Francisco Machado

A reunião de várias marcas esportivas dentro de uma mesma empresa tornou-se uma constante no mercado brasileiro nos últimos anos. Para acompanhar a evolução, grandes fábricas ?adotaram? companhias do exterior e também novas linhas nacionais. Agora, essas empresas convivem com o desafio de evoluir em conjunto diferentes marcas.

Conflitos internos, possíveis estratégias erradas e falta de concentração num planejamento podem comprometer a saúde de uma companhia no meio de um mercado tão competitivo. No caso do grupo Dass, que comanda Fila, Tryon, Umbro e Kappa, o problema fica ainda maior porque a direção entende que todas as marcas passam por uma fase de ?engorda?.

?Cada marca tem o seu posicionamento. É lógico que tem pequenas zonas cinzentas, mas as empresas são projetadas para serem complementares, e cada uma delas têm uma maneira de crescer?, afirma Francisco Machado, diretor comercial e de marketing do grupo Dass, em entrevista exclusiva à Máquina do Esporte.

O executivo conversou no início desta semana com a reportagem durante a Couromoda, principal feira do setor de vestuário esportivo. No bate-papo, detalhou as particularidades de cada uma das marcas do grupo. Curiosamente, segundo Machado todas elas têm a mesma preocupação com a comunicação. Seja por trabalhos considerados bem feitos ou por viverem momentos de afirmação no mercado, as fabricantes precisam ir à mídia para falar com o consumidor.

?Nós temos de utilizar todas as ferramentas possíveis, e de maneira eficiente. Precisamos trabalhar melhor com a imprensa, aparecer mais. Hoje sabemos apresentar nossos conceitos sem risco de errar?, diz Machado.

O fantasma no caminho do planejamento é a crise financeira. No entanto, a instabilidade, que vem assustando executivos ligados ao mercado esportivo por todo o mundo, não tira tanto o sono de Machado, que entende que o Brasil pode superar a tormenta.

Leia a íntegra da entrevista a seguir:

Máquina do Esporte: Qual a importância de uma feira como a Couromoda para o grupo Dass?

Francisco Machado: O mercado brasileiro passa por transformações em termos de ferramentas. As feiras fazem parte da cultura, que permite a você receber clientes. É uma oportunidade única de mostrar ao mercado os seus produtos. É uma soma de interesses.

ME: E qual a previsão do grupo para esse ano incerto que se aproxima?

FM: Nós estamos prevendo um crescimento de 10%. Em 2008 nós tivemos um ano difícil, com exceção feita à Fila, que cresceu muito. Mas a idéia é manter um ritmo de subida daqui em diante.

ME: Como foi essa ascensão da Fila?

FM: A Fila é uma marca extremamente relevante no cenário mundial. Ela foi a marca esportiva com maior retorno nos Estados Unidos nos anos 1990. O Bjorn Borg, que era o Roger Federer da época dele, era patrocinado pela Fila. Ela não só fazia produtos para o esporte, mas tinha o glamour por também se fazer presente na moda. Ela ainda tem carisma, mas nós somos low profile, não divulgamos tudo isso. Nós já estamos com um tamanho importante e temos de demonstrar isso. Fizemos uma campanha muito grande, e vamos trabalhar melhor em pontos de venda, por exemplo.

ME: Falando em crescimento, como vocês trabalham as diferenças de planejamento entre as quatro marcas?

FM: Cada marca tem o seu posicionamento. A Umbro é de altíssima performance. Nós temos os melhores produtos de futebol, mas ainda não traduzimos isso para o consumidor. E nós vamos fazê-lo, porque somos os melhores. Todas têm seu ponto de performance. Só a Tryon, que representa a busca total pela qualidade de vida, o experimentar. Já a Fila está focada em tênis e running. Existem pequenas zonas cinzentas. Elas são separadas por políticas de preço e alguns produtos, mas sempre têm coisas que se entrelaçam, mas são projetadas para serem complementares.

ME: Você falou de Tryon, Umbro e Fila. Qual a imagem que vocês têm da Kappa?

FM: A Kappa é mais casual. Ela também tem produtos de futebol, porque historicamente está muito ligada a isso.

ME: Já que você comentou, nos últimos anos a Kappa vem, mesmo que de forma moderada, deixando o futebol?

FM: Não que ela esteja se afastando, mas está tomando um rumo estratégico. Nós podemos, inclusive, entrar em outros esportes como rúgbi, mas sempre com um perfil sofisticado. E o exterior segue o mesmo caminho.

ME: E como funciona essa relação com o exterior? O fato de depender de estratégias de marketing do exterior atrapalha no planejamento?

FM: Tem uma frase chave que explica esse processo. ?São tomadas decisões globais com adaptações locais?. Nós representamos muita coisa. Muita gente presta atenção no que a gente diz, porque o Brasil é um mercado importante. O que a gente apresenta tem força, fundamento, e ecoa lá fora. Com todo o respeito, países menores não possuem o mesmo peso.

ME: Você acredita que essa presença de marcas em uma única empresa é o futuro do mercado no país?

FM: Eu acho que é uma tendência mundial nos negócios. Em qualquer tipo de indústria os grandes grupos estão se unindo. Nos bancos, a união entre Itaú e Unibanco é um exemplo disso. Entre as montadoras automobilísticas também. Nós entendemos que esta é uma forma de defender e atacar, ao mesmo tempo, com grandes corporações que não fazem a mesma coisa.

ME: Você já falou sobre como vê cada uma das marcas que o grupo comanda. Como você acha que pode fazê-las crescer?

FM: Sempre dentro do nosso negócio, temos algumas prioridades importantes, como manter o crescimento da Fila. A Umbro tem de mostrar o quanto é forte. Já a Kappa precisa caminhar ainda mais para esse lado casual. A idéia é obter um posicionamento melhor no mercado.

ME: E como conseguir isso?

FM: Nós temos de utilizar todas as ferramentas possíveis, e de uma forma eficiente. Nós reconhecemos que temos uma origem industrial, e estamos próximos de ser uma empresa industrial com vocação mercadológica. Temos de aprender a praticar o marketing esportivo, trabalhar melhor a relação com a mídia, com os pontos de venda, falar com a imprensa mais vezes. Hoje nós sabemos falar dos nossos conceitos de forma mais clara.

ME: Um número maior de patrocínios esportivos pode ser o caminho?

FM: Nós temos analisado algumas possibilidades. Sempre existe alguma coisa em todos os esportes, exceto para a Umbro, que é só futebol mesmo. Na Tryon, por exemplo, podemos marcar presença em atividades que estejam ligadas à qualidade de vida.

ME: E qual o peso dessa crise nisso tudo?

FM: Olha, o duro é ter a inflação na casa dos 80% ao mês, como foi em 1994. Cada R$ 100 no começo do mês valia R$ 16 no fim dele. Isso é a crise. É a pior coisa que existe. O que a gente tem ouvido falar tem a ver com a falta de regulação econômica no mundo. Faltaram mecanismos de controle, e criou-se uma situação de caos econômico virtual. Agora, nós brasileiros encontramos saídas. Não é um problema insolúvel.

Sair da versão mobile