ESPECIAL 777 PARTNERS: Como estão os clubes pertencentes à empresa

Resultados esportivos sob a gestão da 777 frustraram torcida do Vasco - Reprodução / Instagram (@vascodagama)

Fundada em 2015, em Miami, nos Estados Unidos, a empresa de investimentos 777 Partners alcançou um crescimento assombroso, nos últimos anos. Seu nome passou a aparecer de maneira recorrente no noticiário brasileiro a partir de 2022, quando ela adquiriu 70% da Sociedade Anônima do Futebol (SAF) do Vasco, que na época, amargava mais uma passagem pela Série B do Brasileirão e estava afundado em dívidas.

O time retornou à Série A e então vieram as contratações e as promessas de grandes investimentos, alguns dos quais ainda não se realizaram. Nesse meio tempo, a 777 Partners viu-se envolvida em uma série de situações controversas, nos diferentes países onde atua.

Suas polêmicas mais recentes envolvem equipes como o Everton, da Inglaterra, o Standard Liège, da Bélgica, e o próprio Vasco, que obteve nesta quarta-feira (15) uma decisão judicial provisória que devolve ao clube o associativo o controle sobre o futebol cruz-maltino. Ainda cabe recurso dessa sentença, que foi proferida pela 4ª Vara Empresarial do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro (TJ-RJ).

Neste especial, a Máquina do Esporte explica como está a situação de cada uma das equipes esportivas que recebem investimentos da 777 Partners:

Sevilla

Considerado um dos clubes de futebol mais tradicionais da Espanha, o Sevilla foi o primeiro time de futebol a receber investimentos da 777 Partners, ainda em 2018, três anos após a empresa ser fundada.

Nessa primeira investida, porém, a empresa conseguiu abocanhar uma fatia muito pequena do clube da Andaluzia, que, segundo informações da imprensa espanhola, seria de 5% a 13%.

Com esse percentual, a empresa não teria como influenciar as decisões no clube. Porém, esse negócio acabou ficando marcado por muita polêmica e por ações no mínimo controversas adotadas pela 777 Partners.

A história se assemelha a uma novela e envolve desde disputas políticas até presidente sendo preso. Em 1992, com base na lei esportiva da Espanha, o Sevilla foi convertido em sociedade limitada, passando a ser controlado por algumas famílias ricas da cidade, além de uma pequena quantidade de ações que foi vendida vários torcedores comuns.

A partir de 2002, sob o comando do então presidente José Maria del Nido Benavente (pai e desafeto do atual presidente José Maria del Nido Carrasco), o clube experimentou sua fase mais vitoriosa, conquistando títulos como Copa do Rei e a antiga Copa da Uefa.

O atual presidente do Sevilla, José Maria del Nido Carrasco, à esquerda, e seu antecessor José Castro, ao centro – Reprodução / Instagram (@josemaria_delnido)

Em 2013, porém, del Nido Benavente seria condenado em última instância e preso, acusado de peculato, no período em que atuou como advogado da Prefeitura de Marbella. Em seu lugar assumiu José Castro, um dos acionistas do Sevillistas de Nervion S.A., que detém o controle acionário do clube até os dias atuais.

Quando deixou a prisão em 2017, del Nido Benavente, que era o maior acionista individual do Sevilla, com 24% do capital, passou a travar uma batalha contra o grupo de Castro. Foi nesse contexto que ocorreu a chegada da 777 Partners, no ano seguinte.

A empresa investiu cerca de US$ 25 milhões (mais de R$ 182 milhões, pela cotação atual) para adquirir sua participação no Sevilla. Na época, ela enfrentou forte reação por parte de torcedores e da imprensa local, que viam com desconfiança a companhia estrangeira que chegava oferecendo somas milionárias pelo clube.

Um fato que chamou a atenção, na época, é que a empresa se dispôs a pagar pelas ações valores muito acima dos preços de mercado. Cada uma custava em torno de € 60, mas chegaram a ser vendidas por € 3,5 mil.

Nesse primeiro momento, a investida da 777 Partners contou com as bênçãos de Castro, que buscava apoio para impedir que del Nido pai obtivesse o controle acionário no Sevilla. A empresa, porém, desejava ela própria assumir o comando do capital do clube.

A parceria seguiu forte até janeiro de 2019, quando Castro e seu grupo resolveram frear as ambições da 777 Partners e pularam para trás em uma venda de ações para a companhia, que já estava praticamente sacramentada.

“Los Americanos”, como eram passaram a ser chamados, resolveram então buscar guarida com del Nido Benavente. A essa altura, porém, Castro já havia manobrado politicamente, a fim de barrar os planos da 777 Partners.

