e, depois, percebendo o quão inconveniente era usar o termo para um evento esportivo midiático como esse, resolveu parar de esconder a verdade e dizer que havia problemas para a entrada de torcedores do Liverpool no Stade de France.
Uma coisa precisa ser dita. A UEFA, pelo menos, teve a preocupação de atender bem o torcedor que havia comprado ingresso e ainda não tinha conseguido ter acesso ao estádio. Em vez de seguir o horário combinado e ignorar quem não estava na arquibancada, a entidade preferiu atrasar toda sua programação e fez com que o torcedor ingressasse no estádio para só então começar a partida.
Mas o buraco, obviamente, é mais embaixo. Foi por pouco que não houve uma grande tragédia no Stade de France. E, pior, é saber que isso não foi exceção, mas apenas um ponto mais crítico de algo que volta e meia acontece com as finais em sede única em cidades próximas dos principais centros urbanos e da bola na Europa.
Em 2013, no duelo entre Bayern de Munique e Borussia Dortmund em Londres, um enorme quebra-quebra pelos bares ao redor do Estádio de Wembley envolveu torcedores dos dois clubes e a polícia britânica. Dezenas de presos e feridos, diversos estabelecimentos destruídos e o pavor pelas ruas da cidade foram alguns dos efeitos.
O problema é que a sede única envolve policiamento não preparado para as dinâmicas de cada torcida. A confusão só do lado do Liverpool em Paris tem muito a ver com o comportamento distinto dos torcedores britânicos em relação ao dos espanhóis. A entrada em cima da hora do jogo, após beber bastante bebida alcoólica nos estabelecimentos próximos ao estádio, é uma característica do torcedor inglês. A polícia britânica já se acostumou a isso. A francesa, não.
A UEFA precisa tomar para si não apenas a gestão da porta para dentro dos estádios, mas, a exemplo do que faz a FIFA em suas competições, ter um controle total sobre a forma como é tratado o torcedor. Até porque, diferentemente de uma Copa do Mundo, em que o torcedor acaba sendo menos passional do que nas competições de clubes, a UEFA tem de lidar com grupos diferentes e comportamentos muito diferentes de fãs.
O tamanho que ganhou a Champions League exige que a UEFA tenha mais ingerência sobre a forma como seu torcedor é tratado. No final das contas, o ônus de toda a confusão com os torcedores do Liverpool caiu no colo da entidade europeia.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte