Maria Luisa Jucá

No próximo dia 27, mais de 200 ciclistas sairão do Rio de Janeiro em direção a Angra dos Reis, abrindo a primeira etapa do Tour do Rio. Em sua segunda edição, a prova já é considerada uma das melhores provas de ciclismo de estrada do Brasil. Com premiação de R$ 200 mil e oito equipes internacionais, a organização da prova sonha alto para o futuro do evento: quer o equiparar ao Tour de France.

Por trás desse projeto está Maria Luisa Jucá, que há duas décadas fundou a agência Conexão Marketing. A princípio, a empresa lidava com eventos culturais, mas um pedido da Federação de Ciclismo mudou esse perfil. Hoje a organização do Tour do Rio está em suas mãos, o que a torna a única mulher que organiza uma prova ciclística da União Internacional de Ciclismo.

Segundo Jucá, essa sua distinção no meio lhe traz vantagens no toque feminino de gerenciamento do evento, detalhista em sua definição. Mas, no meio político, ela vê uma maior dificuldade. A principal frustração da executiva é não ter conseguido abrir um diálogo com o prefeito do Rio de Janeiro, Eduardo Paes. “Será que o prefeito não receberia alguém com a experiência de mercado que eu tenho se fosse homem? Eu tenho minhas dúvidas”, indagou.

Para a executiva, o simples apoio da prefeitura em ceder o espaço é pouco para o que ela imagina que o Tour do Rio pode trazer à cidade, o cada vez mais comentado “legado” de um evento esportivo. A principal vantagem, nesse caso, seria a possibilidade de dar uma educação à população quanto ao uso de bicicletas em vias públicas, além de fomentar o turismo na capital fluminense e em todo o Estado.

Sem não conseguir todos os investimentos almejados, algumas necessidades da competição ficam comprometidas. “Hoje nós não temos verba para comunicação, nós dependemos de mídia espontânea”, afirmou. Além disso, a organização não suporta o crescente pedido de inscrições de equipes interessadas em participar do evento: “Para recebermos um número maior, temos que ter mais estrutura para a segurança de todos que participam”.

Leia a entrevista na íntegra:      

Máquina do Esporte: Como tem sido o trabalho de aprimoramento do Tour do Rio?

Maria Luisa Jucá: O que nós queremos é nos aproximar cada vez mais do Tour de France, o melhor circuito de ciclismo do mundo. Queremos, para isso, estimular o turismo da região por meio da competição. Antes do seu início, chegaremos aos municípios envolvidos para fazer atividades, como aula para educar no trânsito, sobre mobilidade urbana. Serão mais de 600 pessoas entre atletas e organizadores que circularão nessas cidades, e eles têm que ver o potencial do Rio de Janeiro. Além disso, para melhorarmos o evento, temos que ter mais pontos na prova, o que pode ser resolvido com um dia a mais de tour. Temos que trabalhar com mais investimentos. Estamos nesse trabalho de formiga para conseguirmos empresas, que começam a ver a dimensão do evento.

ME: Como o Tour de France pode servir de parâmetro?

MJ: O Tour de France é o mais tradicional; são 98 anos de experiência no evento. Lá as pessoas têm mais costume com a bicicleta, há uma educação de trânsito. No Brasil as pessoas atropelam ciclistas. Na Europa, na França, quem faz isso é preso. A questão da educação com o ciclismo é diferente.

ME: Como essa falta de costume do brasileiro com os ciclistas atrapalha na busca de recursos? Ou isso não é visto como empecilho?

MJ: Não, isso é um fato. Mas tem empresas que apostam no segmento há mais tempo, como foi o caso do Bradesco, que patrocinará o Tour do Rio. Mas essa falta de educação é um empecilho, sim. O motorista não respeita a prática com a bicicleta, é um clima de guerra entre os dois veículos. E é uma guerra desleal. No Brasil não há ciclovias, nem mesmo uma faixa para ciclistas.

ME: Dá para mudar essa cultura em curto prazo?

MJ: O melhor exemplo recente que nós temos é na Colômbia. Nas cidades deles foram construídas ciclovias interligadas, com incentivo ao uso de bicicleta e com educação diária à população para que haja um respeito entre as pessoas. O resultado apareceu rápido e hoje o número de pessoas que usam a bicicleta no país é bem maior. No esporte, eles já têm uma equipe fortíssima para as disputas internacionais.   

ME: Houve um crescimento de participantes no Tour do Rio deste ano?

MJ: No ano passado, foram seis equipes internacionais e dez nacionais. Neste ano, são oito internacionais e 11 nacionais. Existem várias equipes que querem participar, mas nós temos que segurar esse número. Para recebermos um número maior, temos que ter mais estrutura para a segurança de todos que participam. Sabemos que para realizar uma competição de maior porte, temos que minimizar os riscos. E em tour de ciclismo existem alguns riscos de segurança.    

ME: Quais são as empresas que patrocinam o Tour do Rio deste ano e como elas ativam o investimento?

MJ: O Bradesco apóia com lei federal, com R$ 2,7 milhões. O Metrô Rio faz mídia e libera vagões para o transporte durante a competição. A Firjan cede estruturas no interior do Estado, que servem para competidores e equipes. Temos o apoio das prefeituras das cidades envolvidas, entre outras empresas.

ME: Como o Tour do Rio pode ajudar no desenvolvimento do turismo na região?

MJ: Nós fazemos um link no site para as áreas turísticas das cidades envolvidas. Queremos desenvolver um site de turismo para depois formatar para um guia de turismo desses municípios que têm um potencial enorme. Há, por exemplo, regiões menos conhecidas onde as pessoas praticam rafting, e não é divulgado. O Tour passa por esses municípios, e quando você está em uma cidade, você respira essa cidade e pode entender melhor o que pode ser aproveitado.

ME: Como a definição dos Jogos Olímpicos no Brasil tem ajudado na organização do Tour?

MJ: Sinceramente, eu achei que os Jogos Olímpicos iam ajudar muito mais do que têm ajudado. Achei que o esporte iria ser abraçado por todos, mas não foi. A prefeitura do Rio de Janeiro não deu retorno aos nossos pedidos de aporte. Ela só dá o apoio, que significa ceder o espaço. E isso é só uma obrigação. Hoje nós não temos verba para comunicação, nós dependemos de mídia espontânea. É o caso da imprensa. Sem a imprensa, o Tour do Rio não existiria. Eu espero uma resposta do prefeito há dez meses. Mas não há o envolvimento para uma competição que é importante para a cidade. Não sei se ele está concentrado em outros eventos, como os Jogos Militares…

ME: Você é a única mulher que organiza um Tour de ciclismo na União Internacional. Isso é uma vantagem?

MJ: Tenho 20 anos de mercado. Nós já trabalhamos com diversos artistas, diversos eventos. Fui empresário da Bethânia, da Gal Costa, já organizei megaeventos musicais. A mão feminina nesses eventos e no Tour é uma vantagem. Temos uma atenção maior ao nível de detalhes, de arranjos, de toda a organização. Por outro lado, no lado político, há dificuldades. Será que o prefeito não receberia alguém com a experiência de mercado que eu tenho se fosse homem? Eu tenho minhas dúvidas. Ou como se explica eu não ter recebido nenhuma resposta até agora? Nem em entrega de prêmio a prefeitura compareceu em 2010, mesmo com os nossos convites.      

ME: E quanto ao COB? Eles têm dado algum apoio?

MJ: Eles sim. Nós temos um apoio geral, e é o caso do COB e do (Carlos) Nuzman (presidente da Comitê Olímpico Brasileiro). Até cederam os voluntários que estiveram no Pan-Americano para realizar a competição. Agora nós estamos tentando viabilizar um show na chegada do Tour. Isso vai acontecer na Quinta da Boa Vista. Em 2010, a Portela tocou. Para este ano, queremos o Cordão do Bola Preto, um ícone do carnaval carioca. Nós queremos que o Tour seja um marco para o Rio de Janeiro e estamos comprometidos em deixar um legado bacana. Agora só falta o prefeito me responder.                 

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