Um grupo de acionistas minoritários apresentou uma moção pedindo a destituição de Andrés Blasquez (homem de confiança da empresa) do Conselho Administrativo do clube. O pedido foi aprovado com 82% dos votos.

O dirigente deixou o cargo acusando Castro de traidor. Blasquez integrava o grupo Sevillistas Unidos 2020 SL, que, por sua vez, representava os interesses da 777 Partners nessa disputa. Em 2021, apoiada por del Nido pai, a empresa ainda tentou uma última cartada para derrubar o presidente.

Porém, del Nido Benavente acabou sendo impedido de participar do pleito e, com isso, a proposta de mudança imediata de todo o Conselho de Administração do Sevilla foi derrotada por irônicos 77% dos votos.

Desde então, a empresa mantém sua participação no capital do clube espanhol, mas deixou de tentar interferir em sua gestão.

London Lions

A 777 Partners escolheu o basquete para realizar seu segundo investimento esportivo. Mas em vez de optar por uma franquia de seu país natal, que possui a liga mais famosa e competitiva do mundo nessa modalidade (a NBA), a empresa decidiu por um clube do Reino Unido, o London Lions.

A quantia paga ao empresário Vince Macaulay, que controlou o time por 27 anos, não foi divulgada. Em 2021, a 777 Partners também comprou 45% da Liga Britânica de Basquete (BBL) por £ 7 milhões (cerca de R$ 45,5 milhões).

Desde a chegada da empresa, o time masculino do London Lions conquistou as duas últimas temporadas da BBL, além de obter suas primeiras participações na EuroCup de basquete.

Já o feminino faturou os três últimos troféus nacionais, além de vencer a temporada 2023/2024 da EuroCup feminina. Mas nem tudo vai bem nesse casamento com a 777 Partners.

Em agosto do ano passado, ela emitiu uma nota oficial para afirmar que não existia “nenhuma investigação sobre sua propriedade do London Lions, e que esses rumores são completamente infundados.”

Em março deste ano, o site esportivo The Athletic, do The New York Times, divulgou a notícia de que a 777 Partners teria feito circular um memorando interno, endereçado a atletas e funcionários. No documento, a empresa comunicou que pretende “priorizar os esforços domésticos do clube no curto prazo, retirando temporariamente a equipe feminina das competições europeias para a temporada 2024/25.”

Genoa

Concluída em setembro de 2021, pouco depois de a empresa ver seus planos serem frustrados no Sevilla, a compra do Genoa representou o segundo investimento feito pela 777 Partners no futebol. Neste caso, porém, ela conseguiu garantir 99,9% das ações do clube mais antigo da Itália.

A empresa pagou € 150 milhões (quase R$ 836 milhões) a Enrico Preziosi, antigo proprietário e que estava muito desgastado com os torcedores. O Genoa foi o sexto time da Itália a ser adquirido por investidores dos Estados Unidos.

Por conta desse contexto, esse foi um dos poucos casos em que a 777 Partners não enfrentou resistências ou desconfiança, mesmo que, em sua primeira temporada à frente do clube, ele tenha sido rebaixado, após terminar em penúltimo lugar na classificação geral da Serie A.

No ano seguinte, o Genoa retornaria à primeira divisão e, na temporada atual, ocupa a 11ª posição na tabela.

Um detalhe interessante é que Blasquez, que foi demitido do Conselho de Administração do Sevilla, hoje ocupa o cargo de CEO do Genoa.

Vasco

Conforme a Máquina do Esporte noticiou nesta semana, a relação da 777 Partners com o Vasco tem sido conturbada e culminou na decisão judicial que anulou a venda da SAF do clube.

Em 2022, quando a compra foi concluída, a empresa pagou R$ 700 milhões por 70% do capital da SAF do clube, que estava na Série B do Brasileirão.

Naquele ano, o clima era de euforia diante dos possíveis investimentos milionários que a 777 poderia fazer, devolvendo o grêmio cruz-maltino ao caminho das glórias.

Em janeiro de 2023, com seu retorno à Série A garantido, o Vasco de fato chegou a ser o clube que mais investiu em contratações na primeira janela do ano. Mas as esperanças durariam pouco. No mês de março, diante dos seguidos tropeços do time, a torcida passou a realizar protestos contra a nova proprietária.

O Vasco permaneceu ameaçado de rebaixamento até a última rodada do Brasileirão e só não caiu graças a uma combinação de resultados que acabou por derrubar o Santos.

A sentença provisória que anulou a compra da SAF do Vasco foi motivada pelas dúvidas que pairam sobre a capacidade financeira da 777 Partners, que acaba de ser derrotada em uma disputa judicial nos Estados Unidos.

