Monopólio da Fifa no futebol enfrenta nova ofensiva em meio à disputa envolvendo o Mundial de Clubes de 2025

Gianni Infantino, presidente da Fifa, discursa no 74º Congresso da entidade, em Bangcoc, na Tailândia - Reprodução / Instagram (@fifa)

A polêmica que se instalou na Europa, em torno da realização do Mundial de Clubes de 2025, vem ganhando contornos cada vez mais dramáticos, que ameaçam o monopólio da Federação Mundial de Futebol (Fifa) sobre o esporte mais popular do planeta.

Sindicatos ligados à Federação Internacional das Associações de Futebolistas Profissionais (Fifpro) e algumas das principais ligas europeias, entre elas a Premier League, resolveram, agora, prestar queixa formal à Comissão Europeia (CE), por conta da data escolhida para a realização do torneio, que reunirá 32 times e ocorrerá entre os dias 15 de junho e 13 de julho do ano que vem, nos Estados Unidos, justamente em uma época que coincide com as férias dos jogadores no continente.

Os sindicatos e as ligas afirmam que a Fifa “abusou de uma posição dominante e violou a lei de concorrência da União Europeia (UE) ao definir o calendário internacional”.

O Mundial de Clubes de 2025 já é alvo de uma ação que tramita no Tribunal do Comércio de Bruxelas, na Bélgica, em que ligas nacionais e sindicatos pedem que a questão seja analisada pelo Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE).

A queixa à Comissão Europeia foi apresentada nesta segunda-feira (14). Agora, o órgão iniciará uma investigação preliminar sobre a denúncia e, se for comprovado que a Fifa cometeu violações às regras do bloco econômico, a entidade poderá ser forçada a cessar ou desistir do torneio. Ou, pelo menos, consultar as partes que seriam afetadas com a realização do Mundial.

Vale lembrar que, nos últimos tempos, têm se multiplicado as reclamações públicas de astros do futebol mundial em relação ao calendário imposto pela Fifa.

No mês passado, o espanhol Rodri, do Manchester City, declarou que os jogadores estariam prestes a entrar em greve. O clube inglês, que tem vaga confirmada na competição da Fifa, chegou a solicitar o adiamento de suas partidas no início da temporada 2025/2026, de modo a permitir maior tempo de recuperação para o elenco.

“Sentimos pelos jogadores e o que estamos fazendo hoje é tentar encontrar uma solução para evitar essas medidas muito, muito extremas. Espero que não cheguemos a esse ponto, mas é obviamente algo que os jogadores mencionaram e temos que ouvir isso”, afirmou Mathieu Moreuil, diretor de relações internacionais da Premier League.

Estão classificados para o Mundial de Clubes 2025 os seguintes clubes europeus: Manchester City e Chelsea, da Inglaterra; PSG, da França; Atlético de Madrid e Real Madrid, da Espanha; Internazionale e Juventus, da Itália; Bayern de Munique e Borussia Dortmund, da Alemanha; Red Bull Salzburg, da Áustria; e Benfica e Porto, de Portugal.

Entenda a polêmica

Toda essa disputa envolvendo o Mundial de Clubes de 2025 tem a ver com o fato das competições da Fifa e das confederações continentais ocorrerem nos meses de junho e julho, período que coincide com o período de férias no futebol europeu.

Hoje, os principais atletas já estão sujeitos a torneios como Copa do Mundo e copas continentais, a cada dois anos.

Com o Mundial de Clubes de 2025, porém, os jogadores terão de encarar três anos ininterruptos sem férias, já que em 2024 foram realizadas a Copa América e a Euro e em 2026 haverá a Copa do Mundo, que terá como sedes os Estados Unidos, o Canadá e o México.

Apesar de tocar nesse ponto específico, a disputa tem um pano de fundo mais complexo e busca definir, na verdade, quem dá as cartas no futebol mundial. Desde que a Fifa se constituiu como entidade máxima desse esporte, ela tem ditado as regras com punho de aço, ameaçando banir todos que tentaram questionar seu poderio ou a autoridade de suas entidades guarda-chuvas.

Isso ficou evidente, por exemplo, no começo deste ano, quando a Fifa bateu na mesa e garantiu a permanência de Ednaldo Rodrigues como presidente legítimo da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).

Ednaldo havia sido afastado do cargo pela Justiça do Rio de Janeiro em dezembro do ano passado, mas a Fifa e a Confederação Sul-Americana de Futebol (Conmebol) ameaçaram impor sanções ao futebol brasileiro, com a seleção sendo excluída dos Jogos Olímpicos de Paris 2024 e os clubes do país ficando de fora da Copa Libertadores e da Copa Sul-Americana. Com isso, Ednaldo foi reconduzido à presidência da CBF, amparado também em uma liminar do Supremo Tribunal Federal (STF).

Em tempos recentes, porém, a Fifa tem amargado uma série de derrotas, que ameaçam corroer seu poder absoluto no futebol. A principal delas veio no fim do ano passado, quando o TJUE proibiu a entidade e a União das Associações Europeias de Futebol (Uefa) de ameaçarem com sanções os clubes (especialmente Real Madrid e Barcelona, principais entusiastas da ideia) que articularam a criação da Superliga Europeia.

Mesmo que a competição de elite ainda não tenha saído do papel (mas já começou a se organizar, em uma iniciativa liderada pela empresa A22 Sports Management) e as repercussões da decisão judicial estejam restritas à UE, a decisão pode ter reflexos em outras partes do mundo, representando uma “Nova Lei Bosman”, conforme noticiou a Máquina do Esporte.

Hoje, os times profissionais precisam se sujeitar a uma série de normas da Fifa para poderem competir, incluindo a imposição de disputarem torneios pouco rentáveis organizados por federações locais, contra adversários de menor nível técnico.

A questão da Superliga foi citada por Lorin Parys, executivo-chefe da Pro League belga, uma das entidades que apresentaram queixa contra a Fifa.

“Justamente quando conseguimos, junto com os torcedores e muitos outros aliados, manter nossa porta fechada para a ameaça da Superliga, lá vem a Fifa pela porta dos fundos assobiando e gritando ‘surpresa, temos um presente para vocês’. [O Mundial de Clubes] é, na verdade, a Superliga com um nome diferente, pelo menos contém as sementes do que poderá se tornar uma Superliga no futuro. Sentimos que, como órgão mundial do futebol, a Fifa deveria realmente ser uma amiga, mas age mais como uma inimiga. Isso é algo que queremos mudar”, afirmou o dirigente.

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