O futebol brasileiro passou por profundas mudanças nas últimas duas décadas. Da trágica final entre Vasco e São Caetano, em 2000, para os modernos estádios de 2022, muita coisa passou. Mais precisamente, muito dinheiro entrou. Mas não foi a mesma quantia para todos. E, agora, ficou claro: o desequilíbrio chegou para ficar.
Essa discussão foi mais forte no começo da década de 2010, quando o modelo de venda de cotas de televisão foi alterado. Mas não foi com a TV que surgiu a temida “espanholização”; ela veio com o desenvolvimento do mercado. A própria venda de transmissão passou por uma transformação e adotou um modo mais justo de divisão.
Mas é inegável a diferença que tem sido apresentada nos anos mais recentes. Há cinco anos, a receita do Flamengo, a equipe que mais recebeu naquela temporada, era de cerca de meio bilhão, um pouco mais que o dobro do Cruzeiro, o décimo colocado. Em 2021, os cariocas passaram a marca do bilhão, cerca de quatro vezes mais que o atual décimo colocado, o Athletico Paranaense.
Não chega a ser uma “espanholização” porque outros grandes clubes acompanharam o crescimento; atualmente, ao menos quatro equipes faturam mais de meio bilhão por temporada. Mas essa diferença entre os grandes e os médios nunca foi tão grande.
Obviamente, isso é refletido diretamente em campo. Não é por acaso que, desde 2015, apenas esses clubes que hoje batem meio bilhão que são campeões brasileiros. Hoje, a diferença é tão grande que a equipe reserva do Flamengo é melhor e mais valiosa que a grande maioria das equipes de elite do país.
O que gera um enorme desafio: o que resta a clubes tradicionalmente grandes, mas com receitas mais modestas? Clubes que viveram de títulos em toda a sua história, mas cada vez mais viverão à sombra do protagonismo dos seus rivais?
Será necessária uma urgente e doída mudança de posicionamento para que essa nova condição seja sustentável. Se o torcedor for aos estádios apenas para vencer, a conta não vai fechar. É diferente do que acontece em diversos mercados europeus, em que essa é uma realidade bem mais antiga. Se o torcedor do Everton depender de um novo título inglês, vai ter a vida esportiva um pouco limitada.
Claro que sempre haverá momentos de glória. O Athletico Paranaense, por exemplo, está a um empate da decisão da Libertadores. Mas com faturamento de R$ 280 milhões contra os R$ 977 milhões do Palmeiras, a classificação será, no mínimo, inesperada. E ainda teria que, possivelmente, enfrentar o bilionário Flamengo na final.
Basta saber como alguns dos clubes mais tradicionais do país lidarão com a condição de “azarão” nas próximas décadas. O bom trabalho dessas equipes para se adaptar à situação é fundamental para um futebol brasileiro salutar. Até porque a reversão dessa conta parece um tanto improvável.
Duda Lopes é CEO da Pivô Comunicação e escreve mensalmente na Máquina do Esporte