Em abril, a Máquina do Esporte trouxe o resultado de um estudo da S&P Global Market Intelligence, que projeta que os direitos de mídia nos Estados Unidos chegarão a mais de US$ 25 bilhões ainda este ano. Na coluna deste mês, eu gostaria de me aprofundar um pouco mais sobre este tema para mostrar o quanto a diversidade esportiva é importante para estes números e o quão saudável é um mercado diversificado.
Enquanto a NFL e o March Madness do basquete universitário norte-americano respondem por 95% dos programas mais assistidos do ano passado, os outros esportes não são esquecidos e deixados à deriva pelas plataformas de mídia.
A NFL, em um processo extremamente bem-sucedido, conseguiu praticamente dobrar sua receita anual para cerca de US$ 10 bilhões. Agora, o foco está na NBA, que atualmente fatura US$ 2,6 bilhões anuais e quer chegar a US$ 8 bilhões em seu processo de renovação que deve começar no segundo semestre deste ano.
Contando com os valores atuais, NBA e NFL respondem por cerca de 50% do valor dos investimentos em direitos de mídia que ocorrem nos Estados Unidos, enquanto todas as outras modalidades abocanham parte da outra metade. A MLB fica com US$ 1,7 bilhão, a Nascar com US$ 950 milhões e a MLS com cerca de US$ 250 milhões. O restante é dividido pelas mais diversas modalidades, inclusive o esporte universitário, que tem números impressionantes, como o acordo recente do grupo de universidades Big 12 com a ESPN, que vale cerca de US$ 380 milhões anuais.
Os Estados Unidos são um país de dimensões continentais e com uma cultura bem diversificada em partes diferentes do país. Existem estados em que a NBA é o esporte mais popular, em outros esse status é da NFL, e há ainda lugares onde o esporte universitário é maior do que tudo por conta da distância que estão das franquias dos grandes esportes. A pluralidade esportiva e a exposição de todas estas modalidades ajudam a alavancar o interesse e o consequente valor de todos os esportes, não apenas de um. Estive nos Estados Unidos recentemente e vi vôlei de praia universitário, lacrosse e até campeonatos de pega-pega e arremesso de machado sendo exibidos na TV.
No Brasil, desde sempre o foco maior tem sido o futebol. E o discurso é sempre o mesmo: só o futebol dá audiência, com isso é o único esporte que interessa aos patrocinadores e é por esse motivo que as emissoras aceitam pagar valores altos por estes direitos. O que vemos hoje em todas as plataformas, seja TV por assinatura ou plataformas de streaming, é um investimento maciço em futebol, com pouquíssimo espaço para outras modalidades.
Fica aqui, então, uma provocação. Atualmente, o futebol responde por mais de 90% ou até 95% das receitas de direitos de transmissão geradas pelo mercado brasileiro. Entendo que o futebol é o que dá audiência e gira a sua própria roda, mas será que não está na hora de tentarmos um esforço coletivo entre marcas, plataformas e detentores de direitos para aumentar a exposição de outras modalidades para que elas também possam crescer, despertar o interesse do espectador e, assim, criar sua própria sustentabilidade? Antigamente, tínhamos a desculpa da limitação da grade de programação, mas, hoje, com o espaço infinito das plataformas de streaming, este movimento é mais realista. O próprio Comitê Olímpico do Brasil (COB) iniciou o seu Canal Olímpico e está dando espaço de tela para modalidades que só tinham visibilidade a cada quatro anos, durante os Jogos Olímpicos, e os resultados vêm sendo muito positivos.
O skate é um exemplo do que começou ao contrário. Até 2021, a modalidade não tinha nenhuma, ou quase nenhuma, exibição em TV no Brasil. Depois dos resultados de Kelvin Hoefler, Rayssa Leal e Pedro Barros nos Jogos Olímpicos de Tóquio, recebi várias ligações de plataformas de mídia interessadas em competições internacionais da modalidade. Hoje, conseguimos assistir ao circuito internacional e temos eventos até mesmo em TV aberta. Se, com muito pouco investimento, nós já conseguimos estes resultados impressionantes, imagina o que não se conseguirá agora que o skate subiu de patamar no interesse do público (e não apenas na TV, mas também na prática da modalidade).
Precisamos, aos poucos, educar o povo brasileiro sobre o fato de que existe esporte além do futebol e que ele acontece logo ali todos os dias. É com o esforço contínuo de todos os stakeholders do mercado esportivo que conseguiremos impulsionar o bolo do esporte e fazer com que os grandes investimentos possam ultrapassar o futebol e chegar às outras modalidades.
Evandro Figueira é vice-presidente da IMG Media no Brasil e escreve mensalmente na Máquina do Esporte