Opinião: A curiosa história do time valio$o que não ganha de ninguém

Morei em Nova York por três anos, entre 2014 e 2017, dois deles na cidade e um no subúrbio. Foi a realização de um sonho de infância viver a energia de uma das principais cidades do mundo para a minha geração. Em Nova York, eu me casei, e lá nasceram meus filhos.

O período também serviu para fazer a minha imersão nos esportes americanos. Eu já acompanhava de perto no Brasil, mas viver nos EUA levou a experiência para outro nível.

Comprei ingressos para a temporada do NYC FC, atual campeão da MLS, atravessei o Rio Hudson de trem para ver o NY Giants pela NFL e peguei o metrô da linha 7 para acompanhar o incrível US Open e dois jogos da World Series de 2015 no Citi Field. Quase congelei no Central Park para cobrir a Maratona de Nova York e fui ao Barclays Center algumas vezes para jogos de basquete dos Nets e noitadas de boxe. Além de ingressos, comprei camisas e bonés de equipes locais. Mas nada dos Knicks, nenhum jogo, nenhum produto. Mesmo assim, de alguma forma, ajudei a franquia a ser o time de basquete mais valioso dos EUA.

É a curiosa história de um time que fatura alto independentemente do desempenho esportivo e ganha dinheiro de quem, muitas vezes, não dá a mínima para a franquia. Toda vez que o ranking das equipes esportivas mais valiosas do esporte americano é divulgado, o New York Knicks aparece nas primeiras posições, e fãs de basquete discutem nas redes sociais tentando entender como um time com desempenho tão ruim pode ser tão valioso.

O grande segredo para o desempenho financeiro é simplesmente o fato de o time estar em Nova York. A combinação entre o tamanho do mercado em que está e a arena em que atua corresponde a nada menos que a metade do valor dos Knicks na avaliação da Forbes (49,2%). Se você mora na cidade, é muito difícil escapar do império dos Knicks. 

Os contratos de TV são muito lucrativos, incluindo muitos dos jogos no canal local MSG, que pertence ao grupo do dono do time. Em algum momento, seja em casa ou em um bar, você será um dos espectadores da programação. Eu não fui a jogos dos Knicks, mas deixei meus dólares nos cofres do time em lutas de boxe que vi com amigos mais de uma vez.

Se você não gostar de esporte, pode ser um show. Justin Bieber, Harry Styles e Michael Bublé estão em destaque na programação dos próximos meses. E mesmo quando o assunto é basquete, uma queda de público por causa de um desempenho ruim tem um impacto muito menor do que se imagina, já que boa parte do dinheiro vem dos acordos corporativos para os camarotes, que as empresas mantêm muito mais pela localização da arena do que pelos resultados em quadra, além de serem receitas fixas para a organização. Em jogos dos Knicks, um camarote varia de US$ 8 mil a US$ 60 mil, mais do que em um show de Justin Bieber, marcado para este mês de junho, com camarotes entre US$ 2 mil e US$ 45 mil.

Com cada metro quadrado muito disputado e valorizado no coração de Manhattan, o espaço do Madison Square Garden é uma raridade a poucos quarteirões de atrações turísticas da cidade como Times Square, Grand Central Station e Empire State Building.

Com a mina de ouro que é o Madison Square Garden e os contratos de TV cada vez melhores para times da NBA, o New York Knicks depende cada vez menos do desempenho em quadra para que a saúde financeira siga impressionando. Melhorar o time é mera questão de escolha do dono James Dolan. Não há pressão do lado financeiro.

Dolan é, para muitos, o pior dono de time da NBA. A família fez fortuna na indústria do entretenimento com empresas como HBO e Cablevision, fundadas pelo pai dele. Nos anos 1990, o grupo assumiu o controle do que é hoje conhecido como MSG Sports, que inclui o New York Knicks, o Madison Square Garden e o New York Rangers, popular time de hóquei no gelo da cidade.

No século XXI, os Knicks chegaram às semifinais da Conferência Leste, em 2012/2013, quando perderam para o Indiana Pacers. Foi o melhor resultado em duas décadas. Nas últimas nove temporadas, o time foi aos playoffs apenas uma vez, com derrota na primeira rodada para o Atlanta Hawks em 2020/2021.

Mesmo assim, o time dos Knicks foi avaliado pela Forbes em US$ 5,8 bilhões, um pouco à frente do Golden State Warriors e do Los Angeles Lakers, que além de estarem em mercados importantes, tiveram temporadas de sucesso nos últimos anos e têm sob contrato estrelas como Stephen Curry e LeBron James.

Na mesma Nova York, também com uma arena fantastica e com estrelas como Kevin Durant e Kyrie Irving, o Brooklyn Nets aparece em sétimo lugar, avaliado em US$ 3,2 bilhões.

Pelo que se viu nas últimas décadas, o dono James Dolan não parece muito preocupado com os vexames dos Knicks em quadra e com as críticas que recebe. Azar dos torcedores, que vêm seu poder limitado a protestos nas redes sociais. Se decidirem se manifestar no Madison Square Garden, podem até levantar cartazes e vaiar, mas o dinheiro dos ingressos já estará no bolso do dono.

Sergio Patrick é especializado em comunicação corporativa e escreve mensalmente na Máquina do Esporte

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