A ideia de o futebol brasileiro se organizar em uma liga que represente, pelo menos, a Série A do Campeonato Brasileiro, foi uma boa ilusão que tivemos no auge da pandemia. A união dos clubes para pressionar a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e comunicar que a liga sairia, mesmo à revelia da entidade, parecia ser aquele conto de fadas com final feliz.
Quase três anos depois de os clubes anunciarem a “ruptura” com a CBF, porém, o futebol brasileiro caminha para o lado. Ou melhor, em diagonal, indo um pouquinho para trás.
Iludidos com a história de que, com a lei do mandante, os clubes conseguem ser independentes da mídia, nossos dirigentes decidiram adotar de vez a tática do “cada um por si”.
E isso fica evidente ao analisarmos as propostas feitas por dois diferentes fundos de investimento para as duas diferentes ligas que até agora se propõem a serem as organizadoras do “Brasileirão” a partir de 2025.
De um lado, a Libra tem o apoio do gigantesco Mubadala, fundo soberano de Abu Dhabi que, no Brasil, tem participação na IMM (dona do Rio Open, de tênis) e na organizadora do Grande Prêmio São Paulo de Fórmula 1.
Do outro lado, a Liga Forte Futebol (LFF) anunciou um acordo com o fundo americano Serengeti Asset Management para ser o potencial investidor da liga.
Nos dois casos, há condições mínimas para que o negócio seja aprovado de fato. A Libra precisaria ter 16 clubes na Série A do Brasileiro em 2025, enquanto a LFF precisaria ter os 40 clubes das duas divisões principais do país.
A proposta faz com que, no final das contas, o futebol saia perdendo em qualquer uma das duas situações. Para a Libra receber um aporte de US$ 900 milhões, terá de conseguir ter 80% da Série A. Para a LFF sair com um investimento de US$ 950 milhões, precisa ter 100% das duas divisões.
Ou seja: as propostas que existem, hoje, nos dois casos, são duas ilusões, assim como é a união de fato dos clubes. Em vez de se organizarem, formarem um produto decente e, então, buscarem um investimento de verdade, os clubes brasileiros seguem correndo atrás de migalhas.
As duas propostas recebidas até agora, para comprar 20% de uma liga que ainda não existe, são de cerca de 30% do valor que a LaLiga, da Espanha, recebeu para ceder 9% dos seus direitos de mídia para o fundo de investimentos CVC.
É isso mesmo. Vendemos o dobro por um terço do preço. E achamos que estamos fazendo um excelente negócio.
O futebol brasileiro segue parado no tempo, sem saber como criar um produto que seja atrativo para todos. Torcedores, patrocinadores, mídia, dirigentes e, claro, investidores.
Enquanto houver dois grupos brigando em vez de um único grupo negociando em conjunto, haverá um futebol debilitado, que só gera dinheiro para quem está ao redor dele, nunca para quem é responsável por gerenciá-lo.
Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte, além de consultor, professor e palestrante sobre marketing esportivo