“A empresa que prometera a salvação através de vultoso aporte de capital e recuperação da sede vascaína (Estádio de São Januário) hoje apresenta-se [sic] com situação financeira deficitária e incapaz de cumprir com aquele anúncio e pondo em risco a viabilidade da SAF, principalmente quando se foca no êxito futebolístico”, afirmou o juiz Paulo Assed Estefan na análise do caso.

Neste ano, com seis jogos disputados até o momento, o Vasco soma seis pontos e ocupa a 13ª posição na tabela.

2022, o ano da grande expansão

Depois de garantir o controle do Genoa, a 777 Partners resolveu adotar uma estratégia agressiva de aquisição de clubes ao redor do planeta. Além do Vasco, a empresa passou a controlar em 2022 os seguintes times: Standard Liège, da Bélgica (99,7%); Red Star, da França (100%); e Melbourne Victory, da Austrália (70%).

No caso do clube belga, o valor pago foi de € 55 milhões (R$ 307 milhões). Mas, apesar das expectativas criadas, o time não vem apresentando bons resultados em campo.

Tanto que, na sexta-feira passada (10), o elenco do Standard Liège foi impedido por torcedores de deixar o centro de treinamento para enfrentar o KVC Westerlo, pelo Campeonato Belga.

Os protestos são consequência do descontentamento da torcida com a gestão da 777 no clube. Dono de dez títulos do Campeonato Belga, o time terminou a temporada regular na 10ª colocação e não vence há sete jogos nos playoffs, ficando distante da classificação sequer para a Conference League, terceira competição europeia em importância.

Nesta quinta-feira (16), segundo veículos de imprensa do país europeu, entre eles a emissora pública Radio Télévision Belge Francophone (RTBF), o tribunal de primeira instância de Liège determinou o bloqueio de todas as ações do clube, assim como dos bens que a 777 Partners possui na Bélgica.

O juiz que analisa o caso acolheu a queixa feita pelo ex-presidente da equipe Bruno Venanzi e pelos sócios da Real Estate Standard de Liège, devido à não quitação de uma parcela de € 3 milhões (em torno de R$ 16,6 milhões), que a empresa deveria ter pago pelo Estádio de Sclessin.

A aquisição do Red Star também gerou protestos na França e chegou a ser tornar pauta política no país. Fundado, em 1897, por Jules Rimet (que, mais tarde, seria presidente da Fifa e idealizador da Copa do Mundo), o clube da região metropolitana de Paris sempre teve forte identificação com os setores operários da população. Os valores da compra não foram divulgados.

O líder de esquerda Jean-Luc Mélenchon chegou a enviar uma carta ao jornal Le Monde, criticando a negociação: “Para nós, o Red Star é um bem comum que não pode ser sacrificado no altar do lucro.”

O temor de alguns setores da torcida era de que o Red Star acabasse sendo convertido em um farm team, expressão utilizada para se referir a clubes cuja principal finalidade é servir de experiência ou preparação para jovens atletas, que depois vão brilhar em outros times maiores.

O time atualmente é o líder isolado na terceira divisão do Campeonato Francês, com 62 pontos conquistados em 33 jogos, e já está garantido na Ligue 2, na temporada 2024/2025.

De qualquer forma, este é um exemplo em que, no fim das contas, a 777 Partners não vem sofrendo grandes contestações.

No caso do Melbourne Victory, o investimento começou com a compra de uma participação minoritária no clube, por AU$ 8,7 milhões (quase R$ 30 milhões). Em 2022, o time ficou com o vice-campeonato no Campeonato Australiano.

Na temporada seguinte, o clube terminaria em penúltimo lugar na competição, com apenas oito vitórias alcançadas em 26 rodadas. Vale lembrar que, em janeiro de 2023, a 777 Partners ampliou sua participação societária para 70%, graças a um aporte de AU$ 30 milhões (R$ 103 milhões).

Neste ano, o Melbourne Victory terminou em terceiro lugar no Campeonato Australiano, com 10 vitórias e 42 pontos alcançados.

O interesse pelo mercado australiano se justificava pelo fato de a 777 ser dona da Bonza, uma empresa aérea de baixo custo que operava no país.

Recentemente, porém, devido a problemas financeiros, ela teve suas operações suspensas, passando a ser administrada judicialmente. A Bonza teve de cancelar voos e sofreu reintegração de posse de toda sua frota.

Hertha Berlin e Everton

Em 2023, a 777 Partners resolveu fazer movimentos mais ousados, adentrando mercados mais fortes, caso da Alemanha, país mais rico da Europa, e da Inglaterra, que tem o mais forte e badalado campeonato de futebol do mundo, a Premier League.

