O Conjunto Esportivo Constâncio Vaz Guimarães, na região central de São Paulo (SP), mais conhecido como Complexo do Ibirapuera, teve seu tombamento definitivamente aprovado pelo Conselho Consultivo do Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (Iphan).
Em votação entre os técnicos do órgão, em sua 106ª reunião, houve unanimidade de conceder ao local o título de Patrimônio Cultural Brasileiro, que será inscrito no Livro do Tombo Histórico e Livro do Tombo de Belas Artes.
O complexo esportivo é formado pelos ginásios Geraldo José de Almeida, mais conhecido como Ginásio do Ibirapuera, e Mauro Pinheiro, de porte menor e utilizado em competições de lutas, além do Conjunto Aquático Caio Pompeu de Toledo, com instalações para natação e saltos ornamentais, e do Estádio Ícaro de Castro Mello, espaço para eventos de futebol, rugby e atletismo.
Mobilização
O pedido de tombamento havia sido feito ao Iphan em 2020 pelo arquiteto Ricardo Sant’Anna, que encaminhou um abaixo-assinado com 72 mil assinaturas, além de uma carta aberta assinada por professores da Faculdade de Arquitetura e Urbanismo da USP (FAU-USP).
“As mobilizações em favor do Ginásio do Ibirapuera expressaram a premissa de que o patrimônio se constitui na relação das pessoas com seus espaços, práticas que são, em si, o patrimônio”, afirmou a conselheira Flávia Brito do Nascimento, autora do parecer de tombamento.
“As manifestações públicas de atletas, jornalistas esportivos, arquitetos e sociedade civil mostraram a multiplicidade de valores culturais que recaem sobre o lugar”, acrescentou.
Shopping center
Durante o governo de João Doria, houve um plano para conceder o espaço à iniciativa privada e transformar o Ginásio do Ibirapuera em um shopping center. O projeto também previa a construção de prédios para hotel, apart hotel e escritórios. Em contrapartida, seria erguido no local um novo ginásio, com capacidade para até 20 mil pessoas.
Entre as propostas recebidas pelo governo estadual à época estava a da construção de um empreendimento imobiliário no local, que pertence a uma área nobre da cidade e conta com 91 mil metros quadrados de terreno.
Em 2021, o conjunto havia recebido tombamento provisório emergencial, contando com proteção federal. Com o tombamento definitivo, fica garantida a preservação desses espaços, erguidos nos anos 1950, como parte das comemorações pelo Quarto Centenário de São Paulo (1954).
Com isso, o governo do estado de São Paulo fica impedido de demolir essas instalações esportivas para a construção de edificações com outra finalidade que não seja a esportiva. O tombamento, porém, não inviabiliza eventuais obras de restauração, modernização e adequações dos espaços para novos eventos esportivos, de acordo com as necessidades atuais.
Valor histórico
Segundo o Iphan, “os edifícios são os mais antigos do conjunto e apresentam soluções plásticas relevantes da arquitetura brasileira e criações técnicas inovadoras para a época em que foram construídos”.
De acordo com o parecer de tombamento, elaborado pela conselheira Flávia Brito do Nascimento, além do valor arquitetônico, o local carrega a memória de grandes eventos esportivos e shows musicais.
Só o Ginásio do Ibirapuera foi palco de disputas como os Jogos Pan-Americanos de São Paulo 1963, os Mundiais de Basquete Feminino de 1971, 1983 e 2006, o Mundial de Vôlei Feminino de 1994, o Mundial de Handebol Feminino de 2011, a Copa do Mundo de Judô de 2011 e o Mundial Interclubes de Basquete de 2015, entre outros eventos.
O Ginásio do Ibirapuera também foi o palco mais usual em que se apresentou Éder Jofre, maior pugilista da história do Brasil. Foi lá que o paulistano realizou 56 de suas 81 lutas da carreira, incluindo a despedida dos ringues, contra o mexicano Octavio Gómez, em 1976.
Marco urbano
Flávia acredita que o conjunto poliesportivo se destaca por valores “sociais, afetivos, formais, além de ser referência à ação, identidade e memória de diferentes grupos sociais” e “contribui, também, para a diversidade tipológica, geográfica e social da arquitetura do século XX protegida nacionalmente”.
O complexo esportivo foi erguido a partir do Plano de Avenidas, que promoveu a remodelação urbana de São Paulo entre as décadas de 1930 e 1950.
O plano de urbanização da área previa a construção de um parque na região, inaugurado em 1950 a partir da formação de uma equipe técnica que incluía nomes como Oscar Niemeyer e Eduardo Knesse de Mello.
O engenheiro e arquiteto Ícaro de Castro Mello, que também foi atleta olímpico (participou do salto em altura nos Jogos de Berlim 1936), foi quem projetou o Ginásio Geraldo José de Almeida. Ele também foi o responsável pela conversão do velódromo do local em pista de atletismo. Esse espaço acabaria recebendo o seu nome.
Já o conjunto aquático foi projetado por Nestor Lindenberg, um dos grandes arquitetos de São Paulo nos anos 1950.
O arquiteto Anderson Félix de Sá, em parecer técnico para o Iphan, ressaltou “a importância simbólica desses espaços por seus próprios usos, seja na memória dos eventos que abrigou, seja na ainda existente apropriação da comunidade para práticas esportivas e atividades sociais”.