Uma nova era de troca de valores entre marcas, atletas e organizações esportivas

Atacante do Palmeiras, Endrick é o novo embaixador da Neosaldina - Divulgação

Quais são as oportunidades de troca de valor entre marcas, atletas, organizações esportivas e empresas correlatas? Confiante de que 2024 promete retornos diferenciados nesse cenário, em minha primeira coluna do ano para a Máquina do Esporte, destaco as oportunidades nessa relação.

Cenário favorável

Atletas não faltam. Marcas com potencial financeiro para investimento também não. No entanto, embora já sejam notáveis excelentes exemplos, a distância para atingir o potencial máximo é enorme. Cabe a reflexão sobre como evoluir o olhar estratégico e criativo para potencializar a relação marca-esporte (especialmente o futebol, nossa paixão nacional e uma indústria bilionária).

Um bom ponto de partida é compreender que há muito tempo os patrocinadores buscam mais do que espaço para estampar suas marcas. Na coluna de agosto abordei a “jornada do herói” como ferramenta estratégica para gerar valor entre patrocinadores e atletas/clubes: “…as estratégias de marketing que podem gerar mais atratividade, interesse e investimento são aquelas capazes de emocionar, representar valores, contar histórias reais e que inspiram, geram empatia e conexão.”

Em 2023 vimos vários exemplos de atletas que, por meio dos seus valores, lifestyle, história de vida, entre outros atributos pessoais, se conectaram com marcas que buscavam embaixadores capazes de ampliar o potencial de conexão com seu público ativo e em potencial.

Parceria Endrick – Neosaldina e Rayssa – Docile

O jovem atleta do Palmeiras, Endrick, fechou o último ano anunciando parceria com a marca Neosaldina. Contrato que lhe garantirá retorno financeiro em torno de R$ 12 milhões ao longo de cinco anos da parceria.

Vale a análise desse caso para “evoluir o olhar estratégico e criativo”, como sugeri logo antes. Isso porque por um lado a parceria é inédita e, por outro, existe uma possível contradição no fato de que o medicamento não pode ser utilizado por atletas, já que contém substância considerada doping pela Agência Mundial Antidoping (WADA).

A Máquina do Esporte publicou reflexão sobre esse conflito e, na coluna, a Neosaldina explica: “o Endrick entrega mais do que esporte. Ele é um exemplo de brasileiro que leva a vida com muito bom humor e é superconectado com o público da Neosaldina”.

Vale aqui recapitular episódio que marcou a imagem do atleta e até hoje é utilizado como representação da sua personalidade fora dos gramados: na comemoração da Copa São Paulo em 2022, Endrick causou impacto e emoção ao comemorar a vitória com o irmão caçula.

Fatos como esse exemplificam o poder da jornada do herói, de expressar sentimentos autênticos e contar histórias que contenham valores pessoais, além de justificar que a principal conexão não está exclusivamente relacionada ao desempenho esportivo, mas sim aos atributos pessoais.

Indo para além do futebol, podemos identificar contexto semelhante no patrocínio entre Rayssa Leal e a empresa brasileira de doces e guloseimas Docile. A empresa lançou linha de produtos inspirada na jovem atleta que, embora não tenha o açúcar como uma substância proibida por lei em seu esporte, é sabido que trata-se de produto que não é recomendado para atletas e que é alvo constante de revisão quanto aos limites para consumo por crianças, tendo em vista que a obesidade é doença que preocupa o mundo todo.

Análise e foco na evolução

Trago os exemplos para sugerir uma inquietação saudável, positiva, que deve ser tratada por meio de estudo, qualificação e respaldo de profissionais competentes, especialistas nas áreas envolvidas. Isso vale tanto para a indústria do esporte quando para o meio empresarial, que também aprimora dia a dia seu olhar para as possibilidades de utilizar atletas e entidades esportivas como plataforma com alto potencial de gerar valor para seus negócios.

É ponto primordial identificar os limites para que as conexões entre atletas e marcas patrocinadoras não ultrapassem a troca de valor, já que isso pode gerar na verdade ruídos em ambas as marcas (pessoal, do atleta, e para a marca patrocinadora). Para além disso e de olho nas oportunidades, vale compreender que atletas e clubes são excelentes plataformas com potencial de comunicação, engajamento e ampliação da conexão com o público de marcas de inúmeros segmentos. Os segmentos de produtos esportivos são os mais óbvios e, certamente, podem de fato gerar conexões de gigantesco valor. No entanto, vale ampliar o olhar e compreender as perspectivas para além disso.

