Automobilismo e inovação

Colocado sobre quatro hastes perto do volante, espelho retrovisor surgiu na edição das 500 Milhas de Indianápolis de 1911 - Reprodução

Diz a lenda que as corridas de carro tiveram início no momento em que foi produzido o segundo carro da história, cujo objetivo imediato era superar o primeiro.

E assim o esporte se desenvolve há mais de um século, movido desde sempre pela paixão ancestral do ser humano por velocidade e pela inventividade de pilotos, engenheiros e chefes de equipe.

Mesmo equipamentos elementares de segurança hoje corriqueiros em qualquer carro de passeio, como o espelho retrovisor, por exemplo, nasceram nas corridas. E com o objetivo de performance.

Neste caso, foi em uma edição das 500 Milhas de Indianápolis. À época, o regulamento determinava duplas nos carros, com um mecânico embarcado para auxiliar o piloto em eventuais reparos durante a prova e para reportar o que acontecia ao seu redor. Até que um competidor percebeu que poderia competir com o carro mais leve, trocando o mecânico embarcado por um espelho.

Não por acaso, a inovação é o principal traço do esporte a motor.

Isso fica evidente nos carros das principais categorias, aprimorados anualmente por modelos mais eficientes, como prometem ser os carros da F1 que têm sido lançados nesta época.

Mas o pilar da inovação não se restringe ao que acontece apenas dentro da pista. É um valor que, para o bem e para o mal, permeia a cultura do esporte, inclusive na promoção dos eventos.

Assim como acontece dentro da pista, a receita do sucesso em uma temporada, se não for aprimorada, fatalmente não produzirá o mesmo encantamento no ano seguinte.

Vamos a alguns exemplos.

No ano passado, escrevi que a Nascar deu uma verdadeira aula com o Clash (corrida promocional pré-temporada) no Coliseu de Los Angeles. Em 2023, a maior categoria dos EUA repetiu a dose, colocando carros para correr dentro do estádio. As arquibancadas não estavam tão cheias quanto no ano passado e houve 15% de queda nos índices de audiência no comparativo com 2022.

Ainda assim, com 3,647 milhões de espectadores, foi o segundo maior evento esportivo visto na TV nos EUA no fim de semana, atrás apenas do Pro Bowl, o “All-Star Game” da NFL.

Não me surpreenderá se o Clash de 2024 tiver outro formato.

Os executivos da Nascar são muito atentos ao eco que seus eventos proporcionam no público, e tratam de colocar o show em primeiro lugar. Perceberam, por exemplo, o potencial crescente das corridas em pistas mistas e ampliaram sua presença no calendário em 2023, inclusive promovendo pela primeira vez na história um evento em circuito de rua, marcado para Chicago e que terá a presença do brasileiro Miguel Paludo no grid.

Foi exatamente este tipo de visão que faltou aos promotores do Campeonato Alemão de F4, evento que até poucos anos atrás era considerado o campeonato mais forte do mundo para pilotos que ascendiam do kart aos carros.

Nas temporadas 2015 e 2016, o campeonato promovido pela Adac, o maior clube de automobilismo da Alemanha e da Europa, atualmente com mais de 21 milhões de membros, tinha média de 36 carros no grid. Passaram pela F4 Alemã nomes de sucesso como o alemão Mick Schumacher e o brasileiro Felipe Drugovich, ambos posteriormente campeões da FIA F2. Mas, sem novidades no pacote promocional com o passar dos anos, o grid foi minguando depois do período pandêmico até acabar com 11 carros no ano passado, com o fenômeno italiano Andrea Kimi Antonelli sendo coroado como campeão.

Entre os motivos apontados pelas equipes para o declínio estão a escalada de custos, a dificuldade em realizar testes e a redução das pistas de F1 no calendário.

Muito mais focados na promoção dos excelentes eventos de GT que tinham a F4 como evento-suporte, os organizadores acabaram inadvertidamente relegando a categoria de monopostos a um papel menor, até que ficou inviável.

Em algum momento, o time de promoção da F4 Alemã deixou apagar a fagulha de inovação tão necessária no universo do esporte a motor.

São exemplos que servem de alerta para o mercado nacional, que já viu recentemente categorias declinarem e outras florescerem.

Aqui cabe endereçar alguns exemplos positivos dos nossos promotores. Neste ano, a Sprint Race, em parceria inédita com a Nascar, virou Nascar Brasil e foi capaz de atrair um número formidável de novos pilotos e patrocinadores.

O TCR, agora em copromoção com a Vicar, também vem com um pacote de novidades, como o TCR Brasil e o fim dos obstáculos financeiros para a participação de pilotos da Stock Car. O certame sul-americano ganha ainda mais relevância com a realização conjunta de duas de suas etapas com o novo TCR World Tour, formato inovador que promete ser um autêntico Campeonato Mundial para carros de turismo.

Luis Ferrari é CEO da Ferrari Promo e escreve mensalmente na Máquina do Esporte sobre esporte a motor

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