Ben Veenbrink

Na última quinta-feira, a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) recebeu dezenas de propostas e projetos de cidades para abrigar as partidas da Copa do Mundo de 2014, que provavelmente será no país. Nas propostas enviadas à entidade, estão previstas a construção e a renovação de diversos estádios no Brasil em função da Copa do Mundo.

Nesta semana, para entender um pouco mais sobre os riscos e as necessidades do país na gestão de novos estádios, a reportagem da Máquina do Esporte entrevistou Ben Veenbrink, membro da divisão de Construção e Gestão de Estádios da Uefa e fundador do EVMI, instituto europeu que discute a gestão de arenas esportivas.

Segundo o especialista, a Copa do Mundo poderá catalisar a melhoria de alguns estádios no país, mas ela não pode ser o motivo pelo qual essas arenas serão feitas. Veenbrink defende que a Copa é apenas o pano de fundo do processo, sendo necessária a elaboração de um plano de negócios para o novo estádio, seja ele uma reforma ou uma nova arena.

“Só vão ser criados elefantes brancos se os clubes e as cidades se preocuparem apenas com as exigências da Copa do Mundo e o legado que surgirá depois do Mundial”, afirmou o executivo, que também defende a participação, em alguns casos, da esfera pública na construção do estádio.

Leia a seguir a íntegra da entrevista com Bem Veenbrink:

Máquina do Esporte: Por que a EVMI foi criada? Qual a proposta do grupo?

Ben Veenbrink: A EVMI foi criada enquanto a indústria dos estádios na Europa estava amadurecendo e não havia um treinamento formal, uma qualificação, para aqueles que estavam envolvidos no desenvolvimento e gestão da nova onda de estádios na Europa. Infelizmente uma série de erros se repetia cada vez mais, e não tinha um corpo profissional para dar apoio ou com expertise e experiência nisso. Com a EVMI, nós procuramos não apenas prover a indústria de profissionais capacitados, mas também a utilizamos como uma plataforma para o networking e o relacionamento daqueles que fazem parte dessa indústria.

ME: Como o senhor qualificaria os estádios na Europa?

BV: Após os desastres nos estádios que assolaram o futebol europeu na metade e final dos anos 80 [Bradford, Heizel e Hilsborough], foram lançados o Taylor Report e o ?Green Guide to Safety at Sports Ground? [na tradução literal, o “Livro Verde da Segurança nas Arenas Esportivas”]. Com isso, muitos estádios melhoraram em relação à qualidade e segurança desde então. Porém, com a comercialização do futebol que começou em 1992, a partir da criação da Liga dos Campeões da Europa e da Premiership, houve uma grande necessidade de os estádios também gerarem receita. Isso provocou uma mudança do perfil do gestor do estádio, de alguém preocupado apenas com a segurança para um profissional ultra-capacitado. Hoje você vê estádios altamente equipados em tecnologia, que também têm uma proposta múltipla com diversas funções comerciais e ligado a outros projetos, o que os torna bastante complexos. A expertise necessária para isso vai muito além do core business de dirigir um time de futebol. É preciso que gerentes profissionais cuidem disso.

ME: Como essas arenas podem gerar lucro a seus donos?

BV: Em inglês, isso é chamado de “sweating the asset” [algo como “explorando os recursos”]. Você tem que usar um estádio o máximo que puder. Tanto organizando outros eventos em que o futebol esteja presente ou não, incluindo funções comerciais com o estádio que vão gerar receitas para os donos. Além disso, a receita nos dias de jogos tem de ser maximizada com segmentação de preço e gerência do rendimento, serviço de catering bem feito, camarotes corporativos [em que com 10% da capacidade do estádio você gera 50% da receita em dia de jogo], etc.

ME: No Brasil, muitos clubes estão planejando construir ou reformar estádios por conta da Copa do Mundo de 2014. O senhor acredita que esse tipo de atitude possa gerar “elefantes brancos” no país?

BV: Só vão ser criados elefantes brancos se os clubes e as cidades se preocuparem apenas com as exigências da Copa do Mundo e o legado que surgirá depois do Mundial. Em outras palavras, eles devem focar num plano de negócios para o estádio que seja sustentável após a Copa do Mundo e basear a concepção e o design de suas arenas pensando nesse business plan. Espero que eles não construam suas arenas apenas com a visão dos arquitetos, mas também que olhem os projetos do ponto de vista comercial. No final, a Copa do Mundo é uma ótima oportunidade para o país e os clubes em particular, uma vez que ela vai proporcionar o desenvolvimento ou remodelamento dos estádios e provê-los com a oportunidade de que sejam seguros e lucrativos.

ME: Como as arenas brasileiras podem ser rentáveis?

BV: O apoio público é necessário em alguns casos. Aliás, esse é o caso de muitos projetos na Europa. Um financiamento inteligente e o uso dos estádios como um catalisador da recuperação de áreas urbanas e, assim, gerar receita, é uma outra alternativa.

ME: Existe alguma diferença na gestão de uma arena esportiva no Brasil de uma na Europa?

BV: A princípio, não. Apesar de que obviamente existem muitas diferenças culturais. Atualmente a maioria dos estádios brasileiros sofre com problemas de conforto e segurança e também com a baixa qualidade dos serviços. Com isso, os torcedores ficam afastados, e há um limite de oportunidades para aumentar a receita com os estádios. Com as novas arenas, tudo isso tende a mudar.

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