A boa campanha em total de medalhas que o Brasil obteve nos Jogos Olímpicos de Paris 2024 foi em grande parte financiada por dinheiro público seja por Lei Piva, programa Bolsa Atleta ou patrocínio de estatais a confederações, ligas e esportistas.
Só em verba da Lei Piva, que destina parte da arrecadação das Loterias da Caixa ao esporte, o Comitê Olímpico do Brasil (COB) repassou às confederações quase R$ 600 milhões (R$ 591.087.999,90 para ser exato).
Esse montante foi liberado em apenas três anos (2022 a 2024), já que o ciclo olímpico até os Jogos de Paris foi o mais curto da história devido ao adiamento das Olimpíadas de Tóquio 2020 para 2021 por causa da pandemia da covid-19.
Opostos
Com situações heterogêneas de necessidade financeira e desenvolvimento da modalidade, cada esporte recebeu um montante. A mais beneficiada foi a Confederação Brasileira de Desportos Aquáticos (CBDA), que ficou com 5,5% do total destinado às entidades olímpicas (R$ 32.512.122,62).
E, em Paris 2024, a entidade que gere os esportes aquáticos, nos quais o Brasil esteve presente em três modalidades (natação, águas abertas e saltos ornamentais) foi uma das que mais decepcionou. Os 22 atletas não trouxeram nenhuma medalha.
Pior: na França, apenas Ana Marcela Cunha, campeã olímpica nas águas abertas em Tóquio 2020, chegou com chance real de pódio. A nadadora, que enfrentou um ciclo olímpico cheio de lesões, conseguiu o quarto lugar, ficando a 33 segundos de faturar o bronze.
Procurada pela Máquina do Esporte para comentar o desempenho ruim em Paris e falar sobre o que planeja fazer para melhorar a performance nos Jogos de Los Angeles 2028, a CBDA não quis se manifestar.
Na outra ponta do desempenho esportivo ficou a Confederação Brasileira de Judô. A CBJ obteve quatro medalhas (1 ouro, 1 prata e 2 bronzes). Cada pódio teve investimento de R$ 6.029.225,515 de verba da Lei Piva (4,1% do total).
Outro destaque foi a Confederação Brasileira de Ginástica (CBG), que também ganhou uma boa verba: R$ 31.114.885,61 ou 5,3% do que foi destinado às confederações olímpicas.
A ginástica saiu da França com 1 ouro, 2 pratas e 1 bronze, em grande parte beneficiada pelo desempenho espetacular de Rebeca Andrade, que se tornou a maior medalhista olímpica da história do país e ainda desbancou a superestrela Simone Biles na final do solo.
O Brasil ainda sonhava com uma medalha em outra modalidade sob o guarda-chuva da CBG, a ginástica rítmica, na prova de conjunto. Mas a apresentação do país acabou sendo prejudicada pelo imponderável. Victoria Borges, uma das integrantes da equipe, sofreu uma lesão na panturrilha ainda no aquecimento para a prova. Mesmo machucada, participou da competição, e o Brasil terminou com a nona colocação.
Mesmo assim, cada pódio da ginástica nos Jogos de Paris tiveram bom custo-benefício em relação ao que foi investido via Lei Piva, ficando na 2ª posição: R$ 7.778.721,403 por medalha.
A CBF, que levou o futebol feminino à medalha de prata após 16 anos, é um caso à parte, já que não recebe recurso de Lei Piva por opção própria.
Há ainda 18 confederações beneficiadas pela lei das loterias que competiram, mas não conquistaram medalha em Paris 2024. Outras quatro nem se classificaram (breaking, escalada esportiva, golfe e hóquei sobre gama). Mais duas confederações não competem em Jogos de Verão (desportos na neve e desportos no gelo).
Assim, do montante investido via Lei Piva, 37,2% foi destinado a confederações que subiram ao pódio em Paris. Outros 58,3% foram para entidades que não ganharam medalha. O restante (4,5%) é completado pelas confederações de gelo e neve, ausentes nos Jogos de Verão
Bolsa Atleta
Outra forma importante de financiamento público da preparação foi o Bolsa Atleta. O programa do Ministério do Esporte (Mesp), que teve reajuste de 10,86% em 2024, após 14 anos sem aumento, terá um investimento superior a R$ 160 milhões em 2024 para beneficiar 9.000 atletas de diferentes categorias.
Da delegação nacional que competiu em Paris, 87,3% dos atletas contam com o Bolsa Atleta para manutenção de seus treinamentos em 2024. Segundo o Ministério do Esporte, porém, 100% da delegação já foi bolsista em algum momento da carreira.
Dos 61 atletas que conquistaram as 20 medalhas do Brasil em Paris 2024, 79% participam do programa atualmente, de acordo com números do Mesp. Entre os medalhistas, porém, alguns nomes de destaque não se inscreveram neste ano. É o caso de Isaquias Queiroz (canoagem), Gabriel Medina (surfe) e Larissa Pimenta (judô).
Estatais
As estatais foram outra forma importante de financiamento do esporte olímpico brasileiro. Banco do Brasil, Caixa Federal, Correios e Petrobras contam com parcerias esportivas diversas, seja com confederações, ligas ou atletas.
O Banco do Brasil é patrocinador máster da Confederação Brasileira de Vôlei (CBV) desde 1991. A instituição financeira recentemente também firmou parcerias com skate e surfe. No primeiro, apoia a SLS (Street League Skateboarding), liga internacional, que tem o Super Crown, uma de suas principais etapas, no Brasil.
Nas águas, o BB firmou acordo com a World Surf League (WSL) para patrocinar o Vivo Rio Pro, etapa brasileira do Mundial de Surfe. Também detém os naming rights do Circuito Banco do Brasil de Surfe, competição nacional da modalidade.
O BB desembolsou R$ 118 milhões com esses patrocínios só em 2023. Para o ano olímpico, a expectativa é que essa quantia seja ainda maior, embora a direção do banco ainda não saiba estimar um valor que será desembolsado até o final do ano.
A Caixa apoia as confederações de atletismo e ginástica, ambas medalhistas em Paris. O banco, através das Loterias Caixa, também patrocina o Comitê Paralímpico Brasileiro (CPB), em ação em Paris a partir do próximo dia 28. No atual ciclo olímpico, a Caixa investiu R$ 170,4 mlhões.
Campeã em patrocínio estatal, a ginástica também é apoiada pelos Correios, que voltou a investir em esporte após cessar completamente os patrocínios na área durante o governo de Jair Bolsonaro. Na época havia a expectativa de privatização da empresa, o que acabou não acontecendo. Dos Correios, a CBG recebeu um aporte de R$ 4,5 milhões neste ano.
Já a Petrobras segue estratégia diferente. Não patrocina nem confederação, nem liga esportiva. A estatal de petróleo investe no Time Petrobras, atualmente formado por 55 atletas e paratletas, entre os quais Bia Ferreira (boxe); Isaquias Queiroz (canoagem); Flávia Saraiva (ginástica artística); Beatriz Souza e Guilherme Schimidt (judô); Augusto Akio (skate); e Duda e Ana Patrícia (vôlei de praia), todos medalhistas olímpicos em Paris.