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O futebol brasileiro em 2025: Entre o céu dos resultados e o inferno da sustentabilidade

Receitas recordes e dívidas crescentes coexistem com a impaciência dos torcedores e a luta por identidade e sustentabilidade financeira

Sport (maior decepção) e Mirassol (maior surpresa) se enfrentam pela 30ª rodada do Brasileirão 2025 - Paulo Paiva / Sport

Se há uma certeza no futebol brasileiro em 2025, ela é paradoxal: nunca antes os números foram tão volumosos nem tão contraditórios. O Relatório Convocados 2025, sintetizado em parceria com a Galapagos Capital, traz à tona essa realidade crua, em que receitas recordes e dívidas crescentes coexistem com a impaciência dos torcedores e a luta por identidade e sustentabilidade financeira.

Segundo o relatório, o ano foi de recordes financeiros e, ao mesmo tempo, de alertas profundos, já que os clubes da Série A do Campeonato Brasileiro somaram R$ 10,2 bilhões em receitas em 2024, o maior valor já registrado. Esse crescimento, impulsionado por negociações de atletas, transmissões e patrocínios, revela um amadurecimento econômico que muitos clubes não conheciam há décadas.

Porém, essa prosperidade é apenas superficial. Enquanto as receitas aumentaram em cerca de 10% em relação a 2023, as dívidas acumuladas dos clubes chegaram a R$ 14,6 bilhões no mesmo período, um sinal claro de que mais dinheiro não significa mais saúde financeira. Esse fosso entre entrada e responsabilidade financeira é um espelho do futebol brasileiro: promessas de glamour em campo, mas fragilidades crônicas fora dele.

Todo protagonismo carrega o fardo de parecer insuficiente. Foi essa frase que me veio à cabeça ao revisar os artigos que escrevi em 2025, assim como o relatório que traz as suas idiossincrasias, com os evidenciados altos e baixos de um esporte que nos define, nos consome, nos ilude e, de tempos em tempos, nos redime: o futebol.

Neste ano que se encerra, entre gramados (sintéticos ou naturais), gabinetes e arquibancadas, vi líderes brilharem e também tombarem. Vi o céu em Mirassol e o inferno no Castelão. Vi Neymar voltar para casa e, paradoxalmente, a paciência sair por outra porta, mas, acima de tudo, vi que o futebol brasileiro não aceita mais coadjuvantes. Nem mesmo entre os protagonistas.

Em campo, clubes como o Palmeiras, protagonista há mais de uma década, disputando até o final os grandes títulos nacionais e continentais, inclusive a final da Copa Libertadores contra o Flamengo, se vê sempre questionado, ao menos por parte da imprensa e também por parte da torcida, exigente por natureza, que demonstrou impaciência com a maneira como a equipe jogou ou resolveu seus jogos. Isso ilustra uma tendência do torcedor moderno: não basta ganhar, é preciso convencer, e essa pressão social transcende os números e se torna um fator real de gestão e comunicação para clubes que querem converter sucesso em legado.

Os dados econômicos lembram a todos que o futebol brasileiro vive uma crise de sustentabilidade: receitas crescentes não reduziram perdas operacionais nem equacionaram déficits de longo prazo. A falta de um Fair Play Financeiro efetivo, associado a gastos crescentes com salários, transferências e custos de operação, empurra muitos clubes para o limite administrativo, e, nesse contexto, títulos e campanhas esportivas começam a ser eclipsados pela pergunta estruturante: como tornar o futebol brasileiro economicamente saudável?

A gangorra emocional do torcedor brasileiro é uma parte importante e que precisa ser sempre considerada, mas não deve servir como base para tomada de decisões de curto prazo, já que podem influenciar o longo prazo de qualquer projeto no futebol. Um bom exemplo disso se aplica ao que foi também o ano da reconstrução do Santos, que de Sociedade Anônima do Futebol (SAF) recusada se reposicionou como símbolo de esperança e potencial de marca, um case que mistura nostalgia e estratégia contemporânea.

O clube se tornou um case de engajamento com a volta do filho pródigo Neymar e a liderança política e simbólica de Marcelo Teixeira, que traz consigo histórias de um passado glorioso e um futuro promissor com a iminente construção da nova Vila Belmiro, apesar dos ânimos aflorados do torcedor no final de 2025. É um cenário que já vimos em outros momentos e que projeta dias melhores para o alvinegro praiano.

Do outro lado, há o Corinthians, que colapsou financeiramente em uma novela que começou fora das quatro linhas e que mesmo assim foi campeão paulista e está na final da Copa do Brasil. É uma dessas histórias inexplicáveis que só o futebol explica. 

Da Série B vem o Coritiba, transformado em SAF, que retorna à elite com uma estrutura empresarial e planos de longo prazo, já servindo de exemplo de como esse modelo pode contribuir para a estabilidade e o crescimento de um clube.

Não posso deixar de citar o grande fato novo do ano, o Mirassol. Com orçamento modesto e governança criteriosa, o clube do interior paulista se transformou em um verdadeiro case de eficiência, mostrando que planejamento e clareza estratégica podem competir com grandes investimentos para estar presente na fase de grupos da Libertadores.

No vácuo dessas turbulências, a liderança da Confederação Brasileira de Futebol (CBF) passou por mudanças ao longo de 2025, sinalizando que o modelo de governança, e não apenas o modelo esportivo, precisa ser repensado. A nova gestão assume uma entidade que não é apenas árbitra de competições, mas protagonista na criação de um ambiente mais sustentável, competitivo e respeitado internacionalmente.

Por fim, o futebol brasileiro em 2025 nos obriga a refletir sobre uma pergunta: por que nem mesmo a vitória tem nos bastado?

Porque a impaciência do torcedor moderno não tolera mais apenas resultados. Ele quer significado, identidade, propósito e estilo, além de uma liderança administrativa e empresarial cada vez mais nos holofotes, cobrada por eficiência e que precisa aprender com os números e com as histórias dos clubes que conseguem administrar bem todas as linhas de receita e não se aventuram com despesas impagáveis.

O ano que passou nos mostrou que talento em campo não substitui governança fora dele, e que estatísticas impressionantes podem camuflar riscos estruturais profundos. Se 2025 foi o ano do “quase”, 2026 será o ano do “tudo ou nada”.

Teremos Copa do Mundo, um novo formato da Copa do Brasil, mais SAFs (ainda mais pressionadas por resultados e por compliance) e torcedores cada vez mais exigentes (e menos românticos). Quem não entender o que o torcedor quer, perderá o jogo antes do apito inicial. 2026 será o ano em que a liderança no futebol brasileiro deixará de ser sinônimo de status para ser de responsabilidade.

O futebol brasileiro viveu um 2025 de dualismo intenso: rico em receitas, pobre em sustentabilidade; pródigo em histórias, incerto no futuro; amado pelas arquibancadas, mas cobrado sem trégua. E ainda com protagonistas contestados, renascimentos improváveis e quedas dolorosas.

Para 2026, a pergunta que fica não é quanto o futebol brasileiro vai faturar, mas quanto ele será capaz de evoluir em campo, nas arquibancadas e na gestão que molda seu destino.

O artigo acima reflete a opinião do colunista e não necessariamente a da Máquina do Esporte

Reginaldo Diniz é cofundador e CEO do Grupo End to End

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