Surgido do nada, há apenas quatro anos, o Amazonas coleciona acessos e troféus. O mais recente deles é o de campeão da Série C do Brasileirão, conquistado no último fim de semana, diante do Brusque.
“Desde que foi fundado, em 2019, o Amazonas bateu todas as metas que definimos, inclusive ultrapassando, como foi no caso da conquista do Brasileiro da Série C”, afirmou Roberto Peggy, CEO do clube.
A fórmula do sucesso da equipe de Manaus reside em uma estratégia que foge do óbvio observado na maioria dos times brasileiros. A própria trajetória de seus fundadores é inusitada. Com experiência na área de comunicação, Peggy iniciou sua caminhada no mundo do futebol há cerca de dez anos, desenvolvendo um projeto no Nacional-AM, maior campeão amazonense, com 43 títulos.
Tempos depois, assumiria como diretor de marketing, até ser eleito presidente em 2017, para um mandato de dois anos. Ao deixar o cargo, Peggy foi procurado por Wesley Couto (atual presidente da diretoria executiva do Amazonas) e Willian Abreu (que havia atuado como diretor de futebol do Rio Negro, segundo maior campeão do Estadual, com 17 taças), com a proposta de criarem um clube a partir do zero.
A estratégia escolhida pelo trio também foi inusitada.
“Nossa meta não era perseguir títulos, mas sim acessos”, explicou Peggy.
A ideia básica dos gestores era fazer com que o Amazonas, avançando de divisão em divisão, passasse a ganhar mais holofotes da mídia e atenção do público.
O primeiro acesso veio logo no primeiro ano de atividade, com direito ao título da Série B do Campeonato Amazonense. Em 2021, a boa campanha na primeira divisão estadual garantiu ao clube a vaga na Série D do Brasileirão para a temporada seguinte.
E mais uma vez a meta de acesso seria batida, com o terceiro lugar na classificação geral da competição nacional. Assim, neste ano, foi a vez de encarar a Série C, com o objetivo de avançar novamente de divisão.
“Para este ano, além do acesso à Série B do Brasileiro do ano que vem, o único título que o elenco e a comissão técnica tinham para perseguir era o do Estadual, porque nos daria a vaga na Copa do Brasil e na Copa Verde. As metas foram alcançadas e até ultrapassadas, já que o troféu da Série C não estava escrito no papel”, revelou Peggy.
Começar do nada
Mas por que começar do zero, em vez de tentar levantar um clube tradicional, que já tinha lastro e reconhecimento?
“Nós três tivemos experiências em times centenários e percebemos que é tudo muito engessado, por conta da estrutura interna. Isso faz com que as decisões se tornem lentas e o clube acabe perdendo o timing nas ações”, contou Peggy.
De acordo com ele, a ideia de iniciar um projeto do nada permitiu que toda a gestão pudesse ser profissionalizada.
“Um grande problema que existe no futebol é o voluntário. O dirigente não é remunerado e acaba por não entregar o resultado. No Amazonas, todos em cargo de gestão são contratados e recebem sua remuneração”, destacou.
Embora a estratégia tenha oferecido maior liberdade para que os fundadores do Amazonas implantassem seu sistema de gestão, começar do nada também trouxe dificuldades. A principal delas é que eles tinham diante de si o desafio de vender para o mercado um clube totalmente desconhecido.
“No início, contávamos basicamente com a reputação dos fundadores, pelos trabalhos que havíamos realizado anteriormente e as relações que estabelecemos com patrocinadores. Além disso, investimos muito em marketing, buscando a construção e o fortalecimento da nossa marca, com redes sociais bem feitas e capazes de impactar as pessoas. Dessa forma, quando visitávamos algum potencial anunciante, tínhamos algo muito profissional para apresentar a eles, com espaço na camisa bem definido e as contrapartidas claras. Uma abordagem muito melhor do que levar um ofício em papel simples, solicitando patrocínio”, explicou Peggy.
O primeiro patrocínio do Amazonas veio antes mesmo do clube se profissionalizar, com uma cota de R$ 35 mil adquirida pela rede de saúde amazonense Samel. A quantia foi utilizada para pagar a taxa da Confederação Brasileira de Futebol (CBF), permitindo que a equipe pudesse disputar competições oficiais no país. Mas, ainda assim, o primeiro ano foi deficitário.
