O Conselho de Ética do Comitê Olímpico do Brasil (Cecob) decidiu punir de maneira dura a Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) pela liberação para que o oposto Wallace Souza, do Sada Cruzeiro, disputasse a final da Superliga Masculina, no último domingo (30), contra o Itambé Minas. O jogador havia sido suspenso por 90 dias pelo órgão. A punição venceria nesta quarta-feira (3). Além da CBV, o próprio atleta levou uma pena mais dura.
Na final da Superliga Masculina, o Cruzeiro venceu por 3 sets a 0. Wallace veio do banco e simbolicamente marcou o ponto do título.
Discurso de ódio
O jogador tinha sido suspenso em fevereiro por incitar um atentado ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva em um story publicado em sua conta no Instagram, que possui atualmente 374 mil seguidores.
O oposto, que é defensor da liberação das armas, postou uma foto com uma pistola. Um seguidor mandou a pergunta: “Daria um tiro na cara do Lula com essa 12?” Wallace resolveu fazer uma enquete em seguida e escreveu “Alguém faria isso” com um emoji de anjo sorridente. Abaixo, colocou as alternativas “sim” e “não”. A maioria dos seguidores (54%) respondeu que “sim”.
Diante da péssima repercussão, o jogador apagou o story e gravou um vídeo pedindo desculpas. Não foi o suficiente para comover o Conselho de Ética do COB, que o suspendeu de competições da CBV e do próprio COB. À ocasião, a Advocacia-Geral da União (AGU) havia solicitado abertura de processo e punição contra Wallace à CBV e ao COB.
Liberação
Apesar da suspensão do Cecob, o Superior Tribunal de Justiça Desportiva (STJD) da CBV concedeu uma liminar para o atleta a voltar às quadras. Diante do conflito de decisões, a CBV acionou o Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA), que ratificou a decisão do STJD, contrária ao Cecob.
Para o Cecob, a CBV valeu-se “de uma ilegítima consulta efetuada a uma entidade privada que não possuía competência para decidir a questão posta”. Mesmo assim, com a decisão do CBMA, a CBV resolveu liberar Wallace para atuar na partida final.
O Cecob também informou que nem participou da audiência no CBMA que liberou Wallace:
“Cumpre dizer que uma das partes da pretensa mediação – o COB – não aceitou, nem aceita a intromissão do CBMA no caso em tela – não a legitima -, não compareceu ao dito procedimento e menos ainda autorizou o CBMA a decidir questão já decidida pelo Cecob, o que deslegitima qualquer opinião – fantasiada de decisão – que possa ser aplicada ao caso.”
Punição
Assim, por desobedecer à decisão do Cecob, o órgão suspendeu a CBV do COB por seis meses e recomentou que o Banco do Brasil, patrocinador da confederação, e o Ministério do Esporte cortem os repasses à entidade pelo mesmo período.
Procurado, o Ministério do Esporte informou que ainda não foi oficializado da decisão. Por isso, ainda não iria se pronunciar. Já o Banco do Brasil deu resposta semelhante: “O BB não se manifestará porque não recebeu qualquer ofício até o presente momento”.
Wallace, por sua vez, teve a pena de 90 dias de suspensão de competições e um ano de suspensão da seleção brasileira aumentada para cinco anos em ambos os casos. A punição, se não for revogada, praticamente determina o fim da carreira do jogador de 35 anos. O período de suspensão também será avisado ao Comitê Olímpico Internacional (COI), para que o atleta seja impedido de participar de competições internacionais.
Wallace já havia se aposentado da seleção brasileira, mas havia aberto a brecha de voltar à equipe para os Jogos de Paris 2024. Pelo Brasil, ele foi campeão olímpico no Rio 2016 e medalha de prata em Londres 2012. Em Mundiais, foram duas pratas (2014 e 2018) e um bronze (2022).
Radamés Lattari, presidente em exercício da CBV, também foi suspenso por um ano. Lattari está dirigindo a entidade no lugar de Walter Pitombo Laranjeiras, o Toroca, que pediu licença do cargo para tratar de problemas de saúde.
