O alvoroço causado pela presença maciça de anunciantes do mercado de apostas na indústria de esportes, mídia e games ainda é grande.
Com a regulação do mercado, o assunto não tem data para perder sua força no meio de quem está sendo impactado por isso.
Até aqui, muito dinheiro se viu em patrocínios, anúncios e ativações. Até o meu querido São Bento, de Sorocaba, tem em sua camisa uma marca que vem dessa indústria.
Conversando com alguns colegas e amigos mais próximos, são poucos os que de fato estariam dispostos a trabalhar, digamos, voluntariamente em uma empresa de apostas.
“Se não tiver mais nada para fazer e tiver que pagar as contas, eu vou”, já ouvi.
Há os que alegam motivos morais e sociais para não seguirem nesse mercado. A justificativa é o impacto negativo que isso tem nas finanças pessoais de quem aposta e o efeito que isso tem nas pessoas mais próximas, em especial os familiares.
Faz sentido? Sem dúvida.
Não vou me meter a emitir opiniões médicas, mas, até onde eu saiba, o jogo (gambling) pode ser considerado uma compulsão ou uma patologia a ser tratada pelo seu potencial de vício.
42% das pessoas responderam que não trabalhariam no mercado de apostas. Mas será que elas aceitariam vagas em outras indústrias que também geram impactos negativos na sociedade?
Segundo dados da Confederação Nacional do Comércio de Bens, Turismo e Serviços, 71,4% das famílias estão endividadas.
Quanto disso não se dá por falta de educação financeira e falta de critérios para crédito (seja no cartão de crédito, empréstimos e afins)?
Eu tive a brilhante ideia de sair de São Paulo há cinco anos. Não me arrependo nem um pouco.
O mercado imobiliário vem ferozmente varrendo do mapa lugares da minha infância, juventude e vida adulta. A Santana, Pinheiros, Vila Madalena, Vila Olímpia que eu conheci, não existem mais.
Mas existem 4 e 3 dormitórios, varandas gourmet e estúdios empilhando seres humanos como nunca antes.
Ainda falando do espaço urbano, tem a indústria do pneu, do petróleo, de carros, que, pela lógica da coisa, querem mais mercado, mais consumo.
As “techs” também lotaram as ruas de entregadores e motoristas, e o impacto disso é discutido hoje.
Alguém faz cara feia para a indústria do álcool e dos ultraprocessados? E do açúcar e do sódio?
Quantos palmeirenses refletem no impacto causado pelos serviços financeiros prestados pela Crefisa?
Em resumo: os que dizem não à indústria de apostas, diriam não a uma vaga de emprego nessas indústrias que eu usei como exemplo?
Tenho sérias dúvidas.
A gente aposta no Brasil faz tempo
Jogo do Bicho, Jockey Club do Brasil, Loto, Sena, Loteria Esportiva, Raspadinha, Rifa, Bolão Sorteio (com ou sem autorização), Loteria Federal, isso sem contar os títulos de capitalização.
Definitivamente, não é de hoje que trazemos a sorte para dentro de casa e próxima aos nossos bolsos.
Prefiro acreditar que, à luz de qualquer indústria legal no Brasil, devemos ter legislação, aparatos de autorregulação de mercado, pagamento de impostos e artifícios que possam gerar divisas para setores que são usados como lastro para apostas, sendo a fase mais visível o esporte.
Como qualquer outro negócio, não dá para deixar o consumidor à sua própria sorte.
De resto, é business as usual.
Alessandro Sassaroli escreve mensalmente na Máquina do Esporte