No último fim de semana, os fãs de basquete foram surpreendidos por aquela que talvez seja a mais chocante negociação de atletas ocorrida na história da National Basketball Association (NBA). O Dallas Mavericks trocou com o Los Angeles Lakers o ala-armador esloveno Luka Doncic, recebendo em contrapartida o pivô Anthony Davis.
A negociação entre as duas franquias ocorreu às escuras, ficando restrita aos seus proprietários e a um círculo mínimo de pessoas próximas. Nem mesmo os atletas faziam ideia de que seriam trocados à revelia, situação que é permitida nos Estados Unidos.
Com a proximidade dos playoffs decisivos da temporada 2024/2025, que terão início em 19 de abril, muitos tendem a avaliar a negociação pela ótica puramente esportiva. Enquanto os Mavericks, vice-campeões da temporada passada, reforçam o setor defensivo com a chegada de Davis, os Lakers têm a chance de construir um ataque arrasador, com a dupla LeBron James e Luka Doncic.
Mas a causa secreta por trás dessa troca misteriosa responde por outro nome, dinheiro (muito dinheiro), e tem relação direta com as regras de fair play financeiro da NBA.
Troca alivia cofres das equipes
Luka Doncic, de 25 anos, iniciou a carreira nas categorias de base do Olimpija Ljubljana, da Eslovênia, mas logo chamou a atenção do Real Madrid, que o contratou em 2012. Passados três anos, ele já atuava como profissional, aos 16 anos de idade.
Não demorou muito e, em 2018, o atleta já estava no Draft da NBA, em que se tornou a terceira escolha daquele ano, feita pelo Atlanta Hawks. Porém, a equipe da Geórgia optou por entregá-lo ao Dallas Mavericks, em troca de Trae Young, que havia sido a quinta opção na temporada, além do compromisso de exercer a primeira escolha em 2019.
Na franquia do Texas, não demorou muito para Doncic firmar-se como ídolo. Com uma média de 21,7 pontos, 7,8 rebotes e 6 assistências por partida, ele se tornou, em 2018/2019, o segundo atleta europeu e primeiro jogador da equipe a conquistar (sozinho) o título de “Rockie of the Year”, algo equivalente a “Novato do Ano”.
Nas duas temporadas seguintes, o esloveno seria escolhido para o All-Star Game, até que, em 2021, teve seu contrato renovado pelo Dallas Mavericks, no valor global de US$ 207 milhões (quase R$ 1,2 bilhão, pela cotação atual), naquele que se tornaria o maior acordo da história da equipe. Doncic tornou-se o quinto jogador da história da NBA a firmar um acordo acima dos US$ 200 milhões.
Mas, ao mesmo tempo em que garantiu a permanência do ídolo esloveno no Texas, essa renovação criou, a longo prazo, um sério problema para a franquia.
O contrato firmado em 2021 teria duração de cinco temporadas. Ou seja, ele chegaria ao fim no ano que vem, quando Doncic poderia exercer o direito de negociar para permanecer no Dallas Mavericks ou buscar uma nova equipe.
Se optasse por continuar no Texas, ele estaria elegível a firmar um extensão de contrato conhecida como “supermax”, o que lhe garantiria uma bolada de US$ 345 milhões (em torno de R$ 1,98 bilhão), durante todo o período de vigência dessa eventual renovação, que não se concretizou.
O que é contrato “supermax”?
Os acordos “supermax” foram introduzidos na NBA em 2017, como forma de garantir que os times mantenham em seus elencos as estrelas contratadas via Draft.
Tais cláusulas passam a valer a partir da sexta temporada consecutiva do atleta na franquia, quando o jogador pode receber o equivalente a 25% do teto salarial da equipe. Com o tempo, o percentual vai crescendo e chega a 30%, entre os sete e os nove anos de permanência, atingindo, então, 35%, a partir dos dez anos de vínculo.
Os acordos “supermax” são voltados a atletas que se enquadram em alguns critérios, como ser selecionado para o All-NBA Team, ser escolhido o Jogador Defensivo do Ano ou eleito o “Most Valuable Player” (MVP) (“Jogador Mais Valioso”, em tradução livre).
Com a mudança de franquia, o contrato máximo permitido para Doncic será de US$ 229 milhões (R$ 1,3 bilhão). Apesar dessa quantia superar seu salário atual, convém lembrar que o Texas, onde ele residia até então, não possui imposto de renda estadual. Já a Califórnia, seu novo lar, cobra um percentual de 14,4% sobre salários que excedem US$ 1 milhão ao ano.
Ou seja, com a mudança, Doncic pagará em torno de US$ 33 milhões em imposto de renda estadual (R$ 190 milhões), de modo a que irá receber um salário menor do que em seu contrato com o Dallas Mavericks.
No caso de Anthony Davis, o atleta de 32 anos tinha contrato com os Lakers até 2028. Atualmente, seu contrato possui valor global de US$ 186 milhões (cerca de R$ 1 bilhão), com o detalhe de que, a partir do ano que vem, ele estaria elegível para receber o percentual de 35%.
Ao abrir mão de Doncic, o Dallas Mavericks garante margem para contratar novos talentos, sem estourar o teto salarial imposto pela NBA, e manter sua equipe competitiva nos próximos anos.
Vale lembrar que o atleta esloveno sofreu uma séria lesão nesta temporada, conseguindo atuar apenas em 22 de 49 partidas possíveis até o momento. Nico Harrison, gerente-geral do Dallas Mavericks, citou as preocupações com a questão física como um dos fatores que levaram a franquia a abrir mão de seu jovem ídolo.
Em contrapartida, os Lakers esperam reforçar seu campo ofensivo e preparar um novo ídolo para chamar de seu, já que LeBron James, principal astro da equipe, está prestes a completar 41 anos e, portanto, em vias de se aposentar.