Análise: Nike vive o dilema da mulher de César

A história conta que Júlio César, imperador de Roma, decidiu se divorciar de Pompeia, em 62 a.C., depois de sua esposa promover um evento restrito a mulheres em sua residência e, nele, entrar um homem disfarçado de mulher. O argumento usado por César para defender o divórcio foi o de que “minha esposa não deve estar nem sob suspeita”, daí derivando para o provérbio que diz que “para a mulher de César, não basta ser honesta, tem de parecer honesta”.

É exatamente esse provérbio que ecoa agora dentro da Nike em meio à revelação do escândalo de doping envolvendo o treinador Alberto Salazar. Pode até ser que o objetivo de Salazar e sua equipe, incluindo aí sua principal patrocinadora, fosse saber se os atletas não corriam o risco de serem sabotados por competidores com pomadas. Mas o caso coloca a Nike dentro de uma tremenda suspeita, talvez tão escandalosa quanto aquela em que se meteu Pompeia.

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A empresa americana costuma dar o benefício da dúvida a todos os seus atletas que são flagrados no doping. Lance Armstrong que o diga. A marca foi uma das últimas a abandonar o ciclista, que sabotou o sistema para nunca ser pego enquanto competia e faturava com o sucesso.

Agora, porém, o caso é complexo. Uma série de e-mails trocados aponta que Mark Parker, o CEO da empresa, não só sabia dos testes como sugeria realizar outros experimentos para que os atletas da marca não caíssem no doping. Sim, não dá para fazer qualquer ilação a partir da leitura dos textos. Realmente pode ser que a ideia da empresa fosse entender o quanto uma pomada pode arruinar a reputação. Mas…

O escândalo Salazar eclodiu há dois dias nos Estados Unidos. A Nike só foi se pronunciar, por meio de um porta-voz, um dia depois. E, pior, o comunicado interno que Parker enviou foi rapidamente espalhado para a mídia. Recentemente, a marca teve de enfrentar a denúncia de atletas grávidas que perderam seus patrocínios. Para tentar corrigir o rumo, a empresa mudou a política de patrocínio às mulheres e iniciou uma vasta campanha na mídia e com suas representantes para dar mais força às atletas.

O caso Salazar, agora, exige uma medida tão drástica e rápida a ser tomada pela empresa quanto o caso das mulheres grávidas. Por mais que não tenha havido maldade naquilo que Parker sabia que sua equipe de profissionais contratada estava fazendo, não dá para simplesmente ignorar que as relações entre as marcas e os atletas precisam ser cada vez mais transparentes. É o negócio da maior marca esportiva do mundo que está sendo sabotado agora.

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