Análise: Continência deveria ser restrita a competições militares

Nos Jogos Olímpicos da Cidade do México, em 1968, Tommie Smith e John Carlos ouviram o hino dos EUA de cabeça baixa e punhos cerrados no alto. Era a cerimônia de pódio dos 200 m. O gesto era símbolo dos Panteras Negras, organização política revolucionária dos negros norte-americanos.

Pela ousadia, os dois foram expulsos do evento, deixaram o atletismo e caíram no ostracismo. Tudo insuficiente para apagar o gesto mais famoso da história olímpica. A dupla foi reabilitada anos depois, mas qualquer manifestação política passou a ser banida pelo Comitê Olímpico Internacional.

Gestos políticos em eventos esportivos foram usuais nos anos 30. A seleção italiana fazia a saudação fascista aos torcedores antes dos jogos das Copas de 1934 e 1938 (o time foi bicampeão). A Fifa nunca pensou em punição.

Na Olimpíada de Berlim-1936, foi comum os atletas alemães fazerem o gestual de reverência nazista. Uma das imagens mais famosas é a da entrega de medalhas do salto em distância. Nela aparece Jesse Owens, um negro norte-americano, no alto do pódio. Na segunda posição, o alemão Lutz Long, que anos depois morreria em batalha na II Guerra Mundial, aparece com a mão estendida, em claro sinal de aprovação ao regime totalitário de seu país. O COI não tomou nenhuma atitude para bani-los.

Corta para o Pan-Americano de Toronto, quase 80 anos depois. Tornou-se comum os brasileiros, contratados pelas Forças Armadas, prestarem continência durante as cerimônias de premiação. Alegam que é um sinal de respeito ao hino e à bandeira nacional.

Potências esportivas, como os EUA, também contam com atletas militares. Alguns esportes historicamente são muito ligados à caserna, como hipismo, pentatlo moderno e tiro esportivo. Não se tem notícia de gesto semelhante feito por norte-americanos em pódios de competições que não sejam militares.

Num país que passou por 21 anos de ditadura militar e vive há 30 uma democracia civil, esse apoio velado ao militarismo soa no mínimo estranho. Ato semelhante não será visto no Rio-2016. Dessa vez, não há por que criticar o gesto do COI. 

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