Eduardo Gayotto

Em 1993, Ayrton Senna anunciou que trocaria a McLaren pela Williams na temporada seguinte, a seleção brasileira de futebol ainda era tricampeã do mundo e os jogadores, ainda distantes dos salários milionários de hoje em dia, recebiam em Cruzeiro Real. Tudo isso embalado pela voz de Whitney Houston, com sua I Will Always Love You, ou por algum grupo de pagode, música e ritmo mais executados nas rádios naquele ano.

Foi nesse cenário distante ? à primeira vista pouco fértil – que nasceu a Gayotto Marketing Esportivo, uma das pioneiras desse mercado no país. Nos seus 15 anos de história, a empresa acompanhou o desenvolvimento frenético da indústria esportiva nacional, embasado, principalmente, pelo início da era da profissionalização.

?O mercado era movido só pela paixão. No início da década, porém, as empresas começaram a entender que o esporte é uma ferramenta de marketing. Aliás, uma ferramenta poderosa. A partir desse entendimento é que o mercado ganhou força e foi evoluindo para o que nós conhecemos atualmente, uma área muito mais profissional?, afirma Eduardo Gayotto, fundador da agência.

Nesta entrevista exclusiva à Máquina do Esporte, Gayotto faz um balanço dos últimos 15 anos do marketing esportivo no Brasil, critica gestão tímida das confederações ?nanicas?, como a de ciclismo, e afirma que sua empresa ajudou no desenvolvimento do mercado de corridas de rua do país.

Leia a seguir a íntegra da entrevista:

Máquina do Esporte: A Gayotto iniciou suas atividades em 1993, quando o marketing esportivo ainda estava engatinhando no Brasil. De onde surgiu a idéia de apostar nesse mercado?

Eduardo Gayotto: Essa é uma questão histórica. Apesar de não ter ninguém na minha família ligado ao esporte, eu, por conta própria, desenvolvi uma relação forte com ele. Pratiquei natação por dez anos, depois migrei para o triatlo. Fui presidente fundador da federação paulista da modalidade. Naquela época, não tinha nenhum promotor de eventos de triatlo e a federação acabou assumindo essa função. Foi assim que eu tive a idéia de trabalhar com marketing esportivo. A paixão veio desde sempre. Aí eu me formei em Administração de Empresas e juntei as duas coisas para criar a Gayotto Marketing Esportivo.

ME: O que mudou no mercado nesses 15 anos?

EG: Muita coisa. Houve um crescimento muito acentuado desde aquela época, principalmente de 2001 até agora. Entre 1993 e 2000 era um mercado pequeno, concentrado em poucas ações e empresas. Aliás, nossos clientes, geralmente, eram pessoas que gostavam de esporte. O mercado era movido só pela paixão. No início da década, porém, as empresas começaram a entender que o esporte é uma ferramenta de marketing. Aliás, uma ferramenta poderosa. A partir desse entendimento é que o mercado ganhou força e foi evoluindo para o que nós conhecemos atualmente, uma área muito mais profissional.

ME: Um dos pontos dessa evolução é que as empresas de marketing esportivo passaram a atuar, em sua maioria, como organizadoras de eventos, deixando as negociações de cotas publicitárias de seus clientes para outras agências. Essa segmentação é benéfica para o mercado?

EG: Eu acredito que as agências de publicidade não acreditavam no marketing esportivo até pouco tempo atrás, não acreditavam que o esporte poderia ser uma mídia importante para a divulgação de marcas e produtos. Por isso, as empresas de marketing esportivo se desenvolveram isoladamente das agências de publicidade e acabaram buscando um nicho de especialização diferente, criando essa expertise na organização de eventos. Isso vem mudando atualmente. Algumas agências passaram a apostar em núcleos próprios de marketing esportivo, enquanto nós também passamos a cuidar das duas coisas de forma dissociada. Publicidade e eventos são duas categorias de trabalho diferentes, mas que podem conviver em harmonia. Não acredito que essa separação tenha causado qualquer malefício para o mercado.

ME: A Gayotto tem uma ligação mais forte com triatlo e corridas de rua. Já teve, em determinado momento de sua história, um elo com o ciclismo. O que levou a empresa a aproximar, especificamente, dessas modalidades?