Danielle Teles, estrategista de Marca Pessoal e Fundadora da Reffini Personal Branding, explica que “cada vez mais, vemos atletas expandindo sua influência para além do esporte. Os atletas são considerados influenciadores sociais ou produtos culturais, representando uma cultura e compartilhando valores que expressam seus atributos e características pessoais. Esse conjunto de significados, que o atleta traz consigo, faz os fãs desejarem e se identificarem com seu estilo, gostos e comportamentos.”

Nesse contexto, a criação de linhas de produtos exclusivas, que literalmente fundem a marca pessoal com a marca dos produtos, se tornaram cada dia mais comuns. Para manter os exemplos mencionados antes, Raysa Leal e Endrick contam respectivamente com patrocínios e linha de produto exclusiva da Nike e New balance.

Parceria Rayssa – Nike e Endrick – New Balance

Rayssa assinou e colaborou com a linha do tênis Nike SB Dunk Low. A parceria foi anunciada no final de 2023 e tem lançamento previsto para início deste ano. Desta forma a marca agrega ao seu produto o estilo ‘fadinha radical’, representado pela atleta. A identificação com a atleta é, desta forma, direcionada ao produto, que passa a ser um símbolo para a legião de pessoas que se identificam com os atributos pessoais da skatista.

Já o jovem atleta de futebol assinou parceria que pode ser considerada um marco para a construção de relação entre jogadores e marcas esportivas.

Com exclusividade para a audiência desta coluna, João Diago, Agente FIFA & Especialista de Negócios em Marketing Esportivo e Marcas, conta como colaborou na construção e negociação desse patrocínio inédito em grandeza e no planejamento das ações de troca de valor com a marca esportiva.

“Desenvolvemos um planejamento de marketing baseado em novas ideias, no que é feito hoje no mercado, no que o ambiente traz como tendência e envolvendo também tecnologia. Trabalhamos até chegar no melhor plano já feito neste segmento. Internamente realizamos muitas sessões de brainstorming considerando os desejos e interesses do atleta e da família, a curto médio e longo prazos até que conseguimos chegar em um plano inovador, aproveitando o melhor do mercado nacional e o melhor do mercado global contando com a minha experiência de mais de 15 anos neste segmento. Tivemos em foco no projeto a perspectiva de como ter também a melhor construção de imagem e carreira para um dos melhores atletas já vistos no ambiente pessoal e profissional, corroborando assim com outras frentes existentes e em desenvolvimento para o atleta, pra a construção de um ‘super-humano’ e, por consequência, um ‘superatleta’ dentro e fora dos jogos e clubes por onde passar.  Demos vida ao plano e, com isso a possibilidade de retorno ao ser humano e ao parceiro esportivo. Formatamos um projeto inovador, detalhadamente pensado e executado para toda a comunidade de fãs do futebol, do indivíduo, do atleta e pensado para o torcedor do futebol como um todo.”

Que venha 2024!

O cenário é favorável para atletas, seus gestores, clubes, marcas de muitos segmentos e empresas que atuam com o desenvolvimento de marketing, comunicação e estratégias de patrocínio.

A relação entre patrocinadores e seus “embaixadores” mudou na mesma proporção que a maneira como os consumidores se relacionam com marcas, produtos e serviços.

Transformar as oportunidades em bons negócios requer planejamento e desenvolvimento de parcerias que contemplem a jornada do atleta, sem desconsiderar seus objetivos de carreira e seus atributos pessoais. Da mesma forma, atletas e seus gestores devem olhar para as marcas parcerias não somente sob o ponto de vista do retorno financeiro imediato vindo de cada contrato, e sim, pelo potencial de ampliar visibilidade e conexões relevantes, gerar valor com os fãs e reforçar o posicionamento de marca pessoal.

Ana Teresa Ratti possui mais de 20 anos de experiência corporativa, é mestra em Administração, trabalha atualmente com gestão esportiva, sendo cofundadora da Vesta Gestão Esportiva, e escreve mensalmente na Máquina do Esporte

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