“Tivemos de passar o chapéu para cobrir as despesas, mas no fim superamos a meta, com o título da Série B do Estadual e a vaga na primeira divisão de 2020”, contou.
Dificuldades
A escalada do Amazonas no futebol poderia ter sido ainda mais meteórica, não fosse pelo fato de que sua estreia na primeira divisão estadual ocorreu justamente em meio à pandemia de Covid-19. O clube até chegou a liderar a competição por algumas rodadas, mas depois não conseguiu manter o desempenho, terminando apenas na quinta colocação.
Para piorar, os estádios com portões fechados comprometiam a renda do clube. Por essas e outras, 2020 foi considerado um ano perdido para o Amazonas. Mas não completamente, pois a equipe continuou a se estruturar.
“Tínhamos construído uma boa reputação. Os empresários perceberam que a diretoria enxergava o futebol como um negócio e estava disposta a fazer o Amazonas crescer, colocando o nome do estado em destaque no cenário nacional”, disse Peggy.
Nos anos seguintes, as finanças se equilibraram, e o mercado teve a prova de que o projeto do Amazonas era viável.
“Os empresários perceberam que aqui existia algo de diferente. Tanto que, em abril deste ano, todas as minhas cotas de patrocínio estavam vendidas”, afirmou o executivo.
O Amazonas utiliza uniformes da marca Onça-Pintada, linha própria do clube. Entre seus patrocinadores na Série C deste ano estiveram: Mercado Junior, Governo do Estado do Amazonas, Adrelino Barreto Incorporadora, Pelci, Guaraná Baré, Escola de Atendimento, Pop Vets, Manauara Laboratório, Dara Produções, Demanda, Cerato Transportes e Athletica Nutrition.
Hoje, o clube possui 100% de certidões negativas de débitos tributários, fato que permite a ele receber apoio tanto do Governo Estadual quanto da Prefeitura de Manaus. E, para 2024, Peggy já vislumbra uma situação que ele define como “doce problema”.
“Todas as marcas que estiveram conosco na Série C desejam renovar, enquanto outras empresas desejam entrar”, celebrou.
Clube das massas
A estratégia de marketing e comunicação do Amazonas também tentou fugir do óbvio. Enquanto grandes times do Centro-Sul do país buscam elitizar suas arenas, especialmente com ingressos caros, e focam em consumidores das classes A e B, o time do Norte do Brasil optou por dialogar com o povão.
O Amazonas nasceu com a ideia de ser um time proletário, identificado com a Zona Leste de Manaus, que, apesar de ser a maior e mais populosa da capital amazonense, com mais de 500 mil moradores, nunca contou com um clube de futebol para chamar de seu.
“Entendíamos que o nosso estado nunca havia contado com um clube de massas. Os mais tradicionais tinham perfil de elite e estavam em regiões mais abastadas de Manaus. Dessa forma, o Amazonas foi abraçado pela Zona Leste, tanto que conseguiu levar mais de 40 mil pessoas ao estádio. É um time pensado no Coroado e vivido no Armando Mendes”, explicou Peggy, mencionando os dois bairros que hoje representam bases importantes de torcedores do clube.
A escolha do nome do clube deveu-se ao fato de a palavra “Amazonas” ser reconhecida internacionalmente. Porém, ao definirem as cores do uniformes, os dirigentes trataram de evitar qualquer referência à bandeira do estado.
“Já havíamos decidido, antes de qualquer coisa, que a mascote do time seria a onça-pintada. E foi a partir daí que chegamos ao uniforme amarelo e ao escudo do clube”, revelou Peggy.
Para os próximos anos, o objetivo é manter a trajetória ascendente dentro dos gramados, inclusive disputando o acesso à Série A do Brasileirão.
“O Amazonas nunca entrará em uma competição apenas para participar. Vamos trabalhar para ser protagonistas e ir para as cabeças da tabela, sempre mantendo os pés no chão”, afirmou o executivo.
Segundo ele, o clube pretende intensificar o trabalho na área socioambiental.
“A sustentabilidade e a responsabilidade social estão no nosso DNA. Durante o auge da pandemia, quando as competições foram paralisadas, destinamos todos os recursos do nosso futebol para a compra de 25 mil cestas básicas, distribuídas para famílias em Manaus. Este é o nosso estado, e queremos debater questões ambientais, sociais e ser o clube das populações ribeirinhas, dos povos indígenas e de todo o povo amazonense”, finalizou Peggy.