Nos últimos dias, enquanto muitos brasileiros ainda repercutiam, extasiados, o retorno de Neymar ao Santos, clube que o revelou, outro astro do futebol conseguiu romper a bolha e reavivar no país um antigo debate, que há décadas (desde que Pelé parou de jogar) movimenta a crônica esportiva e a própria torcida brasileira: quem terá sido o maior jogador da história?
Nestes tempos líquidos, o “esporte” preferido de alguns comentaristas e influenciadores consiste em elaborar listas (nas quais quase nunca aparecem defensores ou goleiros, mas em que atletas são sempre classificados nas chamadas prateleiras de cima ou de baixo, seja lá o que isso queira dizer) ou perguntar a jogadores (aposentados e na ativa) se foram melhores do que determinados colegas de profissão.
De um modo geral, é um tipo de conteúdo que, se não afeta em nada a cotação do dólar nem o Risco Brasil, gera muito engajamento nas redes, uma vez que mexe com paixões, gostos pessoais, memória afetiva e o próprio conceito de verdade histórica.
Prestes a comemorar o aniversário de 40 anos, celebrado nesta quarta-feira (5), o atacante português Cristiano Ronaldo resolveu entrar com tudo nessa polêmica.
Em entrevista concedida ao programa “Los Amigos de Edu”, talk show apresentado pelo jornalista espanhol Edu Aguirre no canal laSexta, o jogador do Al-Nassr, da Arábia Saudita, foi questionado sobre quem considera ser o maior jogador de futebol de todos os tempos e não titubeou:
“Acredito que sou o jogador mais completo que já existiu. Uma coisa são gostos: dizer que se gosta mais do Messi, ou do Pelé, ou do Maradona. Entendo isso e respeito, mas eu sou o mais completo. Nunca vi ninguém melhor do que eu”, declarou.
Suas palavras têm rendido farta matéria-prima para o debate esportivo nacional e internacional. E o principal motivo da discussão persistir é que, no fim das contas, é difícil estabelecer um critério objetivo para dizer quem jogou mais ou menos (uma vez que as estatísticas não dão conta de explicar, sozinhas, a lógica do futebol).
Há um campo, porém, em que sem dúvida Cristiano Ronaldo pode ser considerado o maior da história: o dos negócios. Nenhum jogador, até o momento, conseguiu faturar tanto quanto ele, seja em salários, seja em contratos publicitários, produtos licenciados ou investimentos diversos. E, neste caso, as cifras atestam com certeza esse fato.
Trajetória de sucesso
Revelado pelo Sporting, de Portugal, Cristiano Ronaldo foi negociado com o Manchester United em 2003, mesmo ano em que fez sua estreia na seleção portuguesa principal, então treinada pelo brasileiro Felipão.
Ele chamou a atenção do mundo com seu bom futebol na Euro 2004, realizada em Portugal e vencida pela Grécia, que derrotou os donos da casa na final.
Depois de conquistar títulos importantes pelo Manchester United, como a Champions League e o Mundial de Clubes da Fifa, e ganhar a primeira de suas cinco Bolas de Ouro (2008, 2013, 2014, 2016 e 2017), Cristiano Ronaldo foi contratado pelo Real Madrid em 2009 e, no time merengue, se tornou uma lenda.
Na Espanha, conquistou duas edições da LaLiga, quatro Champions League e três Mundiais. Ainda teve uma passagem razoável pela Juventus (não ganhou títulos internacionais, mas venceu duas edições seguidas da Serie A) e depois um retorno apagado ao Manchester United, até resolver se aventurar pelo futebol árabe, a partir de 2023.
Projeto sólido na Arábia Saudita
Aventurar-se, a bem da verdade, talvez não seja a expressão mais adequada para se referir a essa escolha feita pelo “Robozão” para sua carreira.
Isso porque ele soube identificar uma oportunidade e tanto de faturar somas inimagináveis, mesmo para quem estava acostumado aos padrões da elite do futebol europeu. Em 2022, quando foi dispensado pelo Manchester United em meio à Copa do Mundo do Catar, poucos imaginavam que ainda houvesse espaço para CR7 brilhar no futebol.
A situação foi agravada pela fraca atuação do ídolo no Mundial, quando chegou a ficar na reserva da seleção portuguesa.
Na mesma época, porém, a Arábia Saudita iniciou um projeto ousado, visando a consolidar seu campeonato nacional, a Saudi Pro League, com fartos investimentos do Fundo de Investimento Público (PIF) na contratação de astros que atuavam no futebol europeu.
E, dessa forma, aquilo que poderia aparentar uma barca furada acabou se mostrando um projeto sólido no Al-Nassr, que permitiu ao craque português não apenas continuar colecionando recordes de gols, como também demonstrar a força de sua imagem, na medida em que foi capaz de atrair holofotes a um mercado que busca se consolidar internacionalmente.
Máquina de ganhar dinheiro
Dizem que não devemos comparar jogadores de épocas distintas, pois as condições enfrentadas por eles nos gramados eram diferentes. Essa máxima talvez possa valer para as finanças também, tendo em vista que as condições materiais encontradas por CR7 no Real Madrid eram bem mais avançadas que as vividas por Alfredo Di Stéfano, por exemplo, em um período sem TV ou internet, e em que nem de longe a Copa do Campeões (atual Champions League) possuía o glamour e a repercussão atuais.
