Câmara dos Deputados mantém apostas esportivas na lista do “imposto do pecado”

Plenário da Câmara Federal, durante a votação do texto-base da Reforma Tributária - Mário Agra / Câmara dos Deputados

Considerada uma das principais bandeiras do governo do presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT), a Reforma Tributária enfim avançou na Câmara Federal. Nesta semana, os deputados aprovaram o texto-base do projeto de lei complementar, que prevê uma série de mudanças na forma como impostos são cobrados no Brasil.

Um dos temas mais polêmicos da proposta, o imposto seletivo, criado sob o argumento de que ajudaria a desestimular o consumo de produtos ou serviços supostamente prejudiciais à saúde ou ao meio ambiente, foi mantido pelos parlamentares.

Entre as atividades que serão afetadas pelo novo tributo, batizado popularmente de “imposto do pecado”, estão as apostas esportivas, incluídas no item jogos de azar.

Além das apostas, o imposto seletivo incidirá sobre itens como cigarros, bebidas alcoólicas, carvão e veículos (exceto aqueles que se adequarem a determinadas normas ambientais).

Por outro lado, os deputados deixaram de fora do “imposto do pecado” as armas de fogo e a munição. Caso o tributo venha a ser aprovado, a alíquota será definida por uma lei ordinária específica.

Governo tem urgência na tramitação

O projeto aprovado pela Câmara agora seguirá ao Senado Federal, onde também será analisado e votado. Se não ocorrerem mudanças e o texto vier a ser aprovado, ele seguirá então para a sanção presidencial.

Caso ocorram alterações no texto-base, porém, a proposta precisará retornar à Câmara, para que os deputados realizem nova discussão.

Conforme a Máquina do Esporte apurou, as chances de o Senado reverter a inclusão de alguns desses itens no “imposto do pecado” existe, mas não é simples.

Isto porque as alterações no texto atrasariam a tramitação de uma matéria vista como prioritária pelo Governo Federal, que acredita que a reforma ajudará a simplificar o sistema tributário brasileiro, melhorando o ambiente de negócios, facilitando o crescimento econômico do país e aumentando a arrecadação.

Além disso, o novo tributo conta com a simpatia das chamadas bancadas religiosas, especialmente as ligadas às igrejas evangélicas, uma vez que atinge justamente produtos e serviços que são mal vistos nesse meio (daí vem o nome “imposto do pecado”).

Para se ter uma ideia, o texto da Reforma Tributária que passou na Câmara incluiu todas as modalidades de apostas no imposto seletivo, tanto as on-line quanto as off-line.

A manobra visa garantir que, caso o projeto de lei 2.234/2022, que tramita no Senado e prevê a legalização de bingos e cassinos, venha a ser aprovado, essas atividades também serão automaticamente enquadradas no “imposto do pecado”.

Sem pecado

Enquanto isso, as entidades que representam o setor de apostas tentam convencer os parlamentares a deixar o setor de fora do novo tributo.

Plínio Lemos Jorge, presidente da Associação Nacional de Jogos e Loterias (ANJL), diz que costuma evitar o uso do termo “imposto do pecado”.

“Considero esse nome pejorativo. Até porque quem somos nós para definir o que é ou não pecado neste mundo?”, questiona.

Na visão do dirigente, aposta esportiva não seria uma atividade nociva, por si só. “Existe um pequeno percentual de ludopatas [pessoas que sofrem de dependência de jogo], mas os estudos internacionais mostram que eles representam 1% do total de apostadores”, afirma.

Para ele, a criação de um novo tributo tornará o mercado legalizado menos atrativo para os consumidores brasileiros. “A lei que regulamenta as apostas no país prevê o repasse de dinheiro para o tratamento das pessoas com dependência. Já as plataformas ilegais não se preocupam se o usuário é ou não dependente”, explica.

Segundo Jorge, os sites de apostas esportivas dispõem de tecnologia para identificar indícios de que um jogador apresenta comportamento compulsivo.

“Ainda estamos aguardando a publicação da portaria que trata desse tema específico, mas a regulamentação prevê que poderemos cruzar as informações de que dispomos com as de outras casas, para identificar se um jogador é compulsivo e assim impedir que ele siga apostando”, afirma.

As entidades também têm procurado enfatizar o discurso de que a aposta esportiva deve ser encarada como um divertimento. Recentemente, o presidente do Instituto Brasileiro de Jogo Responsável (IBJR), André Gelfi, divulgou comunicado ressaltando a ideia de que a atividade não pode ser encarada como meio de vida, pelos jogadores.

“Apostas esportivas e investimentos financeiros são duas atividades absolutamente distintas, com intenções e abordagens diferentes. Enquanto investir pressupõe proteção de capital e uma remuneração do mesmo, além de análise, estratégia e gerenciamento de riscos a longo prazo, as apostas esportivas estão baseadas na exposição do capital, no caso a aposta, à perda integral do montante apostado. As apostas em sua essência são lúdicas, entretenimento, estão orientadas para a emoção e o resultado imediato”, disse.

Para Gelfi, as empresas têm um papel fundamental na prevenção e no combate à compulsão por jogos.

“As casas de apostas devem promover o jogo responsável aos usuários. Isso implica em oferecer uma experiência emocionante e conscientizar os clientes sobre práticas saudáveis de jogo”, afirmou.

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