O Cecob também pediu ao COB o descredenciamento do CBMA, já que eventuais recursos às suas decisões deveriam ser submetidos à Corte de Arbitragem do Esporte (CAS, na sigla em inglês).
Outro lado
A CBV divulgou uma nota oficial repudiando as punições estabelecidas pelo Cecob. Segundo a entidade, houve “total ausência de responsabilidade da CBV no ato que desencadeou o processo. O Cecob não observa as regras do próprio estatuto do COB, ao não considerar a decisão do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA), instância arbitral eleita pelo COB conforme ata de seu Conselho de Administração”.
A confederação também reclamou que “nem ao menos o sigilo do processo ético foi respeitado, uma vez que a imprensa tomou conhecimento da decisão antes mesmo de qualquer comunicado oficial à CBV”.
Com isso, a entidade afirmou que tomará medidas jurídicas contra a decisão “diante da ameaça à participação das equipes de quadra e de praia em importantes competições internacionais”, além da possibilidade de perda de patrocínios.
Para a CBV, a decisão do Cecob “prejudica gravemente a preparação do vôlei brasileiro para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, e impede a participação das equipes nos Jogos Pan-Americanos, nos Mundiais de base e nas etapas do Circuito Mundial de vôlei de praia”.
Nota oficial
Neste link, está a íntegra da decisão do Cecob. Leia abaixo a nota oficial da CBV em sua totalidade:
A CBV recebeu com perplexidade a decisão do Conselho de Ética do Comitê Olímpico do Brasil (CECOB), que suspende por seis meses a filiação da entidade ao Comitê Olímpico do Brasil (COB). A decisão chega ao absurdo de determinar a suspensão do repasse de recursos do COB à CBV e recomendar que entidades públicas ou privadas retirem seus patrocínios e apoios.
Na decisão, totalmente desproporcional e pouco razoável pela total ausência de responsabilidade da CBV no ato que desencadeou o processo, o CECOB não observa as regras do próprio estatuto do COB, ao não considerar a decisão do Centro Brasileiro de Mediação e Arbitragem (CBMA), instância arbitral eleita pelo COB conforme ata de seu Conselho de Administração. Na decisão divulgada nesta terça-feira, o CECOB se contradiz ao pedir o descredenciamento do CBMA como instância arbitral, admitindo que hoje o órgão é competente para atuar nestes casos. Importante destacar que nem ao menos o sigilo do processo ético foi respeitado, uma vez que a imprensa tomou conhecimento da decisão antes mesmo de qualquer comunicado oficial à CBV.
Assim, a CBV se vê obrigada a tomar todas as medidas jurídicas cabíveis para garantir seus direitos, diante da ameaça à participação das equipes de quadra e de praia em importantes competições internacionais, e do risco aos patrocínios e parcerias que dão tranquilidade para o crescimento profissional de jogadores, para a realização de eventos de quadra e de praia, e para o desenvolvimento do voleibol como esporte e como instrumento social.
A CBV reitera que está muito segura das ações que tomou neste caso, todas elas respeitando a legislação e as normas que se aplicavam. Desde o início, a CBV buscou resguardar o voleibol, a Superliga, clubes, jogadores, patrocinadores e torcedores, mesmo sem ter relação direta ou responsabilidade sobre qualquer fato que gerou este cenário. E entende que toda esta comunidade do voleibol não deve ser prejudicada por atos praticados por terceiros ou decisões que extrapolam os limites estabelecidos na legislação.
A decisão do CECOB prejudica gravemente a preparação do vôlei brasileiro para os Jogos Olímpicos de Paris 2024, e impede a participação das equipes nos Jogos Pan-Americanos, nos Mundiais de base e nas etapas do Circuito Mundial de vôlei de praia. Apesar disso, a CBV garante que empenhará todo o seu esforço e seus recursos para manter a preparação dos atletas, de quadra e de praia, para estas importantes competições. E espera que o COB respeite seu estatuto e a legislação vigente, e não tome qualquer medida sem que a CBV tenha direito amplo e irrestrito à defesa.
A CBV também reitera que repudia qualquer tipo de violência ou incitação a atos violentos, incompatíveis com os valores de respeito e igualdade que norteiam o esporte.