Façamos aqui a mea-culpa. Na primeira coluna que escrevi sobre a Copa do Mundo, decretei que o maior problema que o streaming enfrentaria na transmissão do Mundial seria o fato de que a transmissão pela internet estaria sempre atrasada em relação à da televisão.
Pontuei, na ocasião, que o fato de “gritar gol antes” faria com que boa parte das pessoas preferisse assistir aos jogos na tevezona tradicional, com o combo “Central do Apito-Olodum-Quem é que soooooobeeee” em vez de experimentar novos comunicadores, como Casimiro e Tiago Leifert.
Os números alcançados pela Cazé TV, que nesta segunda-feira (5) bateu outro recorde mundial no YouTube, com um pico de 5,3 milhões de pessoas sintonizadas, mostram que eu estava dando muito mais bola ao atraso do sinal da transmissão do que ao atraso do formato de transmissão do futebol na TV.
A Copa vem consolidar Casimiro como um exímio talento da geração conectada. A maneira como ele conduz o bate-papo por horas a fio em suas lives tem feito a alegria da galera. Os cortes da transmissão nas redes sociais viralizam, e, no final das contas, ele entrega um conteúdo adequado ao meio em que está.
É natural que ainda tenhamos um alcance de público quase dez vezes menor do que o da TV aberta. Da mesma forma, as maneiras de mensuração do Ibope e da audiência nas redes sociais são completamente diferentes. Na TV, para um ponto de audiência ser registrado, a pessoa precisa ficar 15 minutos seguidos sintonizada naquele canal. Na internet, basta a imagem ficar por mais de 3 segundos que o “ponto” é conquistado.
Isso torna cada vez mais incomparável os alcances de um meio e de outro. O que muda, realmente, é o formato e o tipo de público que a ele se conecta.
A TV, cada vez mais, é um meio antigo, produzido por gente antiga e falando com gente antiga. A transmissão da internet, por mais que tenha mantido quase todos os elementos tradicionais que nos acostumamos a consumir em um jogo, traz uma linguagem adequada para o público novo.
E, nesse sentido, não há preocupação se o gol foi gritado antes ou não. O que interessa é ver as reações de Cazé, as infâmias de Diogo Defante, as trolagens de Denilson, o conhecimento de Juninho Pernambucano e, claro, a emoção de Luis Felipe Freitas na narração.
No entanto, apesar do sucesso estrondoso e inegável de Casimiro na Copa do Mundo, ele não indica uma substituição no modelo de consumo do esporte. O streaming se mostra como uma alternativa cada vez mais complementar para o evento esportivo ter maior alcance. E a TV ainda segue soberana como meio de massificação do esporte.
Assim como a TV não tirou o rádio da jogada e a TV a cabo não acabou com a transmissão gratuita, o streaming está aí para compor e manter o esporte próximo de um novo jeito de consumir.
E, nessa realidade, gritar gol antes significa só esperar mais alguns segundos para poder curtir de que forma ele aconteceu. Ah, e o replay, no streaming, também precisará ser repensado, já que podemos voltar a tela para o ponto que quisermos.
O que o streaming traz de novidade é exatamente dar mais poder de controle ao usuário. E essa é a grande revolução que virá para quem consome o conteúdo esportivo ao vivo.
Isso, porém, será assunto para uma nova coluna.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte