Raul Viana

No dicionário, a palavra concorrência é descrita como a oposição de indivíduos ou grupos que perseguem um mesmo objetivo. Para a Fórmula 1, o termo representa – sem trocadilhos – o motor que impulsiona o mercado das marcas que sustentam a principal categoria do automobilismo mundial.

Em 2007, a Brigdestone reinou absoluta em todas as etapas do campeonato. A empresa japonesa ganhou o direito de explorar com exclusividade o mercado de pneus na categoria, após seis anos competindo pelo espaço com a Michelin.

O cenário, porém, não é tão animador como parece. Sem a rival, a fornecedora exclusiva da categoria perdeu sua referência. A avaliação é de Raul Viana, diretor de assuntos corporativos da marca no Brasil.

“Nós ficamos como os goleiros. Só aparecemos um pouco mais quando há algum problema. Perdemos um pouco em termos de marca. Ao mesmo tempo, temos uma grande oportunidade de relacionamento com as equipes. De uma maneira geral, o que se pode dizer é que a gente gosta de competição, de ter outra marca concorrendo no mesmo mercado”, afirma o executivo.

Nesta entrevista exclusiva à Máquina do Esporte, Viana faz um balanço da temporada para a fornecedora de pneus, avalia o panorama da F-1 sem sua principal concorrente, revela os investimentos da empresa na categoria e avisa:

“Na competição em si, nós temos que pensar fundamentalmente em uma coisa: segurança. Não podemos dar margem para o piloto se arriscar”, destaca o diretor da empresa, rejeitando a idéia de mudanças radicais nos compostos em razão da “Era Ecológica” que viverá a categoria no próximo ano, com a utilização do biocombustível.

Leia a seguir a íntegra da entrevista:

Máquina do Esporte: Em 2007, a Bridgestone voltou a ser a única fornecedora de pneus na Fórmula 1, repetindo a exclusividade do período de 1998 a 2000. Para a marca, quais as vantagens e as desvantagens de trabalhar sem concorrentes?

Raul Viana: Essa foi uma decisão tomada pela FIA para reduzir custos, porque assim as equipes não precisam fazer tantos testes nos pneus. Também ajuda a igualar a competição. No ano passado, a Renault fazia muitos testes com a Michelin e a Ferrari com a Bridgestone, o que restringia um pouco a competição entre as duas escuderias. Da nossa parte, o interesse de ter um concorrente é muito grande. Termos uma Michelin ou uma Goodyear competindo conosco é muito bom. É assim que as marcas se apresentam para o consumidor e o fã de esporte começa a comparar o desempenho entre elas. Não importa se você é primeiro ou segundo, o que vale é que estar em evidência. Agora, a tendência é que o pneu seja pouco percebido. Como fornecedor único, a empresa nem sempre vai aparecer como aparecia no passado.

ME: Então, a exclusividade “apaga” um pouco o desempenho do produto?

RV: Nós ficamos como os goleiros. Só aparecemos um pouco mais quando há algum problema. Perdemos um pouco em termos de marca. Ao mesmo tempo, temos uma grande oportunidade de relacionamento com as equipes. De uma maneira geral, o que se pode dizer é que a gente gosta de competição, de ter outra marca concorrendo no mesmo mercado.

ME: E qual é o balanço desse primeiro ano sem a forte concorrência da Michelin após seis temporadas?

RV: Temos de fazer uma análise mundial. Nós somos os maiores fabricantes de pneus do mundo e, coincidentemente, competimos pela liderança exatamente com a Michelin. O ano, de uma forma geral, foi muito bom, continuamos crescendo. No ano passado, nosso faturamento foi de US$ 25 bilhões e a tendência é que esse número suba ainda mais ao final da temporada.

ME: A Bridgestone poderá exercer o direito de exclusividade por quantos anos?

RV: São mais três anos. Este ano, na verdade, não conta. A Michelin poderia ter continuado na competição nesta temporada, mas como ela havia perdido a concorrência de fornecedor único para a Bridgestone, ela decidiu se retirar antes do término do seu acordo.

ME: Qual deve ser o principal legado desse período para a marca?

RV: Tudo o que se aprende na competição, as empresas conseguem levar para o consumidor final, esteja ele nas ruas, nas estradas, em qualquer lugar. Trabalhar com exclusividade na F-1 aumentou nossa capacidade de análise. Nós atendemos todas as equipes e podemos entender melhor o que acontece com os pneus. Existe um lado de tecnologia, que a empresa vai gradativamente levando para a rua, para uso doméstico. E existe, é claro, o lado da imagem. Esta sacada de obrigar o piloto a usar dois tipos de composto foi uma jogada muito inteligente. É o que nos dá um pouco mais de evidência. Fez do pneu, em alguns casos, o fator decisivo para uma corrida. Evitou nossa neutralidade na competição.

ME: Foi a maneira encontrada pela empresa para explorar a ausência de outra marca e, de certa forma, deixar o posto de coadjuvante no campeonato?

RV: Claro. Além disso, em cada país onde há corrida, a gente faz um trabalho de aproximação da F-1 com o público, utilizando os pilotos. Nesta semana, vamos lançar uma linha esportiva da Bridgestone, chamada Potenza, focada na velocidade. Estamos aproveitando a corrida no Brasil para fazer isso.

ME: Trabalhar como fornecedor único demanda mais investimento na Fórmula 1. Quanto a Bridgestone aporta na categoria por ano?

RV: Anualmente, a Bridgestone investe cerca de US$ 100 milhões na F-1. Isso inclui a fabricação dos pneus, o apoio às equipes, a propaganda nos autódromos e toda a operação logística.

ME: A Fórmula 1 continua sendo o principal foco de investimentos da Bridgestone no esporte? Quais são as outras categorias que recebem o apoio da empresa?

RV: Participamos, não com tanta intensidade como na F-1, da MotoGP. Inclusive, fomos campeões e superamos a concorrência de Michelin e Dunlop. Também temos parcerias com Kart na Europa e no Japão e, aqui no Brasil, estamos com a Fórmula Truck. Essa categoria é um teste muito importante para nós, tem nos dado informações valiosas sobre tecnologia. Além disso, reforça nosso posicionamento em um mercado riquíssimo no Brasil que é o de transporte de carga. É um mercado onde as pessoas não compram por impulso, e sim fazendo contas sobre a durabilidade e a rentabilidade do pneu. Nós convidamos frotistas para assistirem às provas para criar um relacionamento. O resultado tem sido excelente. O envolvimento com esporte é fundamental para quem trabalha nessa área.

ME: Em 2008, a Fórmula 1 viverá seu primeiro ano na ?Era Ecológica?, com a utilização do biocombustível. Há alguma ação programada pela Bridgestone nesse sentido para discutir as questões ambientais com os pneus?

RV: Na competição em si, nós temos que pensar fundamentalmente em uma coisa: segurança. Não podemos dar margem para o piloto se arriscar. Em relação aos produtos, existem muitas tecnologias que são desenvolvidas que estão, gradativamente, sendo aplicadas. A alteração de alguns compostos, por exemplo, para tornar os produtos ecologicamente corretos. A indústria toda está se movimentando para reduzir isso. Existe uma tarefa muito grande, principalmente aqui no Brasil, que é o recolhimento do pneu em servível. Por intermédio da Anip, que é a Associação Nacional da Indústria de Pneumáticos, há um trabalho enorme para o recolhimento e a destinação final desses pneus. Se for comparar com outros setores ligados ao automobilismo, nós estamos muito à frente nessa questão.

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