Nesta semana, o Ultimate Fighting Championship (UFC) completa 30 anos. A maior e mais popular organização de artes marciais mistas (MMA) do mundo iniciou suas atividades em 12 de novembro de 1993, com um evento realizado na McNichols Sports Arena, em Denver, no estado do Colorado, nos Estados Unidos.
Denominado de UFC 1: The Beggining, o torneio foi idealizado pelo lutador brasileiro Rorion Gracie e o executivo Art Davie. A dupla buscou inspiração nas lutas do Gracie Challenge, desafios propostos pelos membros dessa família de lutadores, como forma de provar publicamente que seu estilo de jiu-jítsu brasileiro seria superior a outras técnicas ou artes marciais.
Mas a intenção dos idealizadores era elevar essas lutas a um novo patamar, com a participação de lutadores de renome internacional e transmissão em rede nacional. Para o primeiro evento, foram convidados diversas estrelas de artes marciais, em especial do kickboxing, como Benny Urquidez, Maurice Smith, Gene LeBell, Peter Aerts e Ernesto Hoost.
Todos acabariam ignorando o chamado. No fim das contas, o UFC 1 reuniria oito lutadores em busca de um prêmio de US$ 50 mil. Cerca de 7.800 espectadores ocuparam metade dos assentos disponíveis na McNichols Sports Arena e testemunharam Royce Gracie, irmão de Rorion, sagrar-se campeão do evento.
De Mortal Kombat a máquina de fazer dinheiro
Hoje, o UFC tornou-se uma verdadeira máquina de fazer dinheiro. Quem observa esse universo repleto de cifras bilionárias talvez tenha dificuldade em imaginar o quanto foi árduo até a sigla atrair as atenções do grande público.
O UFC 1 foi transmitido apenas no pay-per-view. Posteriormente, uma versão foi distribuída em VHS. O apelo para atrair espectadores consistia na promessa de violência desmedida. Não por acaso, Campbell McLaren, executivo do Semaphore Entertainment Group (SEG), primeiro proprietário da organização de lutas, referia-se ao evento como uma versão televisionada e com pessoas reais do jogo de videogame Mortal Kombat.
De 86 mil acessos de pay-per-view comercializados em 1993, o UFC saltaria para 2,4 milhões em 2019. Esse caminho, porém, foi repleto de revezes. A violência em excesso (favorecida pelas regras iniciais que previam nenhuma investigação de doping, ausência de restrições e que nocaute, finalização ou desistência seriam as únicas formas válidas de se finalizar uma luta), ao mesmo tempo em que ajudou a atrair a atenção do público, acabou por se converter no grande entrave para a modalidade deslanchar.
Mas o pior dos golpes sofridos pelo UFC foi a pressão política, que levou suas transmissões a serem banidas da TV a cabo nos Estados Unidos. Contornar a situação significava rever as estratégias e abrir mão de algumas premissas sobre as quais o torneio foi criado.
O nome “Vale Tudo” foi trocado por MMA, de modo a passar a ideia de que o esporte era seguro para seus praticantes. A criação das Regras Unificadas das Artes Marciais Mistas, em setembro de 2000, foi outro ponto importante que ajudou na expansão da organização.
Se antes os organizadores tinham de realizar eventos em Denver pelo simples fato de que o estado do Colorado não possuía uma comissão esportiva e, portanto, nenhum órgão público barraria a realização de uma luta sem luvas, a partir da unificação das regras e da introdução de uma série de mudanças, diversos estados norte-americanos passaram a poder receber eventos do UFC.
O grande salto
A virada de chave na história do UFC ocorreria em 2001. Apesar das mudanças introduzidas pelo SEG, a organização ainda possuía uma imagem negativa junto a grandes parcelas da opinião pública dos Estados Unidos. Os eventos seguiam fora da TV por assinatura e havia o desafio de regularizá-los em todas as comissões atléticas estaduais no país e no exterior.
O grupo resolveu colocar a organização à venda, despertando o interesse dos irmãos Frank e Lorenzo Fertitta, que acabaram arrematando o UFC por módicos US$ 2 milhões. Em 2016, eles repassariam o negócio para o Grupo Endeavor por US$ 4,1 bilhões (2 mil vezes mais caro do que o preço que haviam pagado). Atualmente, o valor de mercado da marca gira em torno de US$ 12,1 bilhões.
O grande salto para frente do UFC veio com os irmãos Fertitta, que criaram a empresa Zuffa para gerenciar a organização e nomearam o ex-pugilista Dana White para presidi-la.
Ainda em 2001, as lutas do UFC retornaram à TV por assinatura dos Estados Unidos. No ano seguinte, a modalidade obteve autorização para realizar lutas em Las Vegas, palco das principais lutas de boxe do planeta.
Reality show
Outra estratégia fundamental para ampliar o público do esporte e quebrar a resistência de uma parcela da audiência foi a ideia da Zuffa de utilizar outros produtos de entretenimento como forma de promover o UFC. O formato escolhido foi o reality show, gênero criado alguns anos antes e que havia se convertido em uma verdadeira febre em todo o mundo.
No “The Ultimate Fighter”, que estreou em 2005, o público era convidado a acompanhar a rotina diária de jovens lutadores que tentavam se tornar estrelas do UFC. Além de gerar empatia com a audiência, movida pela narrativa da conquista do “sonho americano”, o reality show também mostrava que os praticantes de MMA eram pessoas comuns, fato que ajudou a quebrar a ideia de selvageria associada ao esporte.
Uma vez consolidado no mercado norte-americano, o UFC estava com o caminho preparado para conquistar o mundo.
Expansão mundial
No último dia 4 de novembro, foi realizado, no Ginásio do Ibirapuera, na capital paulista, o UFC São Paulo. Nada menos do que seis brasileiros sagraram-se vencedores no evento.
O Brasil, que já revelou diversas estrelas nesse esporte, representa um dos grandes mercados para o UFC, que viu sua popularidade disparar no país a partir do início da década passada, graças a nomes como Anderson Silva, Vitor Belfort e Júnior Cigano.
O primeiro canal aberto brasileiro a exibir o UFC ao vivo foi a RedeTV!. Não demorou muito e as lutas passaram a ser transmitidas pela Globo. Neste ano, a Band adquiriu os direitos para a TV aberta.
Além disso, o UFC conta atualmente com seu próprio serviço de streaming, o Fight Pass, lançado em 2013 e que hoje em dia está disponível no Brasil e em outros 200 territórios ao redor do mundo. Nos Estados Unidos, a organização possui contrato com o Grupo Disney, no valor de US$ 1,5 bilhão, que garante as transmissões das lutas na ESPN e no ESPN+.
Desde 2020, o UFC possui contrato para fornecimento de vestuário com a marca francesa Venum. Além do Brasil, neste ano foram realizadas lutas da modalidade na Austrália, Emirados Árabes Unidos e Singapura. Em março do ano que vem, será a vez da Arábia Saudita receber um evento.
No segundo semestre de 2024, a China voltará a sediar um evento do UFC após três anos de espera. E os organizadores planejam expandir a modalidade para outros mercados globais, incluindo a Índia, segundo país mais populoso do mundo, e a África.
Por fim, vale lembrar ainda que, em abril deste ano, a Endeavor adquiriu o World Wrestling Entertainment (WWE), em um negócio avaliado em US$ 21,4 bilhões, que criou o maior conglomerado de MMA do mundo.
Ou seja, por ora, o cenário aparenta ser cada vez mais promissor. E a tendência é de que os próximos 30 anos sejam de ainda mais sucesso.