Não parecia trabalho, parecia diversão, e era

Jornalismo esportivo perdeu em poucas horas Washington Rodrigues, Silvio Luiz e Antero Greco - Reprodução / Instagram

Lá se foram alguns dias, mas ainda está em tempo.

Há uma semana, perdemos três gênios do jornalismo esportivo. Sim, gênios. Três figuras que, com talento ímpares, criaram estilos próprios para cativar e transformar a arte de comunicar. Parte da minha juventude e formação como jornalista foi acompanhando Antero Greco, Silvio Luiz e Washington “Apolinho” Rodrigues. Três referências para várias gerações, nomes que fizeram muito mais do que o papel de informar, foram além abusando da leveza, de forma divertida, irreverente e, principalmente, marcante.

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Muitas foram as (merecidas) homenagens, e inúmeras são as lembranças dos três. Lembro da minha adolescência assistindo à Band (Verão Vivo, Show do Esporte, etc.) e imitando os bordões de Silvio Luiz jogando futebol de botão. Como esquecer? São memórias da infância. Aquela narração debochada trazia uma emoção diferente. E ele estava ali, outro dia mesmo, vencendo o tempo com os mesmos bordões, enquanto o meu time de botão nem sei onde foi parar.

Vi outro dia o Carioca, grande amigo, dizendo que Silvio chegava para trabalhar se apoiando nas paredes, efeito da idade, sem resmungar, sem reclamar, que estava sempre feliz. E não parecia trabalho mesmo. Parecia diversão. “Trabalhe com o que ama e nunca terás que trabalhar”, diz a expressão. E era isso que Silvio, Apolinho e Antero passavam para quem os assistiam ou ouviam. Era diversão. Era brincadeira. Amavam o que faziam. Por isso foram tão diferentes em suas carreiras.

Entre as muitas homenagens que vi, o texto de André Kfouri foi o mais forte. “Até um dia, querido Antero”. Impossível ver, ouvir e não se emocionar. É o sentimento de muita gente que conviveu com Antero, mas também daqueles que se acostumaram a vê-lo na “5ª Série” da bancada do SportsCenter com o “Amigão”, Paulo Soares, que eternizou o “Antero Greco, my friend”. O show de trocadilhos com nomes de jogadores e piadas “ruins” está por todos os lados no YouTube.

E o que falar do Apolinho? Alguém que levou sua paixão por futebol a um nível tão extremo que permitiu que assumisse como técnico do Flamengo, seu time do coração. Generosidade e simpatia eram marcas do bonachão Washington Rodrigues. Um mestre do rádio. Um daqueles caras que se dava bem com todo mundo e que todo mundo queria ser amigo.

Trabalhar no meio do jornalismo não é fácil, é estressante, é cansativo e, definitivamente, não é saudável. Muitos dizem que o jornalismo, em épocas de redes sociais e inteligência artificial (IA), está acabando. A imprensa já não é mais a mesma. A mídia mudou. Mas ainda há, claro, o glamour da profissão que seduz os jovens, afinal, uma credencial de imprensa é objeto de desejo, estar nos grandes eventos como Jogos Olímpicos, Copa do Mundo e campeonatos internacionais, entre outros, é o sonho de muita gente.

E caras como esses três fizeram com que muitos sonhassem esse sonho. Não apenas o da credencial, mas o de escrever uma história, construir uma carreira. Quantos não foram estimulados a alcançar os seus objetivos? Antero, Apolinho e Silvio inspiraram e também ajudaram muitos que hoje estão por aí.

É sempre difícil elencar este ou aquele como o maior, como o melhor, é injusto com tantos nomes gigantes que o jornalismo esportivo produziu. Alguns já se foram, como Luciano do Valle, Armando Nogueira, Alberto Léo, Jorge Cury, Luiz Noriega, Michel Laurence…

Outros seguem encantando, como José Carlos Araújo, o “Garotinho”, Everaldo Marques, Léo Batista, Galvão Bueno, Álvaro José, Rômulo Mendonça…

Tantos, tantos. Cada um em sua época, cada um no seu tempo, cada um com o seu microfone, cada um com o seu público. Antero, Apolo e Silvio são nomes que estariam em um “Hall da Fama” do jornalismo esportivo brasileiro, se houvesse um.

Quando fui procurar imagens dos três para fazer um post simples, de homenagem, nas redes sociais, só achei fotos dos três sorrindo ou dando risada. Pudera, essa é a principal imagem que ficou deles. Escrevendo aqui, lembrando dos três, dá até para ouvir seus sarcasmos, cobertos de humor fino e frases de efeito. Alguém na semana passada os chamou de “Três Tenores”, em uma alusão a Luciano Pavarotti, José Carreras e Plácido Domingo. E cabe bem. Tenores que não precisavam falar mais alto para serem ouvidos e respeitados.

Foram 24 horas (menos, na verdade) de enorme tristeza. Embora os três já estivessem passando por momentos delicados de saúde, é difícil aceitar essa realidade. Duro demais ver três referências nos deixarem dessa forma, mas foi muito bom ver o reconhecimento, as homenagens e o legado que cada um deixou.

Obrigado pelas alegrias e risadas, Antero, Apolinho e Silvio.

Samy Vaisman é jornalista, sócio-diretor da MPC Rio Comunicação (@mpcriocom), cofundador da Memorabília do Esporte (@memorabiliadoesporte) e escreve mensalmente na Máquina do Esporte

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