Não grita gol antes!

A estreia do streaming na Copa do Mundo no Brasil mostrou que a regularidade vai transformando a experiência de acompanhar o jogo em algo cada vez mais natural. Com uma transmissão mais “tradicional” e menos com cara de streaming de games na Twitch, o canal de Casimiro Miguel vai se consolidando no esporte como, há quase uma década, o Desimpedidos surgiu como tábua de salvação para as marcas entrarem no YouTube.

Os mais de meio milhão de espectadores simultâneos na transmissão de Catar 0x2 Equador na Twitch e no YouTube de Cazé mostraram que há um público disposto a migrar para uma alternativa em meio à tradicional exibição de uma partida na TV.

Nos próximos dias, a tendência é que os números sejam ainda melhores. Os jogos serão no horário de trabalho, e teremos uma grande dificuldade em poder acompanhar as partidas na telona.

Mas e quando chegar a estreia do Brasil?

Esse pode vir a ser o primeiro grande aprendizado da transmissão por streaming. A partida de alta relevância para o público, mas exibida sem exclusividade, ainda tende a ser ignorada, fazendo cair a audiência. E o motivo para isso parece óbvio.

Na transmissão da estreia da Copa, Casimiro estava 30s atrasado em relação à exibição na TV, enquanto o Globoplay estava com 33s, e a plataforma Fifa+ contabilizava inacabáveis 1min35s de delay.

Será que o torcedor vai aceitar plugar no serviço de streaming e ver todo mundo gritar gol antes?

Liga mais adiantada quando o assunto é direitos de transmissão, a NFL encontrou o caminho para o streaming ser uma sólida plataforma de exibição do futebol americano ao mesmo tempo que gerou o dobro de receita em direitos de mídia para a liga.

Depois de sete anos testando formatos e modelos, a NFL vendeu um dia de jogo com exclusividade para a Amazon no streaming, enquanto permitiu a todas as demais emissoras que compraram pacotes de transmissão mostrar os jogos tanto no streaming quanto na TV linear. Foi o caminho para evitar que o touchdown seja gritado antes por lá. E que, ao mesmo tempo, abriu espaço para acompanhar a mudança de comportamento do público.

Aqui no Brasil, o streaming caminha para ter uma transmissão cada vez mais similar à dos veículos tradicionais de mídia. Casimiro é só a estrela e chamariz para o público acompanhar um jogo da mesma forma como nos acostumamos com a Band e o seu “Canal do Esporte” nos anos 1980.

Narrador, repórter, comentarista e Cazé formam o quarteto básico da transmissão, que segue o mesmíssimo roteiro da TV. A única mudança é a abolição do comentarista de arbitragem, invenção da Globo nos anos 1990 e que se tornou regra na TV brasileira. No restante, tudo segue como sempre foi.

Ou melhor. Você não consegue gritar gol antes. Pelo menos até os direitos se tornarem exclusivos. Mas aí, provavelmente, o jogo estará em outro nível financeiro, e alternativas como Casimiro tendem a ser engolidas pelas plataformas de streaming que já estarão consolidadas.

Erich Beting é fundador e CEO da Máquina do Esporte

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