Uma concorrência sem regras claras e prazos de apresentação de propostas ou de escolha do vencedor. Assim foi definida por pessoas que participaram do processo, ouvidas pela Máquina do Esporte, a licitação estabelecida pela Confederação Brasileira de Futebol (CBF) para a escolha do novo detentor de direitos de transmissão da Copa do Brasil.
Na última sexta-feira (26), a entidade anunciou a renovação de contrato com a Globo para os próximos quatro anos (2023 a 2026) em todas as plataformas. A guinada em favor da emissora carioca fez mudar a intenção inicial que era negociar esse contrato com uma agência de marketing, a qual seria responsável pela venda dos direitos e comercialização de ativos publicitários do torneio.
A ideia inicial de Lorenzo Perales, diretor de marketing da CBF, era fazer uma licitação válida por oito anos. Isso atraiu as agências, pois contratos de longo prazo são mais interessantes de serem vendidos ao mercado, já que dão a oportunidade para que se estabeleça parcerias com TVs, plataformas de streaming e anunciantes por um período mais alongado.
IMG, Infront e LiveMode
Três agências, IMG, Infront e LiveMode, apresentaram suas propostas à CBF, com um mínimo garantido de R$ 400 milhões de remuneração por temporada. Esse é o valor do contrato atual, que vence em 2022. O que fosse oferecido a mais, daria mais chance de uma dessas agências sair vencedora da licitação.
“Fundamentalmente, a CBF queria replicar o modelo da Conmebol e da Uefa. Queriam uma agência praticamente toda dedicada à Copa do Brasil”, contou um executivo que participou das negociações.
O processo inicial incluía até a seleção brasileira, que acabou retirada como ativo dessa negociação, que estava sendo tocada pelo departamento comercial da CBF, chefiado pelo espanhol Lorenzo Perales.
O problema é que, se quisesse seguir o modelo da Conmebol na negociação dos direitos de transmissão da Libertadores e Copa Sul-Americana, ou da Uefa para Champions League, Europa League e Conference League, a CBF teria que ter estruturado um manual de como seriam as regras e os prazos desse processo. Isso não foi feito.
Cada agência apresentou sua proposta separadamente e não de maneira concomitante, como é o usual neste tipo de concorrência.
“Quando perguntava o prazo para termos uma decisão de quem seria o vencedor, ficava sabendo que não havia prazo. Simplesmente não tinha data”, revelou um profissional envolvido na negociação.
De 8 para 4
A disputa ficou ainda mais complicada quando a CBF avisou que a concorrência não seria mais válida por oito anos, mas por quatro. Segundo a Máquina do Esporte apurou, a mudança do prazo foi uma decisão de Ednaldo Rodrigues, presidente da CBF, o que deu a entender para os concorrentes que Perales não possuía muita autonomia para gerir o processo.
O departamento comercial da CBF chegou a questionar as agências de marketing se os valores que haviam sido oferecidos por temporada estariam mantidos com um contrato válido por quatro, e não mais oito anos. Todas declinaram.
“A Copa do Brasil é uma tremenda propriedade. Mas um contrato de oito anos gera mais valor, há um controle maior da propriedade, de se comercializar o produto no mercado. Não dá para manter os valores em um contrato de quatro anos”, apontou um participante da licitação.
Globo e SBT entram
Nesse ínterim, o SBT tentou entrar na disputa, mas sem conseguir despertar o interesse da CBF, já que a emissora de Silvio Santos só se interessava pelos direitos de transmissão na TV aberta.
A Globo, por sua vez, também resolveu entrar com força. A emissora carioca fez uma boa oferta pela manutenção desses direitos em todas as plataformas, com ganho real em relação ao contrato atual. Executivos de mercado calculam que esse valor seria de cerca de R$ 600 milhões por ano, o que representaria um ganho de 50% em relação ao contrato atual.
A CBF aceitou essa proposta, jogando fora todo o processo que vinha conduzindo com IMG, Infront e LiveMode. Quem participou do processo acredita que o contrato com a Globo foi vantajoso e remunerará bem os clubes, mas que um acordo com uma agência de marketing poderia representar um faturamento maior. Um dos executivos envolvidos na negociação calcula que a CBF deixará de arrecadar cerca de R$ 100 milhões ao decidir não alterar o modelo atual.
“Não é um contrato ruim. Longe disso. Mas um contrato com uma agência poderia trazer mais ganhos à CBF e, por consequência, aos clubes. Uma agência poderia vender direitos comerciais ou trabalhar a venda dos direitos da Copa do Brasil para o mercado internacional. São atribuições que fogem ao escopo da Globo”, analisou um executivo que participou da concorrência.
Na Globo, a Copa do Brasil ganha a visibilidade de se manter na tela da principal emissora do país, além de estar no Sportv na TV fechada. No entanto, direitos em outras plataformas, que poderiam turbinar o acordo com uma agência, passam integralmente para a Globo, que pode sublicenciar os direitos de streaming da competição para o Amazon Prime Video, em modelo similar ao atual, entre outras possibilidades de arrecadação.