Qual é o momento certo para demitir um treinador? Sabemos que, no esporte, o técnico é uma peça-chave dentro de uma equipe. Ele interfere diretamente no desempenho e nos resultados. Mas, ao mesmo tempo, na cultura do futebol brasileiro, as trocas são frequentes, e o treinador vira a linha de frente, o escudo. Faz-se um planejamento, traça-se um plano, mas, se algo dá errado, é ele quem primeiro paga o preço. Essa mentalidade, na minha visão, é perigosa.
É preciso ter mais responsabilidade, tanto por parte de quem contrata quanto de quem joga. Todos precisam dividir os deveres para criar uma cultura em que o grupo esteja unido, independentemente dos resultados.
Um bom exemplo disso vem do Bahia, com o Grupo City apoiando Rogério Ceni mesmo em momentos de forte pressão. Eles entenderam que o ex-goleiro tem identidade com o projeto, está alinhado ao DNA do clube e está construindo uma equipe competitiva. Nesse modelo, o mais importante não é apenas erguer um troféu, mas mostrar evolução, consistência e compromisso com um plano bem estruturado.
Quando isso acontece, forma-se uma cultura de responsabilidade coletiva. E isso muda tudo. Muitos técnicos não se entregam por completo porque sabem que, a qualquer crise, podem ser dispensados. Por isso, exigem contratos com multas mais altas e atuam com uma entrega limitada, guardando energia e evitando o excesso de desgaste físico e principalmente mental. Mas, quando o clube oferece respaldo, mesmo nos momentos de dificuldade, o envolvimento é outro. A dedicação cresce, porque o treinador sabe que será amparado, não isolado.
Um dos grandes desafios no futebol brasileiro é resistir à pressão externa. Defender um trabalho bem-feito, mesmo em fases ruins, exige planejamento e convicção. A escolha do treinador precisa ir além da competência técnica: é necessário que ele se conecte com a identidade do clube. Essa conexão permite que o trabalho seja mantido no médio e longo prazo, e que, quando os momentos difíceis chegarem, ele seja defendido com firmeza por todos.
É importante que as pessoas entendam: sim, algumas equipes mudam de treinador e vencem. Mas, na maioria das vezes, essas vitórias são pontuais. Clubes realmente vencedores são aqueles que mantêm uma liderança técnica estável e que criam um processo de identificação, de cultura sólida, como faz o Palmeiras. E aí não se ganha apenas um campeonato. Ganham-se vários.
Esse deveria ser o verdadeiro objetivo dos dirigentes: proteger e manter um técnico por anos. Esse é o modelo de sucesso. A falsa sensação de que trocar constantemente é o caminho mais eficaz leva o clube, muitas vezes, de volta à estaca zero. É preciso reconstruir tudo: a confiança da equipe, a conexão com o elenco, o vínculo com a torcida.
Portanto, mais do que planejar um projeto com um bom início, é necessário ter visão estratégica para sustentá-lo ao longo do tempo. Nem sempre os resultados virão rápido, mas, com paciência e coerência, chegarão. O Atlético de Madrid é um exemplo claro disso. O trabalho de Diego Simeone ao longo dos anos mostra que é possível colher resultados sólidos com continuidade. E, de quebra, ainda se economiza: com menos trocas, há menos multas e menos desperdício de energia e de recursos.
Como jogador, sempre percebi a diferença nos clubes que tinham convicção e protegiam seus treinadores. Esse tema é profundo porque impacta diretamente a cultura, o desempenho e o comprometimento dos atletas. No Atlético de Madrid, com Simeone, sabíamos que, mesmo nas crises, ele continuaria. A diretoria o respaldava, e nós, jogadores, tínhamos que assumir a responsabilidade junto dele. A ideia de substituí-lo não existia, e isso gerava mais compromisso, entrega e coragem para superar os momentos difíceis. Essa é a cultura que precisa ser adotada: ao escolher um treinador, é com ele que se deve construir as vitórias e também enfrentar as derrotas, sempre com proteção e parceria.
Em resumo, para que os clubes possam continuar evoluindo, é preciso entender que dispensar um treinador deve ser a última opção, e não a primeira, como comumente é feito no Brasil.
Diego Ribas é ex-jogador de futebol, com passagens por Santos, Flamengo, diversos clubes europeus e seleção brasileira. Atualmente, é palestrante, comentarista, apresentador do PodCast 10 & Faixa e garoto-propaganda de empresas como Genial Investimentos, Adidas, Colgate e Solides