O Senado aprovou, na noite desta terça-feira (9), o projeto da Lei Geral do Esporte. O texto começou a tramitar na casa em 2017, onde chegou a ser aprovado por unanimidade, no ano passado. Depois disso, sofreu alterações significativas na Câmara dos Deputados.
O projeto aprovado nesta terça-feira (9) é o relatório da senadora Leila Barros (PDT-DF), ex-jogadora de vôlei. De acordo com uma matéria publicada no site da parlamentar, o documento “reconstruiu as bases do acordo feito, que contou com a colaboração de atletas e agentes, da Confederação Brasileira de Atletismo, de sindicatos de atletas profissionais, representantes de técnicos esportivos e entidades sociais que atuam na área esportiva, como a Atletas pelo Brasil”.
Polêmicas
A tramitação do projeto da Lei Geral do Esporte no Senado não se deu sem polêmica. Conforme noticiou a Máquina do Esporte no último dia 25 de abril, grandes clubes brasileiros de futebol divulgaram uma nota criticando o dispositivo que pretendia incluir na nova legislação a Federação das Associações de Atletas Profissionais (Faap), entidade que, com base na Lei Pelé, foi por muito tempo credora de uma taxa de 0,8% a ser paga pelas agremiações, sempre que negociassem algum jogador.
Segundo a senadora, no último dia 20 de abril, ela chegou a se reunir com representantes de alguns clubes, incluindo Flamengo, Fluminense, Athletico-PR, Bahia, Avaí e Fortaleza, para debater pontos polêmicos da Lei Geral do Esporte.
“Os clubes apresentaram suas demandas. Explicamos que algumas mudanças serão acatadas e outras, devido às regras do rito legislativo, não poderão mais ser feitas. Porém, são pleitos justos e que têm o meu compromisso de serem trabalhados em um projeto de lei que irei apresentar após a aprovação e sanção da Lei Geral do Esporte”, afirmou Leila.
Durante a discussão do projeto em plenário, nesta terça-feira (9), foram apresentados três destaques ao texto. Um deles acabou sendo retirado antes mesmo de ser votado e tratava da relação entre os clubes formadores e os atletas de até 18 anos de idade.
Outro, que tentava alterar a destinação dos recursos obtidos com a Loteria Federal, acabou sendo rejeitado. Os senadores também derrubaram, por 43 votos a 23, o questionamento feito pela bancada do PL, que poderia afetar as regras de combate ao racismo, machismo e homofobia previstos na Lei Geral do Esporte.
O apontamento feito pelo senador Magno Malta (PL-ES) pedia a retirada dos trechos “o racismo, a xenofobia, a homofobia, o sexismo”, “especialmente de caráter racista, homofóbico, sexista ou xenófobo” e ” racistas, xenófobas, homofóbicas ou transfóbicas”, do texto a ser votado.
A justificativa do parlamentar era de que, como a proposta já abordava a questão da discriminação, a citação dessas formas específicas poderia ocasionar dúvidas em relação a outras formas de preconceito não mencionadas expressamente no projeto. O debate em torno do destaque de Malta foi longo, até o pedido ser rejeitado pela maioria dos senadores.
O que é a Lei Geral do Esporte?
O texto aprovado pelo Senado seguirá para a análise do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), que terá 15 dias para sancionar ou vetar (integralmente ou em parte) o projeto. A partir da sanção é que a Lei Geral do Esporte passará a vigorar como um novo marco regulatório para essa área no Brasil.
O projeto busca reunir em uma mesma legislação todo o regramento relacionado ao esporte no país, incluindo a Lei Pelé (Lei 9.615, de 1998), o Estatuto do Torcedor (Lei 10.671, de 2003), a Lei de Incentivo ao Esporte (Lei 11.438, de 2006) e a Lei da Bolsa Atleta (Lei 10.891, de 2004).
O que diz a nova Lei Geral do Esporte?
Entre os aspectos mais significativos da nova Lei Geral do Esporte estão cerca de 200 artigos que organizam o funcionamento do Sistema Nacional do Esporte (Sinesp), incluindo sua composição e as atribuições de estados, municípios, da União e das entidades que atuam em cada segmento esportivo. A ideia é que o Sinesp também promova a integração do planejamento entre os diferentes entes federativos, com planos decenais.
