Opinião: ABA, a liga paralela que mudou o basquete

Enquanto a maior parte da mídia focava na cesta que fez de Stephen Curry o maior cestinha de três pontos da história da NBA, o New York Times encontrou uma maneira interessante de falar sobre a façanha do armador do Golden State Warriors.

O jornal publicou na edição de 19 de dezembro uma reportagem com um pouco da história da criação da linha de três pontos com foco na dúvida sobre quem marcou a primeira cesta atrás da linha na liga na temporada 1979-80.

Por muitos anos, o feito foi creditado a Kevin Grevey, do Washington Bullets, mas Chris Ford teria marcado minutos antes pelo Boston Celtics.

A reportagem atribui a inovação à American Basketball Association (ABA), que existiu paralelamente à NBA entre 1967 e 1976, quando as ligas fundiram as operações.

O lance fez o basquete mais democrático com oportunidade para atletas não tão altos e fortes dominarem o jogo.

Muitos treinadores, dirigentes e especialistas eram contrários à nova pontuação para arremessos convertidos de longa distância, assim como se opunham a outras novidades trazidas pela liga concorrente.

Além dos três pontos, a ABA revelou Julius Erving, um dos maiores jogadores da história, e abriu espaço para a fundação de times como o San Antonio Spurs, o Denver Nuggets, o New York Nets (depois New Jersey e hoje Brooklyn) e o Indiana Pacers.

A ideia inicial do criador da liga, Dennis Murphy, era comprar uma franquia de futebol americano. Na época, a NBA tinha apenas 12 times, e vários mercados importantes ainda não tinham equipes.

George Mikan, herói do basquete nos anos 40 e 50, foi contratado como o primeiro comissário para dar ares profissionais.

Mais na base do desespero do que no planejamento, as enterradas, que eram atração nos aquecimentos, foram transformadas em um concurso para aumentar o interesse pelo jogo das estrelas, em 1976. No ano seguinte, já com a fusão das duas ligas, dez dos 24 jogadores do All-Star Game eram oriundos da ABA.

Curiosamente, a bola colorida (azul, vermelha e branca) que é símbolo da ABA foi uma das poucas novidades não adotadas pela NBA depois da fusão. A história da liga tem poucos registros em vídeo porque não havia transmissão dos jogos pela TV.

Os relatos de quem viveu a experiência foram tudo que restou e servem como base para o livro Loose Balls, do jornalista Terry Pluto, que detalha a aventura que mudou o basquete e o aproximou das comunidades jovens em grandes centros urbanos numa época em que o esporte ocupava um distante terceiro lugar no país atrás de beisebol e futebol americano em termos de popularidade.

Apesar de a ABA ter atraído atenção e talentos durante uma década, não se colocam asteriscos ou questionamentos nos títulos e estatísticas dos jogadores da NBA entre 67 e 76, embora eles não tenham jogado contra todos os melhores jogadores do país.

As principais ligas esportivas aqui nos EUA são monopólios. Não é possível escolher outra liga profissional de basquete ou futebol americano, por exemplo, como fazemos com outros produtos e serviços que consumimos.

Nos dias de hoje, a tradição representa muito do que faz os fãs gostarem do esporte e ao mesmo tempo afasta os mais jovens. Manter estrutura e repetir a cada ano é o que permite colocar estatísticas em destaque e elevar as histórias que dão contadas a cada temporada.

Mas a experiência da ABA mostra que competição e inovação podem fazer muito bem.

* Sergio Patrick é jornalista especializado em comunicação corporativa e escreve mensalmente na Máquina do Esporte sobre o esporte nos Estados Unidos

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