O ano de 2025 marcará um novo momento no futebol brasileiro. Será a primeira vez em muitos anos que teremos duas emissoras de TV aberta, Globo e Record, transmitindo jogos do Campeonato Brasileiro. No início dos anos 2000, isso também aconteceu, mas naquele momento a Globo sublicenciava o conteúdo à Record e posteriormente à Band, e obrigava a parceira a exibir o mesmo jogo que ela exibia aos domingos, às 16h.
Desta vez, será diferente. A Globo tem acordo com a Liga do Futebol Brasileiro (Libra) e exibirá os jogos deste grupo de clubes como mandantes. A Record, por sua vez, fechou com a Liga Forte União (LFU), então só poderá exibir jogos deste grupo de clubes como mandantes. Para exemplificar: o jogo Flamengo x Corinthians será exibido pela TV Globo, enquanto o confronto Corinthians x Flamengo será exibido pela Record. A Globo continuará com seu horário tradicional aos domingos, às 16h, já a Record exibirá o jogo a que ela tem direito também aos domingos, mas às 18h.
Além disso, nas plataformas pagas, por enquanto, Sportv e Premiere só detêm direitos de jogos da Libra. Ainda sem anúncio oficial, a Amazon exibiria um jogo por rodada dentro do seu serviço Prime Video. A frase anterior tem um “por enquanto” justamente porque a LFU ainda tem pacotes disponíveis, portanto ainda existe a possibilidade de Sportv e Premiere engrossarem os seus pacotes, ou ainda um terceiro interessado abocanhar estes últimos jogos.
A divisão de direitos em várias plataformas não é novidade no mercado de mídia. NFL e NBA são dois exemplos de ligas que vêm fazendo isso há muitos anos nos Estados Unidos, o que de certa forma se reflete aqui no Brasil também. Os jogos da NBA que a ESPN exibe em território brasileiro fazem parte do acordo doméstico. Já a Amazon, que também tem um pacote de direitos apenas no Brasil e no México, passará a ser parceira da liga de forma global a partir da temporada 2025/2026, inclusive com exclusividade de algumas finais ao longo dos 11 anos de contrato, o que aumentará a quantidade de jogos exibidos por aqui também.
No nosso mercado local, o empacotamento de jogos existe há algum tempo. A única diferença é que, até pouco tempo atrás, quem definia esses pacotes era o comprador. O Grupo Globo, como detentor exclusivo de todos os jogos do Campeonato Brasileiro, distribuía os jogos nas próprias plataformas de acordo com o que considerava a melhor estratégia para monetização: na TV aberta, por meio dos anunciantes; na TV fechada, para quem assina o Sportv; e sempre pensando em alguma forma que justifique o fã pagar um valor adicional para ter o Premiere e assim conseguir assistir a todos os jogos.
Já há algum tempo se discute a exclusividade total, pois o bolso das plataformas de mídia é limitado e a capacidade de gerar receita com todo o pacote também. Portanto, a estratégia de aumentar o número de plataformas com direitos ajuda a aumentar a visibilidade, atrai novas marcas e aumenta a possibilidade de receita.
Quando a TV Globo vende suas cotas de patrocínio do futebol, apenas seis ou sete marcas acabam comprando. Mas agora, com Record e Cazé TV no mercado, ambas vendendo bem as suas cotas, podemos confirmar o que já se sabia, ou seja, há mais gente interessada a se associar ao futebol, só era preciso abrir essa oportunidade. Já são 19 marcas que participarão das transmissões do futebol a partir do ano que vem, e ainda há espaço para outras, uma vez que as últimas cotas ainda podem ser vendidas pelas plataformas que já têm os direitos garantidos e outras plataformas ainda podem adquirir jogos.
Em 2018, quando Conmebol e IMG vieram ao mercado para vender Copa Libertadores, Copa Sul-Americana e Recopa, o processo já previa quatro pacotes distintos, e os compradores podiam fazer propostas apenas pelo pacote ou pacotes que tivesse interesse. O Campeonato Paulista, a partir de 2022, copiou a mesma estratégia. E agora, por motivos diferentes, o Brasileirão também seguirá a mesma linha a partir de 2025. A razão, agora, não é maximizar a receita, mas sim se adaptar a uma situação em que os clubes não conseguiram formalizar uma união e estão rachados em dois blocos. Com isso, não há uma estratégia de empacotamento, mas sim um “tem que se fazer o que dá”.
Na semana passada, a Máquina do Esporte publicou uma matéria que fala que o mercado “comprou” o Brasileirão dividido. E é verdade. Só que cada um comprou uma fatia que tem uma série de asteriscos, possibilidades e riscos.
E isso vale uma conclusão óbvia: se desta forma o mercado comprou, imagine o que não aconteceria caso os pacotes pudessem ser pensados de forma muito mais estratégica, baseados em uma distribuição mais robusta dos 380 jogos? Aí, sim, os números seriam muito maiores e poderíamos finalmente dizer que o Campeonato Brasileiro se transformou em um produto. Quem sabe isso não acontece em 2030, certo?
Evandro Figueira é vice-presidente da IMG Media no Brasil e escreve mensalmente na Máquina do Esporte