Uma das perguntas que mais me fazem, seja no mercado ou em sala de aula, é se o torcedor não deveria ser tratado como consumidor. É tentador responder rapidamente que sim. Sob a ótica natural do marketing, todo torcedor deve(ria) ser tratado como consumidor. A natureza peculiar do esporte, porém, sempre me leva a respirar, pensar e responder que não. Devemos tratar o torcedor como um fã. Algo que é bem diferente de um consumidor.
Ser um fã não é algo que se explica. É algo que se sente. Obviamente que existem diversos níveis de fãs. Bem como diversos tipos. Mas todos são importantes para os times esportivos. Ser fã é uma relação tão exclusiva que, a grosso modo, toda marca busca criar uma relação de lealdade com seu consumidor como um time tem com seu fã mais dedicado.
Em suma, ser um verdadeiro fã é algo que se sente instintivamente, não algo em que se pensa, e toda marca deve tentar explorar esse sentimento.
Mas isso não é algo exclusivo do universo esportivo. O universo geek, com personagens da Marvel, Star Wars, Senhor dos Anéis e muitos outros, aprendeu, já faz tempo, a explorar essa relação. Talvez até muito melhor que a maioria dos setores esportivos.
E por que falo isso?
Porque isso mostra que essa paixão febril existente no esporte é possível de ser explorada fora dos esportes. Não há uma marca por aí que não queira recriar o tipo de lealdade e sentimento de pertencimento que vem com os esportes.
E aqui entra algo muito importante: pertencimento.
O grande fã, aquele fã obstinado, tem uma sensação de pertencimento muito grande. E é essa sensação que cria raízes profundas. Por isso, devemos sempre estar procurando maneiras de cultivar fãs e gerar lealdade. E, mesmo que um time não concorra com outro, os esportes concorrem entre si. Mais do que isso, os esportes concorrem com muitas outras fontes de lazer e/ou entretenimento.
Em resumo, existe muita concorrência pelo tempo do “torcedor”. E por isso é importante garantir que os torcedores se tornem fãs, já que a indústria do esporte se mostra cada vez mais inconstante.
Ter uma voz autêntica
Talvez, se você chegou até aqui, esteja pensando com você mesmo que todo torcedor é fã e que todo fã é leal a seu time. Assim, tudo que falei até agora pode parecer uma grande bobagem. Pode ser que você esteja certo, mas eu não acredito nisso. Uma coisa é nós gostarmos dos nossos times e termos uma relação de cumplicidade com ele. Outra, bem diferente, é desenvolvermos um grau de lealdade tão grande que nos permita dizer que somos um fã obstinado por nosso time a ponto de não trocar ele por nada, ou quase nada.
Sob essa ótica, acredito que, principalmente nos times brasileiros, falta, e muito, desenvolvermos uma relação de lealdade com o torcedor. Ou seja, poucos torcedores são realmente leais e fãs obstinados de seus times.
Uma das grandes questões é que o sucesso do marketing ainda está intrinsecamente ligado ao sucesso dentro de campo. É uma questão cultural dos torcedores e que vem sendo trabalhada de maneira árdua por muitos times mundo afora.
Assim, nunca aconselho tratar um torcedor como consumidor. Trate um torcedor como fã e se esforce para transformá-lo em um.
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Fernando Fleury é fundador da Armatore Market + Science e escreve mensalmente na Máquina do Esporte