Nascido em 1953, em Clusone, comuna localizada na província italiana de Bérgamo, Antonio Percassi tinha 17 anos de idade quando resolveu se aventurar como jogador de futebol. O clube que lhe deu oportunidade foi a Atalanta, principal equipe da região.
Durante seus cinco anos de contrato, em apenas uma temporada o time conseguiu disputar a Serie A do Campeonato Italiano. Foi em 1972/1973, para logo ser rebaixada. Ao longo de várias décadas, esta vinha sendo a sina da Atalanta: brigar para às vezes subir, lutar como nunca para não cair. Coube a Percassi, que nunca foi um craque (tanto que deixou os gramados aos 23 anos de idade para se tornar empresário), a missão de mudar esse destino.
Dono de uma fortuna pessoal avaliada em US$ 1,6 bilhão (R$ 8,25 bilhões, pela cotação atual), Percassi e seu modelo de gestão implantado na Atalanta, a partir de 2010, são o segredo do clube que conseguiu a façanha de derrubar a lendária invencibilidade do Bayer Leverkusen de Xabi Alonso (campeão invicto da Bundesliga 2023/2024) e assim conquistar a Europa League, o maior título da história do clube italiano.
Quando o juiz apitou o fim da partida realizada nesta quarta-feira (23), no Estádio Aviva, em Dublin, na Irlanda, os holofotes se voltaram quase automaticamente (e com razão) para o técnico Gian Piero Gasperini, que comanda o time desde 2016 e conduziu a Atalanta aos seus melhores resultados dentro dos gramados. Para a equipe chegar a esse ponto, porém, foi necessário que Percassi preparasse o caminho fora de campo, com uma gestão sólida e eficaz.
Laços antigos
A exemplo dos demais clubes da Itália, a Atalanta funciona como uma Sociedade por Ações, modelo conhecido por lá pela sigla Sp. Ao longo de sua história, a equipe já teve diversos presidentes.
Antonio Percassi está em sua segunda passagem à frente do Conselho de Administração da equipe. Nas duas vezes, sua chegada se deu em meio a contextos trágicos para o clube. Na primeira delas, ele teve de assumir o controle da Atalanta depois que o então presidente Cesare Bortolotti sofreu um acidente de carro às margens do Lago Ieso e acabou morrendo.
Nas primeiras temporadas em que Percassi permaneceu na presidência, a Atalanta pode não ter feito campanhas brilhantes, mas conseguiu se manter tranquila nos pelotões intermediários da Serie A, que figurava, então, como o mais badalado campeonato nacional de futebol do planeta. Mas, em 1994, a equipe terminou em penúltimo lugar na tabela e foi rebaixada.
Naquele ano, chegaria ao fim a primeira passagem do ex-jogador à frente do clube, dando lugar a Ivan Ruggeri, que permaneceu no cargo até 2008, ano em que sofreu um acidente vascular cerebral (AVC). Impossibilitado de gerir a equipe, o presidente passou o bastão ao filho Alessandro Ruggeri.
Dois anos mais tarde, porém, após um novo rebaixamento à Serie B, a família Ruggeri vendeu suas ações a Percassi, que retornou à presidência da Atalanta. Desde então, o clube vem avançando de maneira consistente, graças ao modelo de gestão implantado pelo ex-jogador, que possui negócios nas mais diversas áreas.
O grande salto de investimentos da equipe veio em 2022, com a venda de 55% de suas ações para um grupo de investidores americanos capitaneados por Stephen Pagliuca, um dos donos do Boston Celtics, da NBA, e coproprietário do fundo de investimentos Bain Capital.
Avaliado em torno de € 400 milhões a € 500 milhões, o negócio manteve 45% das ações sob o controle de Percassi, que também permaneceu no cargo de CEO.
Empreendedor de sucesso
Embora a vida não tenha feito de Percassi um craque da bola, certamente deu a ele o dom para os negócios. Sua família já possuía investimentos na área imobiliária, um dos ramos em que ele segue atuando.
Uma de suas primeiras empreitadas de sucesso foi em parceria com o Grupo Benetton (multinacional da moda, que foi dona da equipe de Fórmula 1 de mesmo nome), ajudando no desenvolvimento das operações de varejo das marcas United Colors, Zerdodici, Sisley e Playlife.
Atualmente, o Grupo Percassi conta com mais de 5 mil funcionários e atua em parceria com grandes marcas internacionais no mercado italiano, como Gucci, Armani Exchange, Saint Laurent, Nike, Victoria’s Secret, Bath & Body Works, Lego, Garmin e Starbucks.
Além disso, também administra marcas próprias, como Kiko Milano, Womo, Bullfrog e Da30Polenta, sem contar Wagamama, Casa Maioli e Caio Antica Pizza Romana, estas últimas em sociedade com o Grupo Cremonini.
Percassi também foi o responsável por levar a Zara ao mercado italiano e ainda lançou uma série de empreendimentos imobiliários, como o Orio Center Shopping Center e o Antegnate Shopping Center, em Bérgamo, e o Sicily Outlet Village, em Agira, além de haver participado da operação que resultou na criação do Westfield Milan Shopping Center, em Milão.
Modelo de gestão
Em sua segunda passagem na presidência da Atalanta, Percassi optou por adotar um modelo “pés no chão” para sua gestão, buscando ampliar as fontes de receitas do clube e garantir que ele seja sustentável, em termos financeiros.
No último relatório financeiro da equipe, divulgado em junho do ano passado, a Atalanta registrou lucro líquido de € 5,6 milhões (R$ 31,3 milhões). São oito anos consecutivos no azul. Considerando-se os balanços desde 2010, quando Percassi assumiu a presidência, o saldo positivo já totaliza € 163,3 milhões (R$ 912,7 milhões).
Entre as medidas adotadas pelo gestor para melhorar as finanças do clube está a aquisição do Estádio Atleti Azzurri d’Italia, que, até 2017, pertencia à Prefeitura de Bérgamo. O espaço foi totalmente reformulado e teve seus naming rights vendidos para a Gewiss.
Hoje, a Atalanta é um dos poucos clubes da Seria A a possuir estádio próprio, que segue os padrões da União das Associações Europeias de Futebol (Uefa) e tem capacidade para 21,7 mil torcedores.
A administração de Percassi também tem investido em um projeto que busca consolidar e ampliar a base de fãs da Atalanta em Bérgamo, com a iniciativa Neonati Atalantini, que entrega uma camisa gratuita do time a cada recém-nascido na cidade e nas comunas próximas. Anualmente, cerca de 35 mil bebês são presenteados com os uniformes.
As categorias de base são outra fonte importante de receitas para a Atalanta. Dos € 195 milhões que o clube faturou em 2022/2023, € 83,5 milhões foram relativos a transferências de jogadores.
O fortalecimento das categorias de base foi um trabalho iniciado por Percassi ainda em sua primeira gestão, na década de 1990. O trabalho foi tão bem-sucedido que, de 1991 a 2014, as equipes juvenis do clube conquistaram 17 títulos nacionais.