Quando Pelé firmou seu contrato para divulgar a chuteira Puma King durante a Copa de 1970, os contratos individuais de vulto firmados pelas marcas com os atletas eram uma raridade. Então, gerações que antecederam Cristiano Ronaldo nunca tiveram a oportunidade de faturar com publicidade, licenciamento, royalties e marcas próprias.
Todo esse filão de mercado foi desbravado e consolidado por outras figuras grandiosas do passado, não apenas do futebol, mas de outros esportes.
E, se não criou uma nova forma de gerar receitas, é fato que Cristiano Ronaldo soube, como ninguém, explorar ao máximo todas as possibilidades de negócio existentes para uma estrela esportiva da atualidade. Os que o chamam de “Robozão” só não explicam que essa máquina está programada justamente para ganhar dinheiro.
Cada passo seu é milimetricamente pensado de modo a gerar fortunas, seja com itens licenciados, seja com parcerias comerciais de peso, com marcas como Nike, Clear, Binance e Herbalife.
As linhas próprias do jogador incluem produtos e serviços como fragrâncias, roupas íntimas masculinas, calçados, hotéis, academias, clínicas de estética e água mineral.
Sim, pois quem não se lembra da entrevista coletiva concedida em 2021 por Cristiano Ronaldo, pouco antes da partida entre Portugal e Hungria, válida pela Euro daquele ano, em que ele empurrou duas garrafas de Coca-Cola (patrocinadora do torneio) presentes na mesa e defendeu que as pessoas consumissem água, em vez do refrigerante?
Naquele dia, as ações da empresa, que começaram cotadas em US$ 56,10, caíram para US$ 55,22, meia hora após as declarações do atleta.
Em seu site oficial, a água mineral de Cristiano Ronaldo, a Ursu, é descrita como “uma inspiração para se beber saúde e estilo de vida”.
No ano passado, a revista norte-americana Forbes estimou que Cristiano Ronaldo fatura anualmente em torno de US$ 65 milhões (R$ 376 milhões) fora de campo.
Um dos fatores que ajudam a explicar a força comercial do atleta é sua presença avassaladora nas redes sociais. Há alguns anos, ele é o ser humano mais seguido no Instagram e atualmente conta com 649 milhões de fãs.
Seu canal oficial no YouTube, lançado no ano passado, alcançou a marca de 50 milhões de inscritos em apenas uma semana. Atualmente, está com 73,5 milhões de membros.
Salário bilionário
Quando Pelé, citado na entrevista em que Cristiano Ronaldo declarou-se o maior jogador de futebol da história, resolveu voltar aos gramados e vestir a camisa do New York Cosmos, ajudando a popularizar o “soccer” nos Estados Unidos, o contrato garantia ao brasileiro um salário anual de US$ 2,5 milhões.
Considerando-se a inflação do dólar de 1975 até agora, essa quantia teria o poder de compra equivalente a US$ 14,7 milhões (R$ 85 milhões). À época, porém, era um dos maiores contratos já firmados na história do esporte.
O mesmo desenvolvimento do modo de produção capitalista, que deu a Cristiano Ronaldo a chance de licenciar uma infinidade de produtos e serviços e se tornar embaixador de grandes marcas globais, graças a uma legião de centenas de milhões de seguidores nas redes sociais, também permitiu ao português fechar com os clubes contratos com cifras que as gerações anteriores sequer ousariam sonhar.
Em 2020, segundo a Forbes, ele se tornou o primeiro atleta da história a ultrapassar US$ 1 bilhão em ganhos na carreira. Desde então, sua fortuna não parou de crescer, tanto que ele tem liderado com folga a lista dos futebolistas mais ricos do planeta.
No ano passado, além dos US$ 65 milhões obtidos fora de campo, Cristiano Ronaldo recebeu US$ 220 milhões (R$ 1,6 bilhão, pela cotação da época) como jogador do Al-Nassr. A soma inclui tanto o salário pago pelo clube quanto os acordos comerciais firmados pelo atleta na equipe.
Para este ano, conforme divulgou a Máquina do Esporte, o atacante português poderá ganhar do Al-Nassr uma quantia maior do que o faturamento do Flamengo ao longo de 2024.
O salário do atleta ficará em US$ 183 milhões, o equivalente a R$ 1,13 bilhão, pouco menos do que as receitas obtidas no ano passado pela equipe carioca, que foram de R$ 1,19 bilhão. Além disso, porém, CR7 passará a ser dono de 5% do Al-Nassr, passando a lucrar em cima do faturamento da equipe.
Um levantamento feito pela Somos Fanáticos mostra Cristiano Ronaldo no topo do ranking salarial de astros esportivos com 40 anos de idade ou mais. Na lista, ele aparece à frente de nomes como o piloto de Fórmula 1 Lewis Hamilton, da Ferrari, que ganha US$ 60 milhões anuais, e LeBron James, do Los Angeles Lakers, da NBA, que fatura US$ 48,7 milhões.