Leonardo Nascimento de Araujo

O Milan está se tornando cada vez mais um pedaço do Brasil na Europa. São oito jogadores no time italiano atualmente e, prova da relação do clube com o país, é que nesta semana foi lançada a versão brasileira de seu site. No meio disso tudo está Leonardo, que poderia ser considerado um líder dos brasileiros. Foi o ex-jogador quem reabriu as portas para os compatriotas e hoje exerce um cargo importante no clube italiano.

Leonardo chegou ao Milan em 1997, 27 anos depois de Sormani, último brasileiro do clube. Agora, o ex-jogador de Flamengo e São Paulo é diretor esportivo do time italiano há seis meses, depois de uma frustrada tentativa de volta ao Brasil. Para ele, sua relação com o Milan e a falta de estrutura do futebol brasileiro fizeram com que voltasse rapidamente à Itália.

Isso não é motivo, no entanto, para Leonardo esquecer o futebol no Brasil. Apaixonado por gestão esportiva, como ele mesmo define, o dirigente acompanha os acontecimentos no cenário nacional, como a Timemania e a importância da Copa do Mundo.

Além disso, continua atento a seu time de coração, o Flamengo. O ex-atleta já declarou que sonha com o dia em que será presidente do clube carioca, mas segue achando que a agremiação ainda não está pronta para isso e, por enquanto, é melhor seguir no Milan.

“Apesar da vibração com o Flamengo, acho que a estrutura mudou pouco. Tomara que esse sucesso seja um gancho para um trabalho mais duradouro”, declarou o jogador em entrevista exclusiva realizada na última segunda-feira, no Rio de Janeiro.

Leia a seguir a entrevista com Leonardo na íntegra:

Máquina do Esporte: Há seis meses você é diretor esportivo do Milan. Como está a vida de dirigente?

Leonardo: Já são cinco anos como dirigente, com algumas paradas. Tentei voltar há seis meses para o Brasil, mas acabei não conseguindo. Para mim é viver em uma família. É um trabalho, tenho minhas funções e objetivos, mas me sinto em casa. Eu tenho um cargo de confiança no clube, em que trabalho diretamente com o vice-presidente do Milan, o Adriano Galliani, que é quem tem os poderes no clube. Quando cheguei no Milan, em 1997, o último brasileiro tinha sido o Sormani, em 1970. Agora são oito. Sinto que estou ligado intimamente ao Milan por tudo isso, e é uma satisfação grande o trabalho como dirigente.

ME: Você falou em oito brasileiros jogando lá e nove, com você. Além disso, já passaram outros pelo clube. O que explica essa identificação tão grande do Milan com o Brasil?

L: O brasileiro se encaixa superbem nessa filosofia da era Berlusconi, que vem dos últimos 21 anos, e acho que tem várias explicações para isso. Primeiro não existe mais o mito do desconhecido, da Europa. A informação está em todo lugar e não há problema de adaptação. Depois, o brasileiro voltou a dominar o futebol depois de 1994, com três finais seguidas de Copa do Mundo. Mas também acho que o Milan tem tudo a ver com o perfil do brasileiro, com irreverência, simpatia, talento e carisma. O Milan tem essas características e as quer também. Quer qualidade com estilo.

ME: Antes de assumir essa função no Milan, você declarou que gostaria de fazer isso no Brasil, mas que ainda não via um projeto nos clubes brasileiros que o fizesse querer trabalhar aqui. Mudou algo nesses seis meses?

L: Infelizmente não. Apesar da vibração com o Flamengo, acho que a estrutura mudou pouco. Tomara que esse sucesso [em campo] seja um gancho para um trabalho mais duradouro. Não é hora de criticar, mas acho que ainda não existe um trabalho duradouro aqui.

ME: A Timemania tem sido apontada pelos dirigentes brasileiros como a “salvação da lavoura”. Tem acompanhado esse processo? O que acha disso?

L: A Timemania é apenas um paliativo. Poder aliviar um débito público é extraordinário, mas achar que só isso vai alavancar as coisas no futebol brasileiro é um erro. Os clubes têm que se abrir para outras iniciativas e negócios em busca de receita.

ME: Você já se declarou um apaixonado por gestão esportiva. Além do trabalho como dirigente, o que fez para se especializar nessa área?

L: Fiz alguns cursos. Freqüentei o Bocconi, uma faculdade de ciências contábeis na Itália, que é muito bem conceituada na Europa, onde assisti, como ouvinte, um curso de management esportivo. Vivo gestão todo dia e isso me deu uma visão teórica que foi importante. Mas minha vivência de gestão esportiva é na prática. Parei de jogar e no dia seguinte estava no escritório. Foi tudo muito empírico. Mas também já fiz outros cursos para me aperfeiçoar.

ME: O futebol italiano teve que se recuperar recentemente dos escândalos de manipulação de resultados. Agora, lida com o problema de violência. Como tudo isso afeta a imagem do esporte no país?

L: Acho que a violência é na sociedade. Não acho que seja no futebol. O futebol pode até funcionar ao contrário, para transmitir alguma mensagem, mudar alguma coisa. Mas o que aconteceu foi um problema de política pública. Foi em uma estrada a 100 km de um estádio. Não dá para falar que foi por causa do futebol. Com certeza a Itália passou por escândalos fortes recentemente. Mas é algo que deve ser superado rapidamente também, até mesmo pela cultura do país.

ME: Em compensação, aqui no Brasil as torcidas têm sido elogiadas porque as médias de público aumentaram muito…

L: O Brasil tem uma oportunidade fantástica com a Copa do Mundo de mostrar que tem conhecimento, que tem capacidade de realizar um evento desse porte, que tem tecnologia. O país tem que se abrir às oportunidades, porque uma Copa pode ser um instrumento de muito crescimento e muita mudança no país. Ela não traz apenas futebol. Traz também estradas, hospitais, mudanças políticas, coisas que vão continuar depois e muitas contribuições para a sociedade. E isso com certeza melhora também o esporte internamente. Dá uma alavancada. E é o que já está acontecendo.

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