No que se refere à gestão esportiva, a nova Lei Geral do Esporte cria dispositivos que pretendem ampliar a transparência e os mecanismos de combate à corrupção, com punições mais duras para os dirigentes envolvidos em atos ilícitos ou que sejam maus gestores.
Isso inclui tornar crime o ato de “solicitar, receber ou mesmo aceitar promessa de vantagem indevida para realizar ou omitir ato inerente às suas atribuições”.
A Lei Geral do Esporte também pretende tornar inelegíveis por dez anos os dirigentes que estiverem “inadimplentes na prestação de contas da própria organização esportiva, por decisão definitiva judicial ou da respectiva organização”.
A nova lei ainda prevê punições a dirigentes que receberem pagamentos, doações ou repasses de pessoas físicas ou jurídicas, que venham a celebrar contratos comerciais com instituições que tais gestores comandam. O veto é referente ao período de um ano, anterior ou posterior ao repasse, e afeta também empresas das quais o dirigente ou seus familiares próximos sejam sócios.
As exigências para que organizações recebam recursos públicos, incluindo das loterias, ficarão mais rigorosos. A nova legislação mantém as regras básicas da atual Lei de Incentivo ao Esporte, estabelecendo limite de 4% para dedução de Imposto de Renda (IR) para empresas que investirem em apoios a projetos esportivos de inclusão social. No caso das pessoas físicas, o percentual máximo será de 7%.
Outra inovação trazida pela Lei Geral do Esporte é o Fundesporte, que será financiado a partir da tributação de alimentos e bebidas com alto teor de açúcar, gorduras saturadas ou sódio, produtos considerados prejudiciais à saúde.
Combate à discriminação
A nova Lei Geral do Esporte procura avançar no combate ao racismo, machismo, homofobia e outras formas de discriminação. O texto propõe a ampliação da representatividade nos cargos de gestão nas entidades esportivas.
Além disso, determina a criação da Autoridade Nacional para Prevenção e Combate à Violência e à Discriminação no Esporte (Anesporte), que será responsável por elaborar e executar políticas públicas de enfrentamento a essa prática violenta, especialmente nos estádios de futebol.
A Anesporte também terá prerrogativa para impor sanções administrativas a entidades, atletas, clubes ou pessoas envolvidas em atos de ódio e intolerância. Estados serão autorizados a criar juizados do torcedor, com competência para julgar episódios de discriminação no esporte.
Relações entre atletas e clubes
A nova lei amplia a responsabilidade das instituições esportivas para com os atletas. Isso inclui desde as condições de trabalho e de saúde dos esportistas, passando por questões econômicas como seguro de vida e acidentes pessoais, além de cláusula indenizatória, remuneração e outros direitos que deverão ser acordados em um contrato de trabalho esportivo, cuja duração não poderá ser maior que cinco anos nem menor que três meses.
Para contratos inferiores a um ano, o esportista profissional terá direitos trabalhistas como saldo proporcional aos meses de serviço, relativo a férias e 13º salário. Já as exigências e a fiscalização para as categorias de base dos clubes de futebol prometem ficar mais rígidas.
Uma alteração importante trazida pela lei diz respeito aos direitos de imagem dos jogadores de futebol. A legislação atual determina que essa remuneração poderá corresponder a 40% do salário do atleta, com os outros 60% sendo definidos em contrato de trabalho.
Uma emenda aprovada em plenário fixou em 50% a nova proporção entre direitos de imagem e remuneração contratual na composição final dos salários dos jogadores.
Por fim, a nova Lei Geral do Esporte veda a aplicação de sanções administrativas a atletas, treinadores, árbitros e demais pessoas envolvidas na organização de eventos esportivos por conta de opiniões emitidas.
Segundo a relatora, o objetivo da medida foi deixar o projeto alinhado aos preceitos da Constituição Federal, que proíbe a censura prévia e garante a liberdade de expressão como direito fundamental.
Em todo caso, esse dispositivo tende a criar polêmica, sobretudo em competições internacionais, cujas entidades organizadoras (caso da Fifa, por exemplo) tendem a ser extremamente rígidas na proibição de manifestações de cunho político ou ideológico.