No mês de março, a empresa concluiu a compra de 64% do Hertha Berlin junto a Lars Windhorst, que havia feito o maior investimento da história da Bundesliga em 2019, quando gastou € 374 milhões (R$ 1,8 bilhões) para obter o controle da equipe. O valor pago pela 777 não foi divulgado.

Na Alemanha vigora uma regra chamada “50 + 1”, que garante aos associados do clube o direito majoritário aos votos. Com isso, apesar de controlar o capital da equipe, a 777 está submetida a freios mais poderosos do que os existentes em outros mercados.

A empresa norte-americana chegou prometendo muitos investimentos, mas, logo em sua primeira temporada à frente do Hertha Berlin, viu o clube terminar em último lugar na Bundesliga e ser rebaixado à segunda divisão.

Na temporada 2023/2024 da 2. Bundesliga, o time ficou vagando pelas posições intermediárias da tabela, sem chances de cair ou de subir.

Apesar da desconfiança de torcedores com o futuro financeiro da 777, o Hertha Berlin se prontificou a divulgar um comunicado afirmando que a empresa “cumpriu todas as suas obrigações contratuais” e “fez todos os pagamentos acordados em dia”.

o negócio da 777 Partners na Premier League está em vias de naufragar. Em setembro do ano passado, a empresa iniciou a compra de 94,1% do Everton junto a Farhad Moshiri, pelo valor de £ 200 milhões (quase R$ 1,3 bilhão, pela cotação atual).

Agora, porém, Moshiri quer cancelar a venda, com base nas notícias sobre o o processo que a empresa enfrenta na Justiça dos Estados Unidos, onde é acusada de fraude fiscal por oferecer fundos supostamente inexistentes como garantia de empréstimos que totalizam US$ 350 milhões (cerca de R$ 1,7 bilhão).

Para que a aquisição do Everton pudesse ser concluída, a 777 Partners teria de primeiro quitar um empréstimo de US$ 197 milhões a um grupo de investidores liderado pela MSP Sports Capital, que é a principal cotada para assumir o clube inglês.

Faltando um jogo para o término da atual temporada da Premier League, o Everton ocupa o 15º lugar na classificação geral, com 40 pontos alcançados.

O que diz a 777 Partners

Em nota divulgada à imprensa, a 777 Partners se pronunciou a respeito da sentença que anulou a compra de 70% da SAF do Vasco.

A empresa se referiu à decisão como sendo “uma aberração jurídica” e afirmou que ela “coloca em xeque não apenas o futuro do Vasco da Gama, mas o sistema do futebol brasileiro como um todo”.

A 777 disse lamentar “profundamente a posição belicosa e intransigente dos novos dirigentes” do Vasco, “em especial de seu presidente” (o ex-jogador Pedrinho).

Leia a íntegra da nota da 777 Partners:

A 777 Partners recebeu com surpresa e indignação, por meio dos veículos de comunicação, a decisão, em caráter provisório, de afastar a empresa do comando do Vasco SAF. 

A liminar, proferida durante a noite em um caso no qual não tivemos acesso aos autos para responder legitimamente, é uma aberração jurídica e coloca em xeque não apenas o futuro do Vasco da Gama, mas o sistema do futebol brasileiro como um todo. Somos investidores internacionais, confiamos no Brasil e na Lei da SAF, projeto criado para permitir a recuperação de grandes clubes por meio de injeção de capital e gestão profissional. 

Desde a aquisição de 70% das ações da Vasco SAF, não deixamos de cumprir uma única cláusula contratual com o CRVG, injetamos mais de R$310 milhões no caixa, aporte essencial para iniciar um projeto de reconstrução do clube. Formamos um novo Vasco, onde os salários de atletas e funcionários são pagos em dia, credores são respeitados e dívidas são quitadas, fatos raros no futebol brasileiro. 

O trabalho de reconstrução é agora suspenso por uma decisão monocrática, sem nenhum embasamento legal e motivada pelos desejos egoístas da nova administração. O episódio, ainda que em caráter liminar, certamente trará efeitos negativos para o time de futebol. 

A insegurança jurídica provocada pelo fato ameaça também o futuro do futebol brasileiro. Não há dúvidas de que trará consequências desastrosas para a Lei da SAF. A pergunta que fica é: que empresa terá coragem para investir milhões de dólares em uma SAF com o risco de perder o poder de comando do dia para a noite em uma canetada, sem ter cometido uma única infração contratual? 

Lamentamos profundamente a posição belicosa e intransigente dos novos dirigentes do CRVG, em especial de seu presidente, que nunca se dispôs a discutir soluções para o Vasco no foro adequado, as reuniões do Conselho de Administração da SAF. 

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