Lançada em 2023, logo após o término da parceria da Eletronic Arts (EA) com a Federação Internacional de Futebol (Fifa), a série de jogos eletrônicos EA FC alcançou a marca de 11,3 milhões de usuários em todo mundo, já em seu ano de estreia.
Mesmo com a mudança de nome e a saída da Fifa do negócio, o EA FC conseguiu manter as licenças de mais de 19 mil jogadores, 700 times, 100 estádios e 30 ligas.
Nesse universo, porém, não estão justamente os clubes do Brasil, conhecido mundialmente como o “país do futebol”.
Nas últimas semanas, têm circulado na mídia rumores sobre possíveis negociações para a entrada das equipes do Brasileirão da Série A e da própria seleção brasileira no EA FC 26, que tem estreia prevista para ocorrer em setembro de 2025.
A Máquina do Esporte entrou em contato com a Liga do Futebol Brasileiro (Libra) e a Liga Forte União (LFU), responsáveis por negociar os direitos comerciais e de mídia dos clubes da Série A.
Os dois grupos informaram que, por enquanto, não há qualquer conversa oficial em andamento com a desenvolvedora de jogos eletrônicos (ao menos não de maneira coletiva, o que não significa que algum clube não possa ter sido procurado individualmente pela empresa).
Da parte da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), que detém os direitos das seleções brasileiras, também não há novidades quanto a uma possível inclusão dos times nacionais no EA FC 26.
Entraves de ordem legal têm dificultado a participação das competições, clubes e jogadores do Brasil no jogo eletrônico.
Direito de imagem
Décadas atrás, em um mundo ainda pouco conectado, as indústrias de jogos e de entretenimento tinham menos dificuldade para driblar questões relacionadas a licenciamento de imagem e marca.
Foi dessa forma, por exemplo, que o São Paulo virou o Brancos, o Flamengo se tornou o Domingos e o Barcelona passou a se chamar Catalunha, na série japonesa de mangá e anime Captain Tsubasa, aqui conhecida como Super Campeões.
Outro caso famoso em que as regras de direito de imagem levaram o drible das empresas envolve o atacante brasileiro Bebeto, que serviu de inspiração para o craque Allejo, do jogo International Superstar Soccer, da Konami.
Como o game não era licenciado pela Fifa, utilizava nomes fictícios para os jogadores. A partir de 1997, Allejo apareceu numa versão careca, inspirada no visual de Ronaldo Fenômeno, que brilhava pelo Barcelona.
Na medida em que a globalização foi avançando e os jogos eletrônicos se tornaram mais realistas, esse tipo de solução passou a ser inviável, inclusive por conta de questões jurídicas.
No Brasil, as regras em vigor tendem a ser ainda mais problemáticas para a indústria de jogos.
“A legislação atual do país prevê que os direitos de imagem precisam ser debatidos individualmente”, explica Marcelo Mattoso, sócio do escritório Barcellos Tucunduva Advogados (BTLAW) e especialista em mercado de games e e-Sports.
De acordo com ele, essa definição sobre o direito de imagem está presente na própria Constituição Federal e também em normas específicas como a Lei Pelé e a Lei Geral do Esporte.
Dessa forma, a menos que tivesse as autorizações de todos os times, a EA Sports correria o risco de lançar um jogo com equipes como Copacabana Futebol e Regatas ou Alviverde Imponente disputando o Brasileirão.
“As empresas preferem não colocar os times brasileiros do que usar algo precário”, pondera Mattoso.
Com o surgimento da Libra e da LFU, a negociação do licenciamento com os clubes deixou de ser a grande dor de cabeça para os desenvolvedores de jogos.
O maior problema hoje reside nos atletas, que também precisam autorizar sua presença nos jogos. “Um craque de muita expressão não vai ceder facilmente seu direito de imagem a uma liga ou clube. Ele irá preferir negociar isso individualmente”, analisa o advogado.
O profissional avalia que as discussões com os atletas poderão avançar, na medida em que a empresa for capaz de firmar um acordo com nomes menos conhecidos do Brasileirão da Série A.
“Dessa forma, ela garantiria 98% dos direitos de imagem do campeonato. Depois disso, bastaria conversar com os outros 2% de maior expressão”, afirma Mattoso.