EG: O triatlo, como eu disse antes, foi a porta de entrada para o mercado. E a ligação veio por questões pessoais, nada além disso. Já com as corridas de rua foi diferente. Houve um crescimento acentuado na demanda a partir do final da década de 1990. Nossos clientes começaram a pedir eventos dessa modalidade e nós tivemos de desenvolver a expertise para realizá-los. Não dava para ficar fora do boom desse mercado. Naquela época, uma corrida como a Maratona de Revezamento Pão de Açúcar, por exemplo, tinha oito mil participantes e a maioria deles não se adaptava ao sistema de troca vigente. Nós criamos um sistema com tapetes coloridos que virou um sucesso. As pessoas identificam cada setor pela cor. Essas novidades acabam trazendo mais gente. Fizemos uma edição com 36,6 mil inscritos, recorde para a América Latina até hoje. É assim que a gente vai criando os laços. O desenvolvimento da expertise acaba nos levando a esse ou aquele caminho. É natural.

ME: O que provocou o fim da parceria da Gayotto com eventos de ciclismo?

EG: Tivemos uma época muito boa com o ciclismo, investimos muito nessa modalidade fazendo eventos de alta performance e grande visibilidade, como as Voltas Ciclísticas de Santa Catarina e do Rio de Janeiro, por muito tempo. O que aconteceu foi que eles não deslancharam. Os patrocínios são muito poucos e não foi possível perpetuar nossa relação com o ciclismo.

ME: Os sucessivos casos de doping, que afastaram os investidores do ciclismo, foram os responsáveis por essa ruptura?

EG: Não, o ciclismo sempre conviveu com casos de doping. Infelizmente, faz parte da história da modalidade. O problema aí é administrativo, está na raiz da gestão do esporte. [Os dirigentes] Não sabem fazer do ciclismo um esporte rentável no Brasil, ao contrário do que acontece, por exemplo, com a corrida de rua, que está muito bem administrada tanto em âmbito regional, quanto na esfera nacional.

ME: Durante muito tempo, a Gayotto organizou o Fast Triatlo, evento transmitido para todo o Brasil pela Rede Globo. Apesar da visibilidade gerada pelo canal, a modalidade não deslancha. O que falta para popularizar o triatlo por aqui?

EG: O Fast fez com que muita gente conhecesse o esporte, não tenho a menor dúvida disso. Mas o triatlo tem uma série de coisas parecidas com o ciclismo, principalmente na forma de condução da modalidade. Os dirigentes poderiam gerir o esporte de forma mais agressiva. Da maneira que está ninguém tem o espaço que poderia ter, a gestão é muito tímida. E, apesar do apoio da Globo, o espaço dedicado ao esporte fora do futebol é muito pequeno. Sem mídia fica difícil trabalhar, a gente sente isso. É preciso criar um bom espaço para esses esportes, criar grandes eventos… são eles que vão chamar a atenção da garotada, fabricar ídolos. Tudo isso monta a equação do sucesso de uma modalidade. Veja o exemplo do vôlei, que trabalhou fundo essas questões para trazer mídia, torcedores, e agora é um fenômeno no país.

ME: O crescimento do mercado de corridas de rua ajudou na consolidação da empresa?

EG: Sem dúvida. Esse evento [do Pão de Açúcar], por exemplo, foi um dos que mais contribuíram para a nossa consolidação. Aliás, foi uma estrada com duas mãos. Nós também ajudamos na consolidação do mercado de corridas de rua. Essa prova trouxe muita gente nova, o percentual chega a 40% de novatos em cada evento, é muita coisa. Atualmente, nossa média é de 12 eventos por ano.

ME: Apenas a cidade de São Paulo deverá somar 300 corridas neste ano. Uma das apostas da empresa neste fim de ano é a Reebok Christmas 10Km, que faz alusão ao Natal. A inclusão de temáticas diferentes é uma saída para evitar a saturação desse mercado?

EG: Sim, não há nenhuma dúvida. A gente precisa criar opções para atingir determinados nichos e atrair gente nova para a corrida. A ordem é segmentar, criar diversas intervenções durante as provas para agradar todos os gostos. Mas eu ainda acredito que o grande vilão da saturação do mercado é a falta de opção de bons lugares para se realizar os eventos. Em São Paulo, por exemplo, temos um circuito muito restrito. Nós fazemos nossas provas, principalmente, no Parque do Ibirapuera e na Cidade Universitária. Às vezes vamos para o Parque da Independência, Jockey Club ou Clube Hípico de Santo Amaro.

ME: Justamente para desafogar essas regiões, a Prefeitura de São Paulo lançou um projeto para criar um circuito de corridas de rua alternativo na periferia da cidade. A Gayotto tem algum planejamento nesse sentido?

EG: Temos sim. Já fizemos propostas para levar alguns eventos ao Parque do Carmo, na zona leste da cidade. Esse é um dos nossos objetivos para o futuro, principalmente porque muita gente que mora naquela região não pode participar das corridas programadas para o circuito tradicional. E ali a densidade demográfica é muito alta, vamos conseguir atrair muita gente